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DIA DA MULHER

Jovem portuguesa fala em Roma da experiência missionária no Chade

05 mar, 2018 - 16:28 • Ângela Roque

Joana Gomes vai ser uma das oradoras na Conferência Voices of Faith, que defende que as mulheres devem ser mais ouvidas e participar na tomada de decisões da Igreja. Pela primeira vez em cinco anos o encontro vai decorrer fora do Vaticano, que não aprovou três das oradoras.

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A iniciativa “Voices of Faith” realiza-se desde 2014 e tem decorrido sempre no Vaticano por ocasião do Dia Internacional da Mulher. Reúne mulheres católicas que em todo o mundo se destacam no serviço aos mais pobres e na defesa da igualdade e da dignidade humana. Joana Gomes é uma delas. A jovem portuguesa está no Chade onde é responsável, pelo segundo ano consecutivo, por um projeto educativo do Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS). É sobretudo dessa experiência de missão e liderança que vai falar em Roma.

“O diretor internacional do JRS sugeriu o meu nome, e esta organização ‘Voices of Faith’ escolheu-me para ir dar o meu testemunho de vida e a minha opinião sobre como é que a Igreja pode trabalhar mais a vocação universal da mulher e lançar mais desafios aos jovens”, conta à Renascença.

Formada em Serviço Social, Joana já tinha sido voluntária em favelas no Brasil, e esteve a ajudar refugiados em França e Itália, mas foi em janeiro de 2017 que mudou radicalmente de vida e partiu para o Chade. Diz que trocou “o certo pelo incerto, que é o chamamento de Deus e do trabalho em missão”.

“Eu tinha aquilo que a nossa sociedade diz que é o que todos queremos, um trabalho, um carro, tudo muito bonitinho. Era 99% feliz, mas faltava-me um por cento. E percebi que por este um por cento teria que largar tudo o resto. Por isso despedi-me, porque tinha um chamamento muito grande de ir para o terreno trabalhar com os refugiados. E como Deus quando chama depois também abre as portas todas, encontrei trabalho no JRS, no Chade”, diz Joana Gomes. É dessa experiência que conta falar na conferência, em Roma, mostrando que é a própria Igreja que tem de saber lançar desafios.

“Quero muito passar a mensagem de que a Igreja tem de ser mais audaz nos convites. Todos nós temos de ser mais audazes na nossa forma de sermos cristãos. Não há que ter medo de dizer a um jovem ‘larga tudo, vem para o meio do mundo’. Sinto que estamos muito formatados, é uma felicidade formatada, um caminho de vida formatado, e a Igreja tem de ser a primeira a dizer que não há ‘certos’, nem há um só caminho de felicidade”, sublinha ainda a portuguesa que tem a seu cargo 15 mil alunos refugiados.

De resto espera que o seu testemunho ajude a mostrar que o papel das mulheres na Igreja não passa apenas por serem freiras, mas sabe que ainda há muitos preconceitos a combater. “Eu vivi muito isso. Quando comecei a discernir sobre esta questão e vi que a minha vida passava por um caminho mais missionário, mais de terreno, tive muitos amigos católicos, muito crentes, muito praticantes, a dizerem-me, ' mas, então tu não te vais casar nem ter filhos?'. Como se esse fosse o único caminho de felicidade, o topo do topo”.

Joana sabe que para muitos a sua escolha não foi “normal”, mas não tem de ser assim, a começar pela própria Igreja. “Eu acho que a igreja tem de ser mais convidativa, dizer 'és uma mulher, não tens de ser freira para ires trabalhar pelos outros', não tens que abdicar de um caminho, que mais tarde até pode ser um caminho de família, se agora neste momento queres ter um caminho de missão. E eu acho que neste sentido a Igreja pode ser mais audaz”. E é por isso que considera importante que este encontro de Roma se realize, para que a Igreja ouça mulheres que em diversos locais do mundo vão fazendo a diferença na vida de tanta gente, por amor a Deus. “Sobretudo mostrar que há pessoas que vão fazendo estes caminhos sozinhas, porque há um chamamento de Deus direto. É preciso ver que estruturas é que se poderiam montar na Igreja para apoiar ou incentivar isto. Às vezes é só uma questão de despertar este bichinho que já está cá dentro. E nesse sentido acho que estes testemunhos e experiências são importantes. Quero partilhar com os outros jovens o que ando a fazer, e partilhar com a própria Igreja”.

“Porque importam as mulheres” foi o tema escolhido para a conferência “Voices of Faith” deste ano, por onde vão passar mulheres de vários locais do mundo. A intenção é serem ouvidas pela Igreja e pelo Papa, mas desta vez o encontro não vai decorrer na Ala Paulo VI, no Vaticano, como aconteceu nos últimos quatros anos, depois da Santa Sé ter recusado três das oradoras, uma delas a antiga presidente da Irlanda, Mary McAleese, conhecida defensora dos direitos LGBT e da ordenação de mulheres na Igreja. A organização não gostou, e decidiu manter o painel de participantes, mas mudar o local da conferência para a Cúria dos Jesuítas, que fica na mesma em Roma, mas fora dos muros da Cidade do Vaticano.

“Não vemos motivos para que estas mulheres tenham de passar por um processo de aprovação. São vozes autênticas, e todas merecem ser ouvidas”, afirmou Chantal Gotz, diretora geral das “Voices of Faith”, que espera que as intervenções possam ser acompanhadas na mesma por responsáveis da Igreja.

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