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Justiça é incapaz de "condenações justas e razoáveis em tempo útil". Maria José Morgado aponta soluções

24 mar, 2022 - 08:05 • Liliana Monteiro

Para a antiga diretora do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, “essa incapacidade tem provocado um desnecessário desgaste e falta de credibilidade do sistema”.

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“A maior fraqueza do sistema penal português é a incapacidade de obter condenações justas e razoáveis em tempo útil, através de um processo justo e equitativo e com base numa investigação célere e eficaz”. O diagnóstico é feito por Maria José Morgado, em declarações à Renascença.

Para a antiga diretora do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DIAP), “essa incapacidade tem provocado um desnecessário desgaste e falta de credibilidade do sistema”.

A resposta à questão que Ministério Público (MP) precisamos e que desafios deve enfrentar é simples: deve ser dotado de meios modernos para investigar bem e depressa. Pôr fim a este estado de coisas devia ser prioritário, diz Maria José Morgado.

O Congresso dos Sindicato do Magistrados dos Ministério Público (SMMP) começa esta sexta-feira, em Vilamoura. A Renascença desafiou várias personalidades a olharem para os desafios que esta magistratura enfrenta.

Maria José Mortago diz que a criminalidade torna-se cada vez mais sofisticada e está sempre um passo à frente em relação aos investigadores. A magistrada jubilada lamenta que “o MP esteja tão depauperado em matéria de meios sofisticados para esta criminalidade grave e altamente organizada que enfrentamos”.

"Há incapacidade em obter condenações justas e razoáveis em tempo útil"

A receita não é imediata, mas também não está escondida. “É uma solução dinâmica de desenvolvimento de competências do MP, ativar os agentes de mudança com um MP atuante capaz de desenvolver e gerar uma investigação eficaz, dirigir eficazmente as polícias e trabalhar em equipa com um papel eficaz em julgamento”.

“Não há uma única chave, mas a conjugação de meios que passam pelos recursos, até à formação e capacidade de organização do próprio MP e capacidade de recursos humanos e materiais”, argumenta.

Há muito que Maria José Morgado diz que há leis a mais e que isso não ajuda na solução para o problema do Ministério Público. “Não são as leis que representem soluções. É infinitamente mais difícil modificar as coisas através do modelo de funcionamento e práticas do que através de uma lei que é fácil de fazer. É esse o desafio”, reforça antiga diretora do DIAP, em declarações à Renascença.

Modernizar a organização e adotar tecnologia eficaz

A magistrada jubilada considera que o sistema informático da Justiça é “obsoleto”. Por mais que se diga que é avançado, o sistema não desenvolve a finalidade que devia desenvolver e “provoca muita perda de tempo aos magistrados”.

Maria José Morgado lembra que Portugal “anda em processos legislativos há 20 anos e a lei só por si não é uma varinha mágica”.

Pode fazer-se diferente? Sim. “Há uma coisa que é importante, um sistema informático moderno que não temos, o atual parece uma manta de retalhos, os magistrados precisam de apoio informático moderno e pericial porque a maior parte da prova é digital.”

"Ministério Público está depauperado em matéria de meios sofisticados"

Maria José Morgado lembra que há muitos anos que existe um modelo de produção de prova em plataforma digital concebido para a reunião de prova em julgamento, mas nunca entrou em prática.

Liderança do MP pode fazer diferença

A antiga diretora do Departamento Central de Investigação e Ação Penal considera que “há oscilações no MP dependentes da liderança e isso é inegável (tal como acontece noutras organizações) se tivermos liderança atuante isso reflete-se na base”.

Maria José Morgado afirma que “o fim último de qualquer investigação é o julgamento, até lá o processo é uma inutilidade. Não se anda a investigar por investigar. O julgamento é que dita como acaba um processo. Um processo que não trabalha para o julgamento não é um verdadeiro processo”.

Mas a procuradora jubilada sublinha que, quando algo corre mal, as coisas não podem ser vistas a preto e branco. “Uma absolvição em julgamento não significa sempre que a investigação foi um insucesso completo, mas que não houve certeza da prática dos factos por parte do tribunal. Pode haver erros da investigação, mas também os há dos tribunais. Podem surgir dos dois lados”, considera Maria José Morgado.

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