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Redes sociais são meio de a Igreja chegar às periferias

10 mai, 2013 • Filipe d’Avillez

Internet facilita o anonimato e torna-se facilmente um espaço de conflito e de mentira, mas a Igreja não pode ficar de fora das novas tecnologias, consideram jornalistas e padres ouvidos pela Renascença.

Redes sociais são meio de a Igreja chegar às periferias
A Igreja Católica assinala, no domingo, o Dia Mundial das Comunicações Sociais, sob o lema “Redes Sociais, portais de verdade e fé”.
A mensagem para o dia foi ainda escrita por Bento XVI, mas encaixa numa das principais mensagens do Papa Francisco desde que assumiu o cargo: a da importância de a Igreja sair de si mesma e chegar a quem não costuma ouvir a sua voz.

Na perspectiva de António Marujo, jornalista especializado em religião e com presença na Internet através das redes sociais e do blogue Religionline, esta é uma obrigação da Igreja: “Como o Papa tem repetido, é preciso chegar às periferias e neste nível da linguagem da informação há muitas periferias e as redes sociais são mais uma forma de chegar às pessoas, incluindo as que estão mais longe da vida da Igreja”.

Para o cónego João Aguiar Campos, director do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais da Conferência Episcopal Portuguesa, esta realidade afecta mesmo milhões. O sacerdote, formado em jornalismo, que preside também ao Conselho de Gerência do Grupo r/com - renascença, comunicação, multimédia, recorda que a mensagem do Papa Bento XVI dilui as fronteiras entre o virtual e o real: “Já não há grandes distinções, se é que há alguma, entre o online e o offline e, como a Igreja tem de chegar a todos, se não estiver presente na rede, há milhões e milhões de pessoas que estão ausentes desta proposta. Portanto, chega aí por uma necessidade de evangelizar a todos”.

João Aguiar Campos concorda que a aposta nas redes sociais não deve conduzir ao esquecimento das formas tradicionais de comunicação: “Cometeríamos um erro se abandonássemos as formas tradicionais de contacto, de pregação e de evangelização”, uma vez que “uma rede que ficasse fechada em si e na rede, nesse mundo virtual, não seria uma rede virtuosa. Não chega estar ali a olhar para uma oração escrita ou uma imagem, mas obriga a um encontro pessoal”.

O padre Nuno Rosário Fernandes, director do Departamento de Comunicação do Patriarcado de Lisboa e do jornal “A Voz da Verdade”, também é da opinião de que a Igreja tem deve usar as redes, e usá-las bem, principalmente para evangelizar: “As redes sociais, sobretudo para os cristãos e para a Igreja devem ser um meio de anúncio e de testemunho, porque cada vez mais é preciso que haja coragem de dar a cara”.

Lugar de verdade ou de conflito?

Para o cónego João Aguiar a Igreja está ainda num processo de aprendizagem neste aspecto. Os benefícios são evidentes, mas os riscos começam também a ganhar forma. Entre eles está o perigo do anonimato: “A pessoa entra na rede e muitas vezes não sabemos se aquele que se apresenta como sendo é aquele que diz ser”. 

Esta realidade apresenta um obstáculo ao desejo do Papa Bento XVI, expresso no tema escolhido para este ano: “Redes Sociais: Portais de Verdade e de Fé”. Será mais difícil ser verdadeiro num universo onde é tão fácil esconder-se a identidade? “As redes são reflexo da sociedade e a mentira está muito instalada na sociedade, na medida em que aqui é possível faltar à verdade com menos riscos, provavelmente a cobardia aumenta e por isso mesmo a o risco de manipulação da verdade e do recurso à mentira acaba por ser mais abundante. O anonimato e a irresponsabilidade são alguns dos grandes problemas que as redes têm agora”, diz D. Pio Alves de Sousa, bispo auxiliar do Porto e presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais.

Outra questão passa pela facilidade com que os temas, e a religião está longe de ser excepção, que degeneram em conflitos e discussões de tom desagradável. O padre Nuno, que tem presença pessoal no Twitter e no Facebook, para além de gerir as contas do Patriarcado de Lisboa e de “A Voz da Verdade”, para além de estar activo em vários grupos ligados a estes assuntos, confirma: “O Papa também fala nisto, na sua mensagem, na importância de ser capaz de se aceitar a diferença, a opinião do outro. Facilmente nas redes verificamos que se entra em grandes discussões que por vezes criam um certo mau estar, uma divergência mais agravada”.

Espaço com potencial
Através do blogue com o qual colabora, António Marujo nota que há interesse e espaço para projectos nesta área: “Há aqui espaço para um jornalismo religioso que acompanhe os grandes debates da actualidade não só da Igreja como também da sociedade contemporânea, do mundo e da Europa. Essa tem sido uma preocupação nossa, não reduzir o blogue à esfera estritamente religiosa ou eclesiástica, trata-se simplesmente de mostrar que a questão religiosa atravessa a vida das pessoas”.

O problema que a Igreja, institucionalmente, tem de ultrapassar, é de ver as redes apenas como uma extensão dos meios tradicionais, sem adaptar a forma da mensagem: “A Igreja tem de saber estar na praça pública independentemente dos meios. Tem de saber fazê-lo numa relação pessoal, porque o que continua a predominar é a atitude do púlpito, alguém que fala de cima para baixo, esperando apenas que as pessoas o escutem passivamente. Ou a Igreja é capaz de estar nessa atitude, ou então corre o risco de falar e de já ninguém a escutar”.

O cónego João Aguiar vai no mesmo sentido ao chamar atenção para a forma como algumas dioceses marcam presença na internet: “Não é a mesma coisa ter uns ‘tweets’ incisivos, ainda que breves, que provoquem a fome de quem lê, ou ter uma enorme homilia, ou discurso, e o consumidor olha para aquilo e desiste ao fim de alguns parágrafos”.

A questão é saber até que ponto esta atitude pode mudar na Igreja portuguesa quando os próprios bispos parecem recuar perante as redes sociais. Ao que a Renascença conseguiu apurar, apenas dois bispos estão presentes no Facebook, D. José Cordeiro, de Bragança, e D. Virgílio Antunes, bispo de Coimbra.

Mesmo D. Pio, apesar do cargo que ocupa, confessa que não participa activamente nas redes sociais. “Se calhar pelo receio de não ter condições para dar seguimento, e também tendo em conta a minha própria situação. Pode haver uma exposição excessiva, da qual pessoalmente não gosto”.