Entrevista Renascença

​Câmara Brasileira do Livro espera 600 mil visitantes na Bienal de São Paulo

05 jul, 2022 - 22:01 • Maria João Costa, enviada especial ao Brasil

Presidente da Câmara Brasileira do Livro diz que, em 40 anos de mercado editorial livreiro, “nunca tinha acontecido este volume de gente” na Bienal. Apesar de todas as dificuldades, os brasileiros são “resilientes e a literatura provoca isso” diz Vitor Tavares que confirma que por ano são impressos no Brasil 400 milhões de livros.

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Depois de uma interrupção de 4 anos, com a pandemia pelo meio, o público regressou em massa à Bienal Internacional do Livro de São Paulo. Organizada pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), a feira espera este ano alcançar os 600 mil visitantes. Portugal que é este ano o país convidado da bienal.

Em entrevista à Renascença, o presidente da CBL confirma que na pandemia os brasileiros “começaram a ler mais”. Por ano, indica Vitor Tavares, no Brasil, são produzidos “cerca de 400 milhões de exemplares”, e desses “40% são vendidos nas livrarias físicas”.

Mas o setor do livro passou por uma crise nos últimos anos no Brasil, não só pelas crises económica e política, explica o responsável da CBL, mas também devido à “concorrência agressiva das vendas pela internet”.

Sobre a presença de Portugal na Bienal de São Paulo, Vitor Tavares mostra-se muito satisfeito e, usa uma palavra tupi quando lhe perguntamos pelos seus autores portugueses preferidos. O presidente da CBL refere-se ao seu “xará” (aquele que tem o mesmo nome) Gonçalo M. Tavares, mas também a José Saramago e Valter Hugo Mãe.

Que expetativa tem em relação a esta edição da Bienal Internacional do Livro de São Paulo. Vemos os corredores da feira e os espaços das livrarias e editoras cheios, com filas para pagar. Há muito publico jovem. Era um regresso muito aguardado?

Foram 4 anos que passaram. A 26ª edição só acontece agora, por causa da pandemia. A expetativa é enorme. Eu tenho 40 anos de mercado editorial livreiro, nunca tinha acontecido esse volume de gente. Esperamos receber mais de 600 mil pessoas. Uma coisa interessante é que, com todas as dificuldades no Brasil, a gente sempre se reinventa, somos resilientes e a literatura provoca isso. Há muitas crianças e jovens, é uma alegria, parecem um bando de passarinhos. Como profissional do setor me sinto com a missão cumprida.

Mas o setor do livro em todo o mundo, e imagino que o Brasil não tenha sido exceção sofreu um grande impacto com a pandemia. Como está o setor editorial e livreiro?

Desde 2015 passamos por um problema muito sério na venda por grosso. Foi a crise política, o impeachment de presidente, a quebra do rendimento da população brasileira, tudo isso influenciou. Outra coisa que atrapalhou muito as grandes livrarias foi a concorrência agressiva das vendas pela internet. O mesmo livro que uma livraria compra com um desconto de 50%, encontra vendendo na internet com 50% e prejudicando diretamente as livrarias.

Essas livrarias sofreram muito. As duas grandes redes que para nós eram um orgulho, a Livraria Cultura e a Saraiva fecharam mais de 150 livrarias. Aí o mercado foi se recuperando, percebemos que em 2019 já havia uma recuperação. Foi também uma recuperação na produção literária. Produzimos cerca de 400 milhões de exemplares de livros por ano, no Brasil, 40% dos quais são vendidos nas livrarias físicas.

A pandemia trocou as voltas a essa recuperação?

Foi uma ducha de água fria! Parou tudo. Teve livrarias que fecharam mais de 120 dias. As maiores ainda se mantiveram e porque tinham poder tecnológico, começaram a vender pela internet. Mas as menores fecharam, muitas ficaram desativadas. Pararam de trabalhar.

Uma coisa que percebemos na pandemia, é que o brasileiro começou a ler mais. A gente achou que ia ficar 15 dias em casa, recluso. Mas foi 15, mais 15, mais 15. E começaram a ler mais. Começou-se a vender muitos livros pela internet. Teve um aumento de 300 a 400% em relação ao mesmo período no último ano. O e-book também aumentou, mas foram os livros impressos que mais aumentou.

O que é que os brasileiros leram durante o confinamento da pandemia?

As pessoas tinham os seus livros em casa, começaram a pôr a leitura em dia e começaram a procurar outros livros, sobretudo com temáticas na área da família, religião, romance, livros motivacionais e livros com temáticas políticas. Queriam saber o que estava a acontecer no mundo. De gastronomia também, porque as pessoas começaram a fazer as suas refeições em casa. Então foi uma alavancagem bacana.

Achávamos que iriamos decrescer 20% na pandemia, só descemos 9%. E já em 2021, segundo dados da Câmara Brasileira do Livro, a venda por grosso de livros vendeu 20% a mais do que em 2020. Percebemos que os brasileiros começaram a ler mais buscando novas literaturas.

Foi nesse quadro que começaram a pensar a Bienal do Livro de 2022. O mercado reagiu?

Quando lançamos a Bienal em 2022, depois do adiamento em 2020, houve uma procura muito grande por espaços pelos editores, as livrarias, os Youtubers, os Tik Toks - eles divulgam muito. Os jovens vêm atrás dos seus autores preferidos. É o encontro, de facto, do publico leitor, com o livro e com os seus autores preferidos.

Era uma feira muito aguardada para a revitalização do mercado?

Não estamos como desejávamos. O mercado caiu muito, mas estamos recuperando. Temos esperança que vamos recuperar. Estamos a ver a abertura de várias livrarias independentes nas grandes cidades brasileiras. Só em São Paulo no último ano, abriram mais 15 livrarias, algumas independentes, e livrarias de rua, com empreendedoras mulheres abrindo livrarias e isso é muito bom.

A presença de Portugal este ano como convidado de honra, foi um convite lógico por causa dos 200 anos da Independência do Brasil?

A edição de 26 era para acontecer em 2020. Nós tínhamos um país e já estava tudo acertado, mas com a pandemia não tínhamos ainda assinado o contrato e ficou em stand-by. Aí começamos a falar de 2022. Era o desejo da Câmara Brasileira do Livro, e o desejo acho que da população brasileira, ter Portugal.

Fizemos o convite através da embaixada e o que aconteceu? Eu cheguei ao embaixador de Portugal no Brasil e falei - "Oh, obrigado, nós estávamos preocupados que Portugal não aceitasse esse convite", porque é um ano importantíssimo para os dois países. Ele respondeu: "Senhor Vitor, quem estava preocupado, eramos nós. Também tínhamos esse desejo".

Foi um desejo dos dois lados que uniu os dois povos, e, para nós está a ser muito interessante. É uma alegria ter aqui Portugal com a sua gastronomia e os seus autores. Trazer assim 20 autores que falam português, além dos de Portugal, vocês estão trazendo também autores africanos, e dois chefes de cozinha, é uma conexão Portugal Brasil.

Nessa independência dos 200 anos, estamos a ficar dependentes da gastronomia, e dependentes um dos outros por todos esses acontecimentos desses dois grandes países. Ano a ano, passa governo, passam problemas económicos, crises políticas, crises sociais, guerras, mas nós estamos sempre de mãos dadas pelo meio da nossa língua e da nossa literatura.

Há algum autor português que goste em particular?

Gosto muito, e já o encontrei aqui nos corredores, o Valter Hugo Mãe. O próprio José Saramago que tem uma exposição por causa do centenário. O outro que é meu “xará”, o Tavares, o Gonçalo M. Tavares. Também a Prémio Camões, Paulina Chiziane. Tem muita coisa boa. Pega aí o voo da TAP e vem participar nesta beleza que é a Bienal Internacional do Livro de São Paulo! É um orgulho receber e ter Portugal como país convidado de honra este ano ímpar e icónico para os dois países.

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