03 ago, 2023 - 09:50 • Eduardo Soares da Silva
Veja também:
Francisco pede aos estudantes para "procurarem e arriscarem" em busca de uma "nova coreografia que coloque no centro a pessoa humana". O Papa Francisco falou esta manhã aos jovens universitários na Universidade Católica, no arranque do segundo dia de visita a Portugal para a Jornada Mundial da Juventude.
O Papa apela a que "desconfiemos das fórmulas pré-fabricadas", naquele que considera um "processo que um universitário compreende bem, pois é assim que nasce a ciência".
"Desconfiemos das respostas que nos parecem ao alcance da mão, extraídas da manga como se fossem cartas viciadas de jogar; desconfiemos das propostas que parecem dar tudo sem pedir nada. A desconfiança é uma arma. Procurar e arriscar: eis os verbos dos peregrinos ", alerta.
Tal como no seu primeiro dia em Lisboa, Francisco voltou a citar Fernando Pessoa, poeta que afirmou de "forma atormenada, mas correta" que "ser descontente é ser homem".
No entanto, o Papa descansa os jovens: "Não devemos ter medo de nos sentir inquietos, de pensar que tudo o que possamos fazer não basta".
"Neste sentido e dentro duma justa medida, ser descontente é um bom antídoto contra a presunção da autossuficiência e o narcisismo. O ser incompleto carateriza a nossa condição de indagadores e peregrinos, pois, como diz Jesus, estamos no mundo, mas não somos do mundo", aponta.
Francisco recorda a mensagem da missa de abertura da Jornada Mundial da Juventude, na terça-feira, quando D. Manuel Clemente apelou aos jovens para "a realidade virtual pela realidade verdadeira".
O Papa desafia os universitários a serem protagonistas de uma "nova coreografia".
"Preocupemo-nos antes quando estamos prontos a substituir a estrada a fazer por qualquer estação de serviço que nos dê a ilusão do conforto; quando substituímos os rostos pelos ecrãs, o real pelo virtual; quando, em vez das perguntas lacerantes, preferimos as respostas fáceis que anestesiam . Amigos, permiti dizer-vos: procurai e arriscai. Os desafios são enormes e os gemidos dolorosos, estamos a ver uma terceira guerra mundial. Sede protagonistas duma «nova coreografia» que coloque no centro a pessoa humana, sede coreógrafos da dança da vida".
JMJ Lisboa 2023
No Mosteiro dos Jerónimos, num encontro com o cler(...)
Na presença de milhares de jovens que aguardaram horas para ouvir as palavras do Papa, Francisco pede aos jovens para aproveitarem o "privilégio" que continua a ser frequentar o Ensino Superior.
"Seria um desperdício pensá-la apenas para perpetuar o atual sistema elitista e desigual do mundo com o ensino superior que continua a ser um privilégio de poucos. Se o conhecimento não for acolhido como uma responsabilidade, torna-se estéril. Se quem recebeu um ensino superior – que hoje, em Portugal e no mundo, continua a ser um privilégio –, não se esforça por restituir aquilo de que beneficiou, significa que não compreendeu profundamente o que lhe foi oferecido", alerta.
Um título de estudo "não deve ser visto apenas como uma licença para construir o bem-estar pessoal, mas como um mandato para se dedicar a uma sociedade mais justa e inclusiva, ou seja, mais avançada".
Francisco regressa às referências do seu primeiro discurso no Centro Cultural de Belém e cita novamente Sophia de Mello Breyner Andresen, desta vez numa entrevista em 2011, quando respondeu à questão "o que gostaria de ver realizado em Portugal" com "que se realizasse a justiça social, a diminuição das diferenças entre ricos e pobres".
"Sonhei com um país onde todos chegavam a Mestres". A frase é do escritor Almada Negreiros em "A Invenção do Dia Claro", também citado por Francisco.
"Também este idoso que vos fala sonha que a vossa geração se torne uma geração de mestres: mestres de humanidade, mestres de compaixão, mestres de novas oportunidades para o planeta e seus habitantes, mestres de esperança", diz Francisco.
Francisco reconhece uma "urgência dramática de cuidar da casa comum". Mas isso só acontecerá com "visões de conjunto".
É necessário "redefinir o que chamamos de progresso e evolução". Para isso, o Papa conta com a "geração que pode vencer o desafio" por ter à disposição "instrumentos científicos e tecnológicos mais avançados, mas, por favor, não vos deixeis cair na cilada de visões parciais".
"Não esqueçais que temos necessidade duma ecologia integral, de escutar o sofrimento do planeta juntamente com o dos pobres; necessidade de colocar o drama da desertificação em paralelo com o dos refugiados; o tema das migrações juntamente com o da queda da natalidade; necessidade de nos ocuparmos da dimensão material da vida no âmbito duma dimensão espiritual. Não queremos polarizações, mas visões de conjunto", alerta.
Francisco termina o discurso a expressar a sua felicidade por "por ver-vos uma comunidade educativa viva, aberta à realidade, com o Evangelho que não se limita a servir de ornamento, mas anima as partes e o todo".
"Uma tradição medieval conta que quando os peregrinos se cruzavam no Caminho de Santiago, um saudava o outro exclamando 'Ultreia' ao que este respondia 'et Suseia'. Trata-se de expressões de encorajamento para prosseguir a busca e o risco da caminhada, dizendo a si mesmo: 'Vai mais longe e mais alto!' 'Coragem, força, anda para diante!' Isto é o que vos desejo também eu, de todo o coração", termina, com um sorriso.
Após o discurso, o Papa Francisco foi aplaudido de pé pelas cerca de sete mil pessoas que estavam presentes.