27 fev, 2024 - 00:01 • Fátima Casanova , Diogo Camilo
O número de chumbos a subir, mais alunos estrangeiros e a falta de professores são três dos aspetos que sobressaem no relatório “Estado da Educação 2022”, divulgado esta terça-feira pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), e que mostra uma inversão da tendência descendente na taxa de retenção no terceiro ciclo do ensino básico e no ensino secundário, mostrando os efeitos da pandemia da covid-19. Entre várias propostas, o órgão consultivo do Ministério da Educação defende o fim do 2.º ciclo.
Depois de vários anos consecutivos de descida, os números do ano letivo 2021/22 mostram uma subida da taxa de retenção para os 8,6% no ensino secundário - era de 8,3% no ano anterior - e de 4,5% no terceiro ciclo - era de 4,3% em 2020/21.
Esta é uma subida “residual”, mas que mostra as dificuldades dos alunos, especialmente daqueles que têm mais dificuldades económicas, na opinião do presidente do CNE, Domingos Fernandes.
“Os alunos que estamos agora a falar, sobretudo os do terceiro ciclo, provavelmente tiveram uma diversidade de situações, num certo afastamento da escola durante o período da pandemia”, considera, em declarações à Renascença.
O responsável do CNE refere ainda que o plano de recuperação de aprendizagem lançado pelo Governo não conseguiu atingir os objetivos. “Talvez tenha pecado por um número excessivo de medidas. E talvez tenha pecado por não haver uma maior focagem nas aprendizagens que era necessário recuperar.”
Os alunos em dificuldades e que mais reprovam, segundo Domingos Fernandes, são quem vem de “famílias débeis do ponto de vista económico, social e cultural e alunos estrangeiros que não falam português”, defendendo a necessidade de investimento na disciplina de Português, Língua Não Materna.
“É preciso criar todas as condições possíveis para que essa disciplina seja dada com melhor qualidade possível”, acrescenta.
O estudo aponta ainda para um aumento dos alunos estrangeiros. No ano letivo 2021/22 estavam matriculados quase 106 mil alunos estrangeiros, o que significa mais 17.500 face ao ano anterior.
Nas escolas estavam matriculados alunos de 246 nacionalidades diferentes, a maioria deles brasileiros, representando 40%.
O presidente do CNE sublinha que é necessária a boa integração destes alunos. “Se o sistema, em vez de integrar as pessoas, as discrimina, não vamos ter melhor sociedade. Hoje é uma realidade incontornável que os países têm pessoas estrangeiras, provenientes de mais de uma centena de países. Portanto, isto tem de ser enfrentado com muita determinação.”
No relatório, o Conselho Nacional de Educação identifica o segundo ciclo como um enclave que é preciso eliminar, transformando o primeiro ciclo do ensino básico num ciclo de seis anos, à semelhança do que já acontece noutros países europeus.
À Renascença, Domingos Fernandes defende que esta é uma transição que não se justifica e admite avançar com uma recomendação neste sentido ao governo que sair das eleições legislativas de 10 de março.
“Temos todos os dados que nos indicam que o segundo ciclo não faz sentido. Não há qualquer justificação para que os meninos e as meninas tenham uma transição desta dimensão do 4.º ano para o 5.º ano. Quer dizer, as crianças têm um professor e depois passam a ter 13 ou 12 professores. É uma transição que não se vê em nenhum país da Europa”, defende.
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O relatório caracteriza ainda uma realidade dramática: a classe docente está a envelhecer a um ritmo vertiginoso e já mais de metade dos professores apresenta 50 ou mais anos de idade. Destes, quase 30% tem mais de 60 anos, ou seja, mais de 35 mil professores estão próximos da idade de aposentação.
O retrato do sistema de ensino refere que, a cada ano letivo, vai ser preciso contratar quase 3.500 novos docentes para colmatar as saídas. No entanto, no ano letivo 2021/22, apenas 1.682 diplomados concluíram cursos que conferem habilitação para a docência e em certas áreas, como Espanhol, Alemão e Francês, não existiu qualquer diplomado.
No relatório são registados apenas 3.653 professores até aos 30 anos de idade, representando cerca de 2,5% do total de 150 mil professores no sistema de ensino.
Para ultrapassar a falta de professores, o presidente do CNE defende, no imediato, o recrutamento de licenciados sem formação pedagógica, mas com condições: “o recrutamento tem de prever o acompanhamento pedagógico, a formação pedagógica desses professores”.
O responsável refere também que, a médio prazo, o salário dos professores em início de carreira deve ser aumentado. “No topo da carreira, o salário dos nossos professores no oitavo, nono e décimo escalão, não comparam mal com aquilo que se verifica em muitos países da Europa. Mas, no início sim, comparam bastante mal”, afirma Domingos Fernandes, que defende o descongelamento dos seis anos, seis meses e 23 dias da carreira docente.