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Retrato à Covid-19 em Portugal: forças, fraquezas e ameaças. A reunião no Infarmed em 10 pontos

23 mar, 2021 - 15:30 • João Carlos Malta

A reunião do Infarmed, que dedorreu nesta terça-feira de manhã, e que acolheu as intervenções de sete especialista, ajudou a fazer um diagnóstico ao estado atual da evolução da pandemia em Portugal. Da incidência, ao R, passando pelas novas estirpes, e a vacinação, confira tudo o que se disse sobre o novo coronavírus em Portugal.

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Apesar de o diagnóstico geral ser bom em relação ao que se passa em Portugal no que à Covid-19 diz respeito, os especialistas ouvidos na reunião do Infarmed desta terça-feira não deixaram de sublinhar alguns fatores de alerta para os próximos tempos.

Neste encontro estiveram André Peralta Santos, da DGS, Ricardo Mexia, Baltazar Nunes e João Paulo Gomes, do Instituto Ricardo Jorge, Henrique Barros, do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, Carla Nunes, da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa, e Henrique Gouveia e Melo, coordenador da task-force para o Plano de Vacinação.

Incidência baixa, R cresce

Mantém-se a tendência de descida geral da taxa de incidência da doença. Atualmente, os concelhos acima dos 120 casos por 100 mil habitantes são “poucos” e “dispersos”, e concentram-se em zonas de pouca densidade populacional, ou seja, fora das regiões de Lisboa e do Porto. No total, a incidência é de 79 casos por 100 mil habitantes.

Em relação à taxa de transmissibilidade, a média a cinco dias do R é de 0,89, quando na última reunião estava nos 0,64.

O investigador do Instituto Ricardo Jorge, Baltazar Nunes, explicou que o valor do R tem vindo a aumentar, e que esse crescimento é “natural” porque reflete a redução do número de casos.

Salienta também que deverá haver um abrandamento da velocidade de decréscimo da taxa de transmissibilidade, o que ressalvou "também tenha riscos”.

Mais de 80 anos já não é o grupo mais atingido

Atualmente, a faixa etária entre os 20 e 30 anos é a que apresenta maior incidência de contágios. Antes eram as pessoas com mais de 80 anos, os que ocupavam o topo da lista. Na reunião do Infarmed foi dito que os novos casos serão entre os mais novos, o que reflete já as opções tomadas em termos de vacinação por Portugal.

Verifica-se ainda que entre os que têm mais de 80 anos há “uma redução bastante acentuada”. Isso, naturalmente, tem reflexos nos internamentos e na letalidade da doença no país.

Crianças e jovens com menor incidência e talvez menor risco de transmissibilidade

Henrique Barros, presidente do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, detalha que, com os estabelecimentos de ensino abertos, a infeção sobe e com as escolas fechadas sobe mas depois desce. “São as pessoas mais velhas que infetam primeiro”, diz o presidente do instituto. “As medidas de mitigação e proteção no âmbito escolar foram levadas muito a sério, por isso, os nossos resultados foram diferentes do que noutros países onde isso não aconteceu”.

O mesmo médico sublinha ainda que as crianças e os adolescentes têm um menor risco de infeção, e apesar de a evidência científica não ser forte, Barros aponta uma menor transmissibilidade da doença nos mais novos. "As pessoas mais velhas é que infetam primeiro".

Outra das conclusões da análise deste médico é a de que os agregados com crianças não apresentam uma diferença assinalável na taxa de infeção do que as restantes.

Variantes preocupam

João Paulo Gomes, do Instituto Ricardo Jorge, revela que a variante britânica é prevalente em mais de 80% dos casos no nosso país. Portugal está com um “crescimento bastante acelerado”, e por isso o investigador acredita mesmo que, em breve, 90% dos casos sejam desta estirpe.

Em Lisboa e Vale do Tejo corresponde atualmente a 73,3% e 70% no Algarve, enquanto no Norte ultrapassa os 60%. A letalidade de quem está infetado com esta variante é maior.

O perito destaca a importância do controlo de fronteiras nesta altura, ao nível do “historial de viagem” dos passageiros que chegam a Portugal de avião, para que não se espalhe tanto como a variante do Reino Unido.

A variante da África do Sul é aquela em que há mais casos de falhas nas vacinas.

Identificar novas estirpes

João Paulo Gomes, do Instituto Ricardo Jorge, propôs um aumento de amostragem dos casos positivos, sendo para isso necessário o alargamento a rede de laboratórios que fazem este trabalho de sequenciação. Para isso convidou os laboratórios privados a recolherem mais amostras.

O mesmo especialista disse que é necessário apostar na retestagem, com testes PCR, de quem tiver dado positivo em testes rápidos.

Isso ajudaria a encontrar as mutações associadas às novas estirpes, e a poder atuar mais rapidamente.

Vacinação

Para estarmos completamente seguros, a faixa etária a vacinar terá de ir até estas idades”, afirmou André Peralta Santos da DGS. A grupo que se referia é a população dos 40 aos 60 anos. Isto porque só esta faixa etária é suficiente para ultrapassar o indicador de 245 camas em cuidados intensivos, se uma situação como a de janeiro se repetir.

As metas de vacinação mantêm-se em 70% da população até ao final do terceiro trimestre, sendo que foi dito que se as 14,9 milhões de doses. chegarem até setembro, então essa percentagem pode ser logo atingida no início do terceiro trimestre.


EVOLUÇÃO DA VACINAÇÃO PARA A COVID-19 EM PORTUGAL

O responsável pela task-force da vacinação, Gouveia de Melo, afirmou também que Portugal já tem 90% de cobertura da vacina contra a covid-19 em lares, e que o valor só não é maior por causa de alguns surtos que ocorreram. A população com mais de 80 anos também já tem uma taxa de cobertura de 83%, e as pessoas com mais de 50 anos com comorbilidades uma percentagem de 67%.

Notificação da testagem deve ser simplificada

O presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública, Ricardo Mexia, disse que vai existir também um sistema de notificação para informar de forma “ágil” a testagem feita, seja por plataformas web ou aplicações, e referiu que “tem de haver forte capacidade de resposta” aos casos verificados.

Em relação à estratégia deste plano, ele vai incidir nas zonas onde há mais casos, quer se tratem de áreas de atividade ou geográficas, e também nos locais onde há maior exposição e entre as populações mais vulneráveis, como trabalhadores sazonais, sem abrigo ou migrantes, e nos e serviços essenciais, tais como bombeiros, serviços de saúde e de segurança.

Mexia fez questão de salientar que “os testes não se substituem uns aos outros”, e defende que “a vigilância epidemiológica e das variantes que circulem faz com que seja fundamental fazer testes PCR para assegurar estas vertentes”.

Idade e sexo aumentam mortalidade

Henrique Barros avançou que a taxa de letalidade da doença é agora de 2%. Mas como o especialista calcula que haja três vezes mais casos de infeção dos que são reportados oficialmente, então essa taxa na realidade será de 0,7%.

O risco de morrer aumenta muito com a idade e é maior entre os homens.

A região em que há menor risco de falecer com a doença é a Madeira, em que a taxa de mortalidade é metade da que se verifica no Norte do país

Um em cada cinco pessoas têm sequelas psicológicas

Um em cada cinco portugueses sente-se agitado, ansioso ou triste, alerta Carla Nunes, da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa. A investigadora apresentou as conclusões sobre as perceções sociais dos portugueses, de 6 de março a 19 de março.

A perceção sobre o estado de saúde geral mantém-se estável. Já o estado de saúde mental, em concreto, ainda assim melhorou no verão e no Natal, ou seja, em períodos de maior desconfinamento Os quadros de saúde mental são piores entre as mulheres e os mais novos.

Maus comportamentos crescem ligeiramente. Uso de máscara cai, mobilidade aumenta

Houve uma melhoria nos comportamentos dos portugueses desde setembro em relação às medidas de combate à pandemia.

No entanto, nas últimas duas ou três quinzenas verificou-se um “ligeiro aumento de piores comportamentos”.

Os portugueses consideram que lavar as mãos, por exemplo, é uma medida fácil de adotar, o mesmo já não se verificando com os dois metros de distância e as visitas a amigos ou familiares.

O uso de máscara fora de casa e com outras pessoas diminuiu ligeiramente, de 91% que usavam sempre em fevereiro para 86% até dia 19 de março

A mobilidade dos portugueses também está a crescer. A frequência com que as pessoas saíram de casa no último mês sem ser para ir trabalhar passou num mês de 17% para 26,4%. No distanciamento de 2 metros, foi de 8,9% para 12,2%. Em relação a estar com dez ou mais pessoas, a percentagem é de agora 4,9%, quando um mês antes não passava de 1,8%.


EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE CASOS DIÁRIOS DE COVID-19 EM PORTUGAL

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