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Guerra Israel-Hamas

Protestos espalham-se por Israel. “Não temos líderes, estamos por nossa conta”

04 nov, 2023 - 23:10 • Catarina Santos , enviada da Renascença a Israel

Centenas de pessoas pediram a demissão do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu em Jerusalém. Milhares juntaram-se em Telavive contra o “abandono dos reféns”. As críticas à estratégia do governo na gestão do conflito são cada vez mais audíveis nas ruas israelitas.

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Cerca de 2.000 pessoas reuniram-se ao final da tarde deste sábado em frente à residência do primeiro-ministro, em Jerusalém — que fica ao lado da Rua de Gaza —, para exigir a demissão de Benjamin Netanyahu. A polícia montou barricadas, que foram derrubadas por alguns manifestantes, e considerou o protesto ilegal.

Ao jornal israelita Haaretz, as forças de segurança sublinharam que tiveram de desviar meios de outros locais da cidade onde decorriam “missões de segurança”.

Entre os manifestantes estava Reuven Amitai, professor de História Muçulmana na Universidade Hebraica. Garantiu que vai “continuar a encorajar o Bibi [alcunha pela qual é conhecido o primeiro-ministro] a demitir-se", mas juntou-se logo em seguida a outra manifestação, a dois quilómetros dali, para apoiar as famílias dos 242 reféns que estarão nas mãos do Hamas.

“Ainda estamos a recuperar, as pessoas ainda estão em choque e emocionalmente perturbadas”, afirmou, em declarações à Renascença. “Independentemente de onde nos situemos no espectro político ou o que pensemos do governo, podia ter sido qualquer um de nós.”

Juntou-se, por isso, às poucas centenas que gritavam “não há mais tempo, trangam-nos de volta agora”, em frente ao Cinema City de Jerusalém. “Creio que é o mais importante para quase todos os israelitas. É o primeiro objetivo. Queremos os nossos reféns, camaradas, compatriotas de volta e espero que o governo entenda quão importante isso é.”

Garantir que "o governo não perde o foco”

“Quando vemos cada um dos cartazes, encontramos sempre uma cara que ainda não tínhamos visto. São tantos!”, afirma Connie Green, segurando um cartaz de um jovem de 21 anos que desconhece.

Assim que começou a operação militar em Gaza, vários familiares de reféns mostraram-se alarmados com a segurança dos israelitas em cativeiro, defendendo que essa deveria ser a prioridade do governo. Connie também expressa reservas: “O governo diz que podemos perseguir dois objetivos ao mesmo tempo: lutar contra o Hamas e trazer os reféns de volta. Não é claro que se possa fazer as duas coisas ao mesmo tempo.”

Por isso decidiu juntar-se ao protesto, entre cartazes pendurados em sinais de trânsito e vedações de jardins. “É muito importante manter o assunto dos reféns presente na consciência de todos”, considera.

“Queremos garantir que o governo não perde o foco”, acrescenta ao seu lado David Green, que também participou em ambas as manifestações. "Israel sempre teve uma política, com a qual todos concordam, de trazer os nossos soldados de volta, em qualquer circunstância, vivos ou para serem enterrados. Isso deveria aplicar-se aqui também”, sustenta.

Manifestantes contra reforma na justiça são agora voluntários

Durante alguns minutos, o protesto cortou uma das vias de trânsito no local. Munidos de megafones e tambores, um setor mais jovem da concentração improvisava coreografias enquanto exigia o regresso dos reféns “agora, agora, agora!”.

Um apelo que Noam, estudante na Universidade Hebraica, quer estender “a Portugal e a todo o mundo”, apelando a que não esqueçam o tema e que se envolvam, “não só pelas centenas de reféns, mas por todas as vidas que estão a perder-se sem nenhum bom motivo". "Penso que todo o mundo deveria encontrar uma forma de reduzir as mortes de ambos os lados”, sustenta.

Noam integra uma organização de estudantes que se formou durante os protestos contra a reforma da justiça — que retira poderes ao Supremo Tribunal e que levou milhares às ruas nos últimos meses. O poder organizativo que adquiriam então foi canalizado agora para ações de voluntariado no apoio às vítimas dos ataques de 7 de setembro.

“Todos os cidadãos de Israel se uniram agora, porque havia muito que fazer pelos civis”, adianta Noam. “Alguém tinha de o fazer, o governo não o fez, por isso os civis organizaram-se."

Ao seu lado, Aviya, estudante ainda no liceu, não hesita um segundo a complementar: “Não temos líderes, estamos por nossa conta. Quando isto acabar, vamos ter de reconstruir tudo a partir das cinzas. Vamos ter de ser nós.”

Milhares em Telavive contra “abandono dos reféns”

Os protestos estenderam-se a cidades como Be’er Sheva, Haifa, Eilat e, claro, Telavive, onde milhares se juntaram em frente à sede do Ministério da Defesa e das Forças de Defesa israelitas.

Perante a multidão, Ramos Aloni, que tem cinco familiares em cativeiro (duas filhas, o genro e duas netas, de três e cinco anos), exige que a ajuda humanitária aos cidadãos de Gaza seja travada até que os reféns a possam receber também.

“Os reféns precisam de cuidados médicos, como nos é pedido que demos a outros”, afirmou, exortando o primeiro-ministro a “dizer em hebraico e articular eloquentemente em inglês” que “não haverá cessar-fogo sem a libertação de todos os reféns.”

Uma residente do kibbitz Be’eri, um dos atacados a 7 de outubro, sustentou, por seu turno, que “não é suficiente eliminar o Hamas”, exigindo um “regresso dos valores”, que traduziu em forma de aviso: “Sr. primeiro-ministro, a 7 de outubro abandonaram-nos todos ao nosso destino. Não vamos permitir que abandone os reféns e os desaparecidos e a nossa segurança novamente”.

É ali nas redondezas que funciona a sede do Fórum das Famílias dos Reféns e Desaparecidos, uma organização que se formou espontaneamente logo a seguir aos ataques do Hamas e que junta mais de 100 voluntários no apoio emocional, legal e logístico às famílias afetadas. E é essa estrutura que tem colocado em marcha os maiores protestos e ações de pressão junto do governo israelita.

Algumas famílias acamparam no local, na noite de sexta-feira, e garantem que só removem as tendas quando os reféns regressarem.

"As vidas deles estão nas vossas mãos”, lia-se no cartaz que convocava a concentração deste sábado — e onde se alinhavam os rostos do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, do ministro da defesa Yoav Gallant e de Benny Gantz, opositor político de Netanyahu que agora integra o gabinete de guerra.

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