16 nov, 2022 - 17:27 • Fábio Monteiro
A resolução do Banif, em 2015, ainda pode vir a tornar-se um caso de polícia. Pelo menos, foi esse o repto lançado, na terça-feira, pelo ex-líder social-democrata e comentador televisivo Luís Marques Mendes.
Durante a apresentação do livro “O Governador”, sobre a década que Carlos Costa foi governador do Banco de Portugal, Marques Mendes afirmou que o Ministério Público (MP) devia abrir uma investigação criminal à forma como foi vendido o banco.
Com base no livro, Mendes referiu que, enquanto "havia em curso um processo de venda do Banif" de forma pública, "de forma confidencial o Governo informava Bruxelas por carta que o banco estava em processo de resolução".
"Espero bem que o Ministério Público possa ler os capítulos do livro que têm a ver com o Banif, e se ler não pode deixar de abrir uma investigação criminal. É um caso típico de abuso de poder e favorecimento de uma sociedade. Por muito menos, já vi o Ministério Público abrir inquéritos e constituir arguidos", afirmou.
Para perceber o peso das palavras de Marques Mendes é preciso recordar o como, o porquê e o momento da resolução do Banif.
À imagem do que aconteceu com a resolução o Banco Espírito Santo, que foi divido num “banco bom” e “banco mau”, o Banif também foi partido ao meio no momento da venda.
Em 2015, os ativos considerados de “boa qualidade” foram vendidos ao Grupo Santander Totta.
Já os de “má qualidade” passaram a ser geridos e responsabilidade de uma sociedade anónima – a Oitante, S.A. -, constituída pelo Banco de Portugal.
O Santander Totta pagou 150 milhões de euros pelos ativos de “boa qualidade” do Banif.
O negócio envolveu um total de 2,25 mil milhões de euros em apoios públicos, 1,766 mil milhões cobertos diretamente pelo Estado português.
Para fazer face aos ativos tóxicos, a Oitante, aquando da sua constituição, contraiu um empréstimo de 746 milhões de euros com o Santander Totta. (Esta dívida foi amortizada na sua totalidade a 30 de junho de 2022.)
A Oitante foi criada com o propósito de “alienar elementos patrimoniais” do Banif não necessariamente tóxicos, mas que, no momento da resolução, pelo menos não interessaram ao Santander Totta.
Das 38 participações financeiras que recebeu, a Oitante detém apenas 5 neste momento.
Do stock inicial de 5.673 imóveis, no final de 2011 tinha já 1.528.
Recuemos ao período da troika. Em 2012, o Banif foi um dos quatro bancos nacionais a recorrer ao dinheiro emprestado para cumprir os rácios de solidez. Então, recebeu uma injeção 1,1 mil milhões de euros, o que levou também o Estado a entrar na estrutura acionista. Esta ajuda foi aprovada pela Comissão Europeia, mas com condições.
Para receber a transferência, o Banif assumiu o compromisso de avançar com um processo reestruturação, diminuir custos e aceitou um calendário para devolver o valor injetado pelo Estado.
Ora, quando o banco falhou um dos pagamentos, Bruxelas lançou uma investigação: a ajuda estatal poderia ser ilegal por conferir um benefício concorrencial ao Banif.
O Estado, no entretanto, não foi capaz de encontrar um comprador para a sua participação. No final de 2015, Bruxelas pressionou para uma solução.
Sem a venda ao Santander, o Estado teria de ir buscar o dinheiro ao banco - o que colocaria os seus rácios em risco e obrigaria a uma intervenção… do Estado, de modo a proteger os clientes da instituição.