21 out, 2024 - 12:59 • Inês Braga Sampaio
O Hertha de Berlim proibiu a utilização do slogan "HaHoHe and fat booty", uma expressão comum em comentários dos adeptos nas publicações do clube alemão nas redes sociais, por associação ao Nazismo.
O termo "HaHoHe" é um cântico tradicional da equipa de Berlim. No entanto, a segunda parte da frase tem uma origem mais problemática. Na rede social X, antigo Twitter, o Hertha explica que a expressão "fat booty" tem, quando associado a outros slogans, ligações históricas ao contexto de guerra e ao extremismo de extrema-direita. Junto com "Sieg Heil" ("salve a vitória"), era um cântico entoado na Alemanha Nazi.
"Muitos de vocês que usam e espalham a expressão provavelmente não sabem da sua origem. Contudo, gostaríamos de vos pedir para não a disseminarem, nem a atitude que pode acompanhá-la. Por favor entendam que eliminaremos consistentemente comentários que contenham esta frase. Não é compatível com os nossos valores, portanto, não tem lugar nos nossos canais", lê-se numa longa publicação do clube.
O Hertha termina com a garantia de que se "distancia fortemente de slogans e ideologia Nazis" e que não associa o desporto à guerra.
"Pelo azul e o branco e por uma cultura de memória - contra a trivialização e a glorificação da era Nazi", apela o clube de Berlim.
O próprio Hertha tem uma relação histórica complicada com o Nazismo. A começar pela "casa" que utiliza, o Estádio Olímpico de Berlim, mandado construir por Adolf Hitler para os Jogos Olímpicos de 1936, que eram vistos pelo líder nazi como uma oportunidade de promover o seu regime e a sua ideologia de supremacia racial.
Também durante a II Guerra Mundial, Hitler operou uma revolução no clube e colocou Hans Pfeifer, membro do Partido Nazi, como presidente. Contudo, um historiador contratado pelo clube para investigar o seu passado, em 2007, concluiu que o Hertha "não foi infetado pelo Nacional-Socialismo" durante o Terceiro Reich.
Esta não é a primeira vez que um clube de futebol proíbe ou desaconselha uma expressão ou um cântico que considera impróprio, discriminatório ou ofensivo.
Em abril de 2011, o Tottenham avisou que não toleraria que os seus adeptos entoassem cânticos considerados racistas contra Emmanuel Adebayor, antigo avançado do Arsenal (grande rival dos Spurs), numa visita do Real Madrid a contar para a Liga dos Campeões.
A Federação Inglesa de Futebol (FA) pediu aos adeptos que não cantassem "No Surrender (to the IRA)", em maio de 2013, num jogo com a República da Irlanda. Um apelo que não surtiu efeito. Em novembro de 2014, numa partida frente à Escócia, a exigência repetiu-se e, desta vez, os adeptos acataram - porém, cantaram expletivos contra a IRA. Canção continua a ser entoada de vez em quando, como diante de Portugal, na Final Four da Liga das Nações, e num jogo da fase de qualificação para o Euro 2020, contra a República Checa.
Em março de 2017, a FA baniu um cântico sobre a II Guerra Mundial, "Ten German Bombers", mas os adeptos ingleses voltaram a entoá-lo num amigável de preparação para o Euro 2024, com a Bósnia e Herzegovina. As autoridades alemãs pediram, então, aos fãs britânicos que não fossem "idiotas" e não cantassem a música durante o torneio.
Álvaro Morato ficou chocado quando, em setembro de 2017, ouviu cânticos antissemíticos num jogo do Chelsea com o Leicester City, em referência ao Tottenham. No final, pediu, nas redes sociais, que o episódio não se repetisse. O clube "blue" prometeu banir quem voltasse a entoar esses cânticos.
Em janeiro de 2023, a FA passou a classificar o cântico "Rent Boy", cantado contra o Chelsea e com conotações homofóbicas, como um crime de ódio.
A partir de abril de 2023, o chamado "tragedy chanting" - cânticos provocatórios sobre tragédias - passou a poder levar a detenções e interdições de estádios no Reino Unido. A alteração da lei surgiu após jogos do Liverpool com Chelsea e Manchester United em que adeptos de "blues" e "red devils" cantaram sobre o desastre de Hillsborough - foi criada uma petição, que reuniu mais de 17 mil assinaturas, para tornar os cânticos sobre tragédias um delito criminal.
Tensão nos Balcãs entre sérvios, albaneses e croat(...)
Não relacionado com cânticos, mas associado às cicatrizes da II Guerra Mundial, em junho de 2023 a Federação Italiana de Futebol baniu o número 88 nas camisolas dos jogadores. Decisão inserida numa iniciativa de combate ao antissemitismo, uma vez que número pode ser uma referência ao nazismo, e estendida à comercialização dos equipamentos da seleção italiana.
Itália é, aliás, terreno fértil para polémicas. Há uma "trégua" entre os ultras de Inter e AC Milan, que não entoam cânticos com referência a violência entre si. Após um dérbi, em julho de 2023, contudo, Di Marco cantou e os adeptos revoltaram-se contra ele.
Em outubro de 202, o Manchester City baniu dois menores por cântico "vil" sobre Bobby Charlton, após o anúncio da morte do antigo jogador do United, durante um jogo frente ao Brighton. O clube inglês identificou os responsáveis via câmaras de segurança, baniu-os e partilhou os seus dados com a polícia de Manchester.
Há mais um caso ligado ao Euro 2024. A UEFA baniu a canção "L'amour Toujours" por associação com sentimentos xenófobos. Isto porque a extrema-direita alemã criou a sua própria versão e a letra adaptada inclui "Alemanha para os alemães" e "estrangeiros fora". De forma a manter a paz, o organismo que rege o futebol europeu decidiu proibir a música - um exemplo que o famoso festival de cerveja alemão Oktoberfest seguiu, em Munique.