07 fev, 2017
Ao ler as notícias e os vários registos actuais das afirmações dos líderes políticos, nomeadamente do recentemente empossado em Washington, e ao ouvir os vários comentadores e fazedores de opinião, ocorre-me que o grande desafio que se nos coloca é o da resistência militante.
Não desistir, não relativizar, persistir e defender inabalavelmente os valores que sustentam a nossa civilização e que são os únicos que ainda, e de forma por vezes imperfeita, são baluarte de uma promessa de paz e de justiça.
As propostas que surgem em catadupa atordoante são assustadoras. Referindo somente algumas, e a título de exemplo, cito o fechamento aos outros, a interdição de entrada a alguns (por razões de pertença a uma confissão religiosa), a menorização dos grupos excluídos e a respectiva sujeição a reiteradas discriminações, a aceitação de práticas há muito consensualmente rejeitadas, como o uso da tortura. Muito do que se ouve é igualmente assustador: outros fizeram ou outros fazem. E parece tudo afinal tão fácil, tão terrivelmente possível.
A ocorrência ou a prática do errado nunca pode ser forma de explicação ou de aparente aceitação inevitável e tácita. Bem pelo contrário, são sinais de uma sociedade desorganizada que, de forma dita pragmática, vai relativizando sucessivamente o atropelo dos valores que sustentam a nossa civilização, de uma sociedade que se vai fechando e tornando obscura e que, de forma insustentável, faz do medo a sua arma vital, do outro o inimigo a dominar.
No nosso mundo global, a pobreza do outro é a minha pobreza, a discriminação do outro é a minha discriminação e exclusão, e por isso, a diversidade do outro é a razão da minha riqueza, a abertura ao outro e a construção com o outro, a promessa de um desenvolvimento sustentável e de uma paz duradoura.
O mundo não se fecha porque alguém quer ou o decreta, mas o mundo pode ficar em perigo se nos recolocarmos em ilhas fechadas que se hostilizam e desconhecem.
O tribunal americano que rejeitou o decreto presidencial de interdição de entrada a alguns é bem o exemplo da atitude que não desiste na defesa intransigente de direitos fundamentais. Resistir militantemente é, sem dúvida, o desafio que a todos se coloca.