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Opinião de Manuel Pinto
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​Papel do jornalismo na fase pós-incêndios

23 out, 2017 • Opinião de Manuel Pinto


A tentação de um certo jornalismo de vistas curtas poderá ser virar os focos para outros lados, até porque a fase da reconstrução não fornece imagens impactantes.

As notícias incidem, em geral, mais sobre aquilo que preocupa e revolta do que sobre aquilo que tranquiliza e apraz. ‘Boas notícias não são notícia’ é, de facto, ditado antigo. Mas quando a marcha de uma sociedade é fértil em acontecimentos de carga negativa ou o olhar de quem os relata tende a ver e a puxar apenas pelo lado negro, não é de admirar que isso provoque ansiedade nas pessoas e redunde em cansaço e afastamento.

A verdade é que, em geral, as notícias portadoras de violência, ameaça e alarme continuam a vender e a fazer audiências.

A devastação dos grandes incêndios em Portugal representou uma tragédia inqualificável, não apenas pela destruição extensiva da floresta, o que já seria grave, mas pelas mortes de mais de uma centena de pessoas, o que é inaceitável. Em texto, som e imagem, muitos repórteres fizeram um trabalho notável quer do acontecer e evoluir dos focos de incêndio quer dos da destruição provocada e das situações-limite vividas em muitos lados. Salvo casos de manifesto exagero, esse trabalho foi e é fundamental. A questão, porém, é se o jornalismo se deve ficar por aí. Se não há, a partir daqui, um “rescaldo” a fazer e um dever de acompanhamento sistemático da situação no terreno, até para verificar se efectivamente as medidas curativas e preventivas, entretanto anunciadas, estão a (ou vão) de facto a ser postas em prática.

A tentação de um certo jornalismo de vistas curtas poderá ser virar os focos para outros lados, até porque a fase da reconstrução não fornece imagens impactantes. E, no entanto, como se recordava na semana passada, numa conferência promovida pela RTP sobre “jornalismo e serviço público na era digital”, falta ainda responder a uma pergunta: E agora? Que pode e deve ser feito para enfrentar a situação gerada pela tragédia? Que está de facto a ser feito e com que resultados? Onde estão os recursos, as energias ou os entraves?

As responsabilidades do jornalismo para com a comunidade não terminam com a cobertura. Quando toda a sociedade – desde os directamente afectados até quem tem responsabilidades políticas – está a recomeçar a vida e a aplicar medidas para prevenir que a catástrofe se repita e para cuidar dos mais abandonados do país, o jornalismo e os jornalistas não podem estar ausentes. O jornalismo em si não tem de ser positivo ou negativo. Mas pode e deve assumir um papel construtivo, feito de presença, atenção e escrutínio no tereno.

Comentários
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  • f.Almeida
    24 out, 2017 Porto 00:39
    Parabéns a Manuel Pinto e ao comentador"ORA AI' ESTA!"
  • MASQUEGRACINHA
    23 out, 2017 TERRADOMEIO 18:50
    Exatamente. Ai de nós se não fora o jornalismo, o bom e - por que não admiti-lo? - até muitas vezes o menos bom. Para investigar, revelar, explicar. E, como muito bem diz, para acompanhar a evolução das situações. Já agora, onde pára a Yupido? E os Papéis do Panamá? Depois de tanto ruído, o silêncio chega a ser ensurdecedor...
  • ora aí está!
    23 out, 2017 lis 18:07
    artigo interessante, esclarecedor e sugestivo para a atuação dos jornalistas que andam em alguns casos pelas ruas da amargura! O jornalismo sensação ou não construtivo deveria ser "penalizado"! Desconheço o que é ministrado nas escolas superiores de jornalismo mas uma coisa é certa, muitos dos docentes são jornalistas dos media, escritos e visuais, com vícios profissionais ganhos pelas imposições dos grupos financeiros que detêm esses media, e transmitem-nos aos discentes!