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João Ferreira do Amaral
Opinião de João Ferreira do Amaral
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​Estranha inflação

13 jan, 2023 • Opinião de João Ferreira do Amaral


A inflação actual tem um ritmo perfeitamente moderado, mas, ao mesmo tempo, efeitos negativos muito pronunciados.

Talvez o aspecto mais importante e infelizmente mais negativo do actual processo inflacionista seja a enorme desigualdade com que está a afectar os rendimentos, ao mesmo tempo que dá origem a transferências de riqueza, também elas de grande dimensão.

Tudo isto quando o crescimento dos preços, próximo mas inferior a 10 % em termos anuais, está longe de poder ser considerado um processo inflacionista grave.

Recordemos que os efeitos negativos duma inflação resultam principalmente das transferências de riqueza e das desigualdades do comportamento dos rendimentos reais (isto é, descontado o efeito dos preços) que provoca. Um crescimento de preços, mesmo muito superior ao actual, que não dê origem a estas transferências e desigualdades não constitui nenhum drama para o funcionamento regular da economia e da sociedade em geral.

Mas é justamente o contrário o que está a suceder com a inflação actual: tem um ritmo perfeitamente moderado, mas, ao mesmo tempo, efeitos negativos muito pronunciados.

Só para dar dois exemplos: o valor dos depósitos bancários dos particulares (que no último ano praticamente não remuneraram os depositantes) perderam cerca de 15000 milhões de euros do seu valor em 2022; os salários reais, que deveriam ter aumentado cerca de 5%, de forma a acompanharem o crescimento da produtividade, tiveram um decréscimo de aproximadamente 3%.

A responsabilidade desta absurda situação cabe inteiramente à política económica seguida, em Portugal como na zona euro. O afã de reduzir a dívida pública para além da redução que a própria inflação induz e o fetiche de obter mais rapidamente que o aconselhável um crescimento de preços de 2% em termos anuais está a provocar uma subversão nos rendimentos e na distribuição da riqueza.

Não nos enganemos: vamos pagar esta subversão e não será agradável de se ver.

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