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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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Três meses de Governo

01 jul, 2022 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


​Os três primeiros meses do atual executivo parecem confirmar a ideia de que o primeiro-ministro é alérgico a reformas, preferindo uma navegação à vista. Para a passividade do Governo contribuiu o lento processo de sucessão na liderança do PSD. O ministro Pedro Nuno Santos assinalou três meses de governação com um desafio a António Costa. Desse incidente saíram fragilizados o ministro, o primeiro-ministro e o Governo.

Completaram-se ontem três meses desde que o atual Governo tomou posse. Com uma confortável maioria absoluta no Parlamento, esperava-se que este executivo de António Costa começasse, finalmente, a enfrentar os problemas de fundo do país. Problemas que, nos governos da “geringonça” – dizia-se – o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português impediam o PS de abordar com alguma eficácia.

Ora, estes três meses iniciais do atual executivo parecem confirmar a ideia de que o primeiro-ministro é alérgico a reformas, preferindo uma navegação à vista, ou seja, a gestão corrente.

Quando se apontam os inúmeros problemas que se agravam na área da saúde, logo vem a desculpa de que se trata de problemas estruturais, como se um Governo digno desse nome (por maioria de razão, com uma maioria absoluta) não tivesse a responsabilidade de enfrentar essas questões de fundo.

Multiplicam-se os fechos de urgências, sobretudo de obstetrícia, enquanto apenas se vêm “pensos rápidos” para tentar ultrapassar tais falhas.

Não é só no campo da Saúde que o Governo se mostra atolado em dificuldades. A extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), decidida pelo anterior Governo de António Costa e adiada pelo presente Governo, ainda não tem concretização à vista. Entretanto, várias forças de segurança criticam-se e insultam-se umas às outras.

Também a descentralização de competências do Governo central para os municípios, iniciada há quatro anos pela Lei n.º 50/2018, ainda está por concretizar. A ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, espera ter um acordo sobre educação e saúde antes do fim do verão.

A falta de chuva colocou 66% do território continental em seca extrema e 34% em seca severa. Algo que se previa desde o início do corrente ano. Mas só agora o Governo fala numa futura campanha para poupar água e usá-la de maneira mais eficiente.

Há décadas que se discute a necessidade de complementar o aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa. Talvez para mostrar capacidade de decisão num Governo onde impera a passividade, o ministro Pedro Nuno Santos apresentou na quinta-feira um plano original – Montijo seria um aeroporto transitório e em Alcochete ficaria o aeroporto do futuro.

Mas António Costa desautorizou Pedro Nuno Santos. Para surpresa geral, nem Pedro Nuno Santos se demitiu nem foi demitido pelo primeiro-ministro. A política em Portugal, país de brandos costumes, desceu ainda mais fundo.

Note-se que, se o plano de Pedro Nuno Santos fosse adotado, o Montijo começaria a funcionar em 2026 (uma hipótese otimista). Até lá o aeroporto Humberto Delgado ficaria saturado, obrigando a recusar numerosos voos. Péssimo para um país que aposta no turismo.

Mas quem deixou arrastar ao longo dos últimos seis anos o problema do aeroporto de Lisboa? O primeiro-ministro António Costa e o ministro Pedro Nuno Santos.

Para a preocupante passividade do atual Governo contribuiu o delirante processo de sucessão na liderança do PSD, que tardou quatro meses.

Não é só o Governo que parece adormecido, é também o principal partido da oposição.

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