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Berlim quer mais talento estrangeiro. “Já não é obrigatório falar alemão para trabalhar como engenheiro tecnológico na Alemanha”

20 nov, 2023 • José Pedro Frazão


Anna Christmann a recém-nomeada por António Guterres para um grupo de aconselhamento em Inteligência Artificial nas Nações Unidas, defende maior equilíbrio entre regulação e experimentação na legislação europeia neste domínio.

A comissária alemã para as start-ups defende mais financiamento europeu para o sector, com a conjugação entre dinheiro público e privado, a par da redução da burocracia para a criação de empresas na Europa. Anna Christmann esteve, em Lisboa, na Web Summit, onde os alemães marcaram presença com mais de 120 empresas tecnológicas. Recém-nomeada por António Guterres para um grupo de aconselhamento em Inteligência Artificial nas Nações Unidas, esta deputada e militante dos Verdes defende maior equilíbrio entre regulação e experimentação na legislação europeia neste domínio.

A Alemanha fez-se representar com um espaço de dimensões na Web Summit. Significa que as start-ups são uma das vossas prioridades?

Claro que sim. Temos pela primeira vez uma estratégia para as start-ups e o Governo decidiu realmente tê-las como uma das suas prioridades. Por isso, queremos realmente apoiar todas estas oportunidades internacionais para as nossas start-ups conhecerem investidores e para se apresentarem aqui na Web Summit. Isso é uma prioridade para nós. Todos puderam ver que temos um ecossistema de start-ups muito forte, envolvidas nas diferentes tecnologias, mas também num ambiente muito sustentável, com arquitetura de madeira. Acho que é uma boa mensagem da Alemanha. Precisamos das start-ups, principalmente para resolver os grandes desafios que temos na sociedade. Um deles é, claro, a crise climática e estou muito feliz por ver muitas start-ups que estão a tentar desenvolver tecnologias que usamos exatamente para resolver esse tipo de desafios.

Como posiciona a Alemanha neste ecossistema ? Vai querer ter plataformas (“hubs”) de start-ups no vosso território?

Os "hubs" alemães são também europeus. Penso que é importante que vejamos isto como um ecossistema à escala europeia. Estamos num planeta global e é importante que as pessoas vejam que a Europa é um bom lugar para criar uma empresa, que também é possível crescer aqui e conseguir financiamento. Na Alemanha, estamos a trabalhar para termos fundos melhores para start-ups. Mas também estamos numa estreita colaboração com outros países europeus como, por exemplo, pela iniciativa “European Tech Champion”, como um fundo de fundos. As iniciativas nacionais são importantes, tal como também o trabalho conjunto na Europa.

A Europa está a ficar para trás nesta corrida de start-ups em comparação com os Estados Unidos?

Hoje é mais difícil conseguir financiamento na Europa. Isso é algo em que todos temos de trabalhar. Mas em tempos de crise, também não é tão fácil para as start-ups conseguirem investimento externo. Portanto, é realmente importante juntar agora as nossas forças e mostrar que a Europa é um lugar atraente para fazer investimento e que temos um ecossistema de start-ups muito vivo e forte. Foi o que vimos aqui na Web Summit com tantas start-ups. Trouxemos 120 da Alemanha, todas muito inovadoras. Puderam ver que temos aqui empresas em que vale a pena investir.

Como é que a Alemanha junta forças entre start-ups e as grandes empresas alemãs que todos conhecemos?

Tentamos construir redes entre as start-ups e as grandes empresas e penso que isso está a correr cada vez melhor. Acabámos de ter um exemplo muito proeminente, com uma start-up de Inteligência Artificial na Alemanha chamada “Aleph Alpha” e, agora, eles têm investimentos da Bosch, da SAP, das grandes empresas. Acho que esse é realmente um modelo que deveria funcionar com mais frequência na Europa, onde vemos também investimentos dos maiores agentes. Isso é importante para nos tornarmos ainda mais atraentes na Europa para as start-ups.

Quais são os principais eixos da estratégia alemã para as start-ups?

Baseia-se em financiamento, talento, digitalização e acesso a dados. Acabámos de criar um fundo chamado “Deep Tech and Climate” com mil milhões de euros para investir diretamente em empresas em conjunto com capital privado. É importante combinar o financiamento público com o capital privado. É muito importante ter o dinheiro, mas também as pessoas. A Web Summit ajuda a mostrar às pessoas que é bom trabalhar nas start-ups europeias.

A vossa estratégia implica a atração de engenheiros estrangeiros para trabalhar na Alemanha?

Sim, acabámos de tornar mais fácil a vinda para a Alemanha de talentos na área da tecnologia de informação (IT). Antes era preciso falar alemão para trabalhar na Alemanha, mas mudámos isso e já não é obrigatório. Se falar inglês e for especialista em IT, pode vir trabalhar para a Alemanha, seja para uma start-up ou para outra empresa. Na verdade, esse é um ponto fundamental para conseguir atrair talento neste momento.

É preciso mudar alguma coisa no enquadramento europeu para as start-ups ou considera que a Europa está no bom caminho?

Começámos muito bem em diferentes áreas e agora também temos a “European Startup Nations Alliance”, que representa um ponto importante. Talvez devêssemos ter também uma estratégia europeia para start-ups proveniente dessa iniciativa. É algo que gostaríamos de apoiar. Podemos melhorar em todas essas áreas, como o financiamento de talentos, mas também na burocracia. Penso que as coisas têm de ser facilitadas. Por vezes, na Europa ainda é necessária demasiada papelada para abrir uma empresa.

Qual é principal preocupação da Alemanha em matéria de inteligência artificial ? Mais regulamentação, intervenção das leis europeias?

Estamos a acompanhar de perto a Lei da União Europeia sobre Inteligência Artificial (AI ACT), que consideramos importante. Existem alguns campos onde existem riscos mais elevados que precisam de ser regulamentados, como a monitorização social ( “social scoring”) ou tecnologias de vigilância. Mas, por outro lado, precisamos de oportunidades para o desenvolvimento das start-ups e para a experimentação tecnológica. Temos de tentar um equilíbrio entre regulamentação e ambientes onde se pode experimentar. Estamos agora a trabalhar para que a Lei chegue a esse equilíbrio.

É muito cedo para dizer que se vai na direção certa?

Em geral, a direção está correta. Temos condições de concorrência equitativas para a Inteligência Artificial na Europa, mas estamos num momento realmente decisivo para mantermos as oportunidades abertas também para desenvolver tecnologia, com o enquadramento certo, especialmente porque precisamos de modelos de fundação que venham e sejam desenvolvidos na Europa. Isso é muito importante, porque, caso contrário, regularíamos sistemas que são desenvolvidos noutros lugares e isso não é uma boa ideia.

Há um ponto de vista americano que contrasta com a carga de regulamentação na Europa.

Por isso, mencionei a start-up “Aleph Alpha” que temos na Alemanha e que está a construir grandes modelos de linguagem. Para nós é muito importante que este tipo de start-ups tenha boas oportunidades de fazer isso na Europa. Mas ainda assim, eles também mostram que podem fazer isto de forma muito transparente, por exemplo. Há a grande oportunidade de mostrar como na Europa se pode usar esta tecnologia de forma muito transparente e responsável.

Referiu a abertura para receber engenheiros que não falam alemão, mas inglês. Isso significa que não estão a investir tanto na língua alemã nesse tipo de suportes?

Temos grandes talentos na Alemanha, claro, mas ainda não temos gente suficiente. Queremos atrair pessoas de todos os lugares. Apoiamos fortemente os talentos na Alemanha, mas também queremos atrair pessoas do estrangeiro e achamos que é bom ter esta mistura de pessoas que realmente querem fazer parte de um grande ecossistema de start-ups na Europa.

Estamos num ciclo político muito difícil e de muita incerteza. A Europa precisa de alguma mudança na estrutura de financiamento?

O que é decisivo é definir como se faz esse financiamento. Por isso, referi a necessidade de atrair capital privado usando dinheiro público. Temos observado isto, por exemplo, na área espacial onde vemos agora mais start-ups, financiadas por capital privado, num sector onde tudo costumava ser financiado pelo dinheiro público. Este tipo de mudanças é importante para a Europa porque, comparando com outros lugares do mundo, a diferença no financiamento do lado privado é ainda maior do que no lado público. Esse é o caminho a seguir.

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