21 out, 2024 • João Cotter Salvado
O fracasso no processo de empreendedorismo é um tema que suscita sempre inúmeras discussões. Embora ninguém goste de falhar, há um consenso de que é difícil aprender e evoluir sem passar por falhas, especialmente quando se trata de desenvolver soluções inovadoras.
A
evidência
mostra que seguir um processo científico no empreendedorismo – formulando
hipóteses a partir de teorias e testando-as rigorosamente em amostras
cuidadosamente escolhidas de potenciais clientes – aumenta, de facto, a
probabilidade de falhar. No entanto, este reconhecimento da fraca qualidade de
uma ideia inicial através de um teste, ou conjunto de testes, previne o
compromisso excessivo com propostas pouco promissoras e, em última análise,
permite o desenvolvimento de ideias que terão mais sucesso no futuro.
Falhar após testar de forma rigorosa desempenha um papel crucial no desenvolvimento económico, promovendo a renovação e a adaptação do ecossistema. No fundo, estes falhanços acabam por ser fundamentais na libertação de energia, conhecimentos e recursos para outras alternativas em vez de ficarem inutilmente alocados a más ideias e maus negócios.
Agora, apesar do seu potencial efeito positivo a nível agregado, o impacto do fracasso no empreendedor é, porém, multifacetado. Por um lado, a experiência de testar e não resultar pode fornecer lições valiosas, levando a novas ideias em associação com um entendimento mais próximo e profundo do mercado.
O fracasso acaba por ser uma oportunidade para os empreendedores utilizarem o feedback da sua experiência para aprenderem e gerirem de forma mais efetiva os seus futuros empreendimentos. Por outro lado, como discute este artigo, as consequências financeiras, emocionais, sociais e profissionais podem ser grandes e, normalmente, são mesmo inevitáveis. Enquanto alguns empreendedores conseguem recuperar mais rapidamente, outros enfrentam impactos mais severos e prolongados no tempo (tais como dívidas). Além das finanças, o maior peso costuma ser emocional, com muitos a relatar níveis elevados de stress e ansiedade, que afetam tanto a saúde física como as relações pessoais e familiares.
Há, no entanto, alguma literatura a explorar que a aprendizagem e potencial sofrimento com o falhanço pode depender muito das características do empreendedor. Neste artigo defende-se que traços de personalidade como, por exemplo, o narcisismo, podem desempenhar um papel crucial nesse processo. Empreendedores narcisistas, que tem uma visão exagerada da sua própria importância, tendem a relançar os seus projetos após o fracasso na tentativa de preservar uma visão inflada de si mesmos. No entanto, essa característica pode atuar como uma barreira à aprendizagem, já que esses empreendedores são mais propensos a culpar fatores externos pelo fracasso, em vez de rever o seu próprio comportamento. Isso limita as melhorias que poderiam ser feitas e compromete o desempenho futuro.
Noutro artigo, conclui-se que o nível de otimismo dos empreendedores afeta significativamente a forma como ajustam as suas expectativas após receberem feedback negativo. Empreendedores com elevado otimismo tendem a rever menos as suas crenças sobre o desempenho, o que pode diminuir a eficácia da inovação. Além disso, o excesso de otimismo pode gerar uma discrepância entre as ideias inovadoras e os resultados práticos, impactando negativamente o sucesso. O artigo sugere que o equilíbrio entre otimismo e realismo é essencial para maximizar a eficácia da inovação e o desempenho dos empreendimentos.
Em conclusão, o fracasso no empreendedorismo, apesar de ser doloroso e muitas vezes debilitante para os indivíduos envolvidos, desempenha um papel fundamental no processo de inovação e adaptação económica. Este permite a reciclagem de recursos e ideias, promovendo a eficiência do processo de inovação. Contudo, a maneira como os empreendedores lidam com o fracasso varia consideravelmente, sendo influenciada, por exemplo, por traços de personalidade como narcisismo e níveis de otimismo. Reconhecer esses fatores é essencial para uma melhor compreensão de como falhar pode, ou não, levar a uma aprendizagem significativa e à melhoria contínua. Assim, embora o fracasso seja inevitável no caminho da inovação, aprender com ele requer equilíbrio e autoconhecimento, fundamentais para que o fracasso se transforme em trampolim para o sucesso.
João Cotter Salvado, Professor Auxiliar e Diretor Académico do CATÓLICA-LISBON Entrepreneurship Center.
Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica-Lisbon School of Business and Economics.