07 mai, 2021
Soube-se esta semana que está dois anos atrasado o programa para entregar casas a famílias carenciadas. É uma notícia quase banal, por ser semelhante a tantas outras. Anunciam-se importantes iniciativas governamentais nos mais variados setores, mas a maior parte delas cai no esquecimento – dos governantes e da opinião pública.
O caso da habitação é preocupante, porque há muito se sabe haver em Portugal um crescente défice de casas acessíveis a quem não é rico. O regime de aluguer não funciona e não é fácil aceder a um crédito bancário à habitação. Por isso multiplicam-se as moradias de luxo, ou perto disso, e escasseiam casas para a classe média e ainda mais para quem é pobre, uma classe que a pandemia alargou dramaticamente.
Como sempre, o Governo acena com uma solução futura. Desta vez é o dinheiro da bazuca da UE, que em boa parte – diz-se - será dedicado à habitação. Aqui são maiores as probabilidades de o projetado ser mesmo executado, uma vez que Bruxelas irá vigiar o modo como o dinheiro será gasto.
Mas impressiona a incapacidade do Governo para prever, antecipar e agir antes de bater com a cabeça na parede. É sabido que os portugueses são ótimos a improvisar, mas péssimos a organizar e planear. Poderíamos, porém, ter aprendido alguma coisa com a experiência; por exemplo, ter consciência dos prejuízos para o país de só acordarmos para os problemas quando a comunicação social fala deles.
Veja-se o caso de Odemira, que já aqui comentei. Agora toda a gente faz declarações sobre uma situação que era pública e geralmente conhecida há muitos anos. Seria anedótico, se não fosse dramático. Até a solução para alojar imigrantes não infetados – numa unidade turística privada – mostrou incompetência e insensibilidade social. De madrugada, sob a proteção das forças de segurança, foram arrombados os portões daquela unidade turística, depois de, horas antes, ter havido negociações das autoridades com representantes da empresa em causa...
O que se passou com o proclamado entusiamo dos PS e dos seus governos pelo caminho de ferro é um outro exemplo. Até ao ministro das Infraestruturas Pedro Nuno Santos ter pegado no assunto, as reclamações dos utentes dos comboios recebiam respostas governamentais que seguiam sempre o mesmo esquema: conhecemos o problema, mas ele ficará resolvido dentro de x semanas ou meses. Depois nada ou quase nada acontecia.
A distribuição de computadores para alunos carenciados poderem seguir aulas à distância também é instrutiva. Quando reabriram as aulas, faltavam computadores, contrariando inúmeras promessas anteriores. E continuam a faltar.
Outro caso é o fecho da central a carvão em Sines e o encerramento da refinaria da Galp em Matosinhos. Nem uma coisa nem a outra foram surpresas. No entanto, antes de se consumarem esses encerramentos (indispensáveis para uma transição ecológica em que o Governo e a UE apostam e bem), não se esboçaram quaisquer perspetivas sérias para reencaminhar os trabalhadores que perdiam o seu emprego.
O próprio caso da TAP, decerto muito complicado, poderia e deveria ter sido antecipado. A empresa só raramente apresentava lucros; com a crise aeronáutica provocada pela pandemia, a situação tornou-se insustentável. Assim, tudo indica que a TAP será nos próximos anos um brutal sorvedouro de dinheiro dos contribuintes, uma espécie de Novo Banco 2.
Naturalmente que a pandemia, que ninguém sabe ao certo quando e como acabará, é outro fator de incerteza e imprevisibilidade. Mais uma razão para não se acrescentarem adicionais motivos de incerteza, com reflexos negativos nas decisões empresariais de investimento.
Acresce que, com um Governo, como o atual, que não tem maioria na Assembleia da República, a incapacidade de prever e agir em conformidade se agrava ainda mais. É a navegação à vista na sua expressão máxima. E navegar assim comporta o risco de um embate do barco contra um qualquer rochedo junto à costa.