Emissão Renascença | Ouvir Online
Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
A+ / A-

Uma guerra perdida?

22 mar, 2021 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


O crescente fosso entre o litoral e o interior poderá ser revertido? Tudo indica que não, infelizmente. Nem com o teletrabalho.

O Ministério das Finanças informou que não houve qualquer benefício fiscal à EDP no negócio da venda de seis barragens, sob a forma de não pagamento de um imposto (imposto de selo). O caso suscitou várias dúvidas e até António Costa considerou o negócio “criativo”.

Num outro comunicado posterior o mesmo ministério desmentiu o “Correio da Manhã”, segundo o qual o ministério público estaria a investigar o caso, por suspeitas de delitos de corrupção, tráfico de influências e fraude fiscal qualificada. Mas o jornal afirma que a investigação começou há seis meses.

A questão é importante e os ministros das Finanças e do Ambiente irão ao Parlamento na terça-feira dar explicações sobre tudo isto. Veremos.

Abordo este assunto porque, uma vez mais e independentemente de existir ali, ou não, algum ilícito, uma série de municípios onde se situam as barragens ficou privada de receber alguns milhões. Assim se acentua o fosso entre o nível de vida entre o litoral e grande parte do interior.

Por outro lado, foi manifesta a insatisfação da maioria dos autarcas com o Plano de Recuperação e Resiliência do Governo. Esperavam ver nesse documento verbas significativas para obras há muito aguardadas e afinal...

Trata-se de investimentos de média e pequena dimensão que ficam de novo adiados. Incluindo investimentos rodoviários – não em autoestradas, que já temos demais, mas em estradas secundárias, que fariam toda a diferença para as populações locais. E, claro, também falta investimento ferroviário, em particular nas ligações a Espanha (que rejeita relançar o “Sud Express”).

Quando se trata de propaganda, os políticos proclamam que vão combater a distância crescente entre o nível de vida no interior e nos principais centros populacionais, a grande Lisboa e o grande Porto, mas depois não tomam as medidas necessárias para vencer esse combate. Talvez por terem percebido que o fosso já é tão grande e crescente que nem com duas ou três “bazucas” seria possível reverter o processo.

Já mais de metade da população mundial vive em cidades. É uma tendência irreversível. Em Espanha as pequenas cidades perdem residentes para as cidades de maior dimensão.

O teletrabalho, que a pandemia intensificou, é suscetível de levar mais pessoas a deslocarem-se dos grandes centros urbanos para zona do interior. É que o sobre-povoamento das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto causa cada vez maiores incómodos aos residentes nessas áreas – pense-se nos crescentes engarrafamentos nas ruas e estradas dessas áreas.

Mas, além de ser preciso completar a rede de acesso à internet, chegará o teletrabalho para fazer deslocar muita gente do litoral para o interior? Talvez não chegue. As pessoas precisam de acesso fácil e rápido a serviços públicos e a comércio privado.

Daí que o Governo tenha que impedir o fecho de escolas, postos de correios, tribunais, etc. nas pequenas povoações. É a única maneira de travar o ciclo vicioso – as escolas fecham porque não têm alunos em número suficiente e os jovens abandonam as pequenas povoações porque não têm ali escolas. E por aí fora.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.