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João Ferreira do Amaral
Opinião de João Ferreira do Amaral
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​A Comissão, ou o lobo com pele de cordeiro

03 dez, 2020 • Opinião de João Ferreira do Amaral


Dificilmente se encontrará uma iniciativa que viole tão ostensivamente os tratados como esta proposta da Comissão, embora muitas outras os tenham contrariado, pelo menos no seu espírito.

Tal como tinha anunciado, a Comissão Europeia apresentou uma proposta de directiva sobre os salários mínimos no espaço europeu, a qual seguirá os seus trâmites normais no Conselho Europeu e no Parlamento Europeu.

Dificilmente se encontrará uma iniciativa que viole tão ostensivamente os tratados como esta proposta da Comissão, embora muitas outras os tenham contrariado, pelo menos no seu espírito.

Diz com efeito o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, no seu artigo 153º nº 5, que a acção da União na política social não á aplicável às remunerações. Isto mesmo, preto no branco.

A Comissão argumenta que, como não está a propor níveis determinados para o salário mínimo, não está abrangida por aquela excepção. Isto é tentar fazer de nós parvos.

O Tratado não diz que não é aplicável à fixação de níveis de remunerações, diz que não á aplicável às remunerações, e portanto a todos os condicionalismos que as determinem, seja pela fixação de salário mínimo seja por outra forma qualquer de intervenção nas remunerações. A Comissão lamenta-se quando há violações verdadeiras ou supostas do Estado de Direito. Mas desde que estejam ao serviço do reforço do centralismo europeu, todas as violações de tratados são admissíveis. Tanto mais que a proposta está longe de ser inócua.

Apresentada demagogicamente como uma preocupação social, a verdade é que pelo menos uma das disposições nos deve deixar inquietos sobre as reais intenções da proposta. É o artigo 6º, que admite que possa haver num dado país diferentes salários mínimos para diferentes grupos de trabalhadores (sem especificar que grupos) e bem assim deduções ao salário que levem ao salário pago ser menor que o salário mínimo. Temos aqui a porta aberta, agora com respaldo “legal” para, como foi o caso nos programas da Troika, serem os salários quem arca com o peso dos ajustamentos macroeconómicos. Por mais que Comissão vista a pele de cordeiro, o lobo da Troika continua vivo e bem vivo. E ou me engano muito ou teremos oportunidade de o constatar quando a pandemia estiver dominada.

Comentários
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  • António Lopes
    27 dez, 2020 Lx 12:47
    Resta saber se o que Amaral diz é verdade . O mais provável é que os salários mínimos se equiparem em em todos os países e as pessoas vivam melhor.
  • Digo eu
    04 dez, 2020 cá 14:47
    Mas por cá, Povo e Sindicatos dormem na forma e ninguém protesta contra essa medida. Pelo menos até ela lhes morder o trazeiro ...