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Pedro Leal
Opinião de Pedro Leal
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​O que não vai acontecer em 2024

01 jan, 2024 • Pedro Leal • Opinião de Pedro Leal


Por vezes o tempo teima em andar contra o relógio. 2024 arrisca-se a ser um desses tempos. Mesmo os otimistas irritantes concordarão que o próximo ano tem uma herança pesada, complexa e perigosa.

O ano de 2024 dificilmente encontrará a estabilidade política. Portugal vai para eleições a 10 de março e as sondagens não conseguem encontrar uma maioria de um só partido: PS ou PSD. Se este cenário se confirmar, restam as geringonças, à esquerda e à direita. Mas mesmo assim, as maiorias podem ser difíceis de estabelecer.

A par da ausência de maiorias ideologicamente coerentes, surge ainda o perigo das cedências: o risco dos extremos contaminarem as políticas do grande centro maioritário PS e PSD, dependendo quem consiga, se conseguir, formar maioria. À esquerda, tivemos nas últimas legislaturas toda uma agenda fraturante e, apesar de juras de que não acontecerá, se a maioria se formar pelo lado do PSD, a hipótese de uma coligação com o Chega estará matematicamente presente.

Num e noutro caso, o perigo são as cedências e o populismo. O perigo reside em os partidos do centro assimilarem bandeiras dos extremos para tentarem obter vantagem política. É o que está a acontecer um pouco pela Europa, através do crescimento da extrema-direita. Os partidos de poder, por exemplo em França e na Alemanha, estão a assimilar políticas que antes negavam.

E neste avanço da extrema-direita pela Europa fora, surgem as eleições europeias. Parece certo que em junho o Parlamento Europeu vai ficar mais dividido, menos europeu, mais nacionalista e menos tolerante, seguindo as pisadas de Victor Orbán, na Hungria, que prossegue uma via autoritária e se recusa a defender a Ucrânia contra a Rússia.

E este é um dos pontos que também não se resolverá em 2024 - a guerra na Ucrânia. A paz formal pode até ser estabelecida, mas a pacificação não acontecerá. Se olharmos para os Balcãs, ainda hoje se fazem sentir as ondas de choque da guerra da desintegração jugoslava, dos anos 90 do século passado, e os efeitos de uma paz não plenamente aceite por todos.

A guerra na Ucrânia pode ainda ter um desenvolvimento inesperado, dependendo do que acontecer nas eleições presidenciais nos EUA em 2024. Se Donald Trump vencer, e se o isolacionismo norte-americano regressar, em 2025, provavelmente, a União Europeia, a NATO e a Ucrânia vão enfrentar um problema geoestratégico sério – o virar de costas ao conflito por parte de Washington.

Um problema que se estenderá ao Médio Oriente. Em caso de vitória de Donald Trump, o efeito de algum travão de Biden sobre o governo israelita desaparecerá e o Médio Oriente, com os seus múltiplos grupos terroristas, Hamas, Fatah, Jihad Islâmica e Hezbollah, entre outros, vai continuar a sacrificar vítimas inocentes.

Por via das eleições em Taiwan, já no início do ano, a tensão entre a China e os Estados Unidos não vai atenuar e alimentará as velhas tentações de conquista por parte de Pequim, fazendo aumentar o risco e o crescimento da tensão entre a China e os EUA.

Um outro problema que não se resolverá em 2024 é a crise migratória na Europa e nos Estados Unidos. Sem solução na origem, os problemas persistem e vão agravar-se pela via das políticas mais restritivas em adoção na Europa (França e Reino Unido, além da Alemanha, Hungria e Polónia). Também nos Estados Unidos deveremos ouvir de novo, no contexto da campanha eleitoral para as presidenciais, o regresso da defesa do muro na fronteira com o México.

Regressando à Europa, uma outra questão que também não se atenuará em 2024 é o cerco à comunicação social em países como a Polónia e Hungria, onde legislação de controlo dos media continua a ser adotada. Pela via jurídica ou pela via económica, como está Portugal agora confrontado, o jornalismo vive um momento de dificuldade, enfraquecendo a democracia.

O cenário pode prolongar-se para outras latitudes e áreas, e ser até demasiado pessimista, mas o ponto central é como conviver com este tempo que parece cada vez mais complexo e, por vezes, mais sombrio?

A resposta a este momento grave e exigente reside no cidadão, na sua responsabilidade individual e na capacidade de exercer ação política consciente, esclarecida e exigente. Quanto mais grave é o contexto, em democracia, mais determinante deverá ser o escrutínio e a exigência do cidadão face ao poder político, mesmo que, por vezes, essa ação individual pareça irrelevante. E no caso de Portugal esse escrutínio será determinante já nas eleições de 10 de março.

Comentários
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  • Jose Carlos Fonseca
    02 jan, 2024 Maia 10:30
    Para começar temos que tratar da corrupção e cunhas.