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Óscares

O foco de luz que rasgou o cenário numa noite a preto e branco

29 fev, 2016 - 07:38 • Catarina Santos

Pode-se dizer que as estatuetas foram distribuídas pelas aldeias. "O Caso Spotlight" não era o favorito, mas foi mesmo o vencedor do Óscar de melhor filme. Iñarritu voltou a levar a estatueta de realização e, para Leonardo DiCaprio, à sexta foi de vez.

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Surpresas, consagrações e um déjà vu. Coube de tudo na noite de DiCaprio
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Não era o favorito, mas o Óscar de melhor filme foi parar às mãos de "O Caso Spotlight", um filme que narra a forma como um grupo de jornalistas do Boston Globe desvendou um extenso escândalo de abuso de menores por membros da Igreja, nos Estados Unidos. No palco do Dolby Theatre, os produtores sublinharam que o filme "deu voz aos sobreviventes", apelando ao Papa Francisco para que proteja as crianças e "restaure a fé". E acrescentaram que o filme demonstra bem a importânia do jornalismo de investigação.

"O Renascido", que partia como grande favorito, com 12 nomeações, deu a Alejandro Gonzalez Iñarritu o segundo Óscar consecutivo de melhor realizador, depois de no ano passado ter vencido com "Birdman".

O filme conta uma história extrema de luta do homem contra a natureza, num cenário inóspito no século XIX, e deu finalmente o Óscar de melhor actor a Leonardo Dicaprio, depois de cinco nomeações falhadas (quatro como actor e uma como produtor. Era o grande tema que enchia páginas de especulações.

"Spotlight" vence um Óscar que amplifica a voz das vítimas e honra o jornalismo
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Nas restantes categorias de representação também não houve surpresas. Brie Larson venceu como melhor actriz, pela sua interpretação em "Quarto", Alicia Vikander venceu como actriz secundária por "A Rapariga Dinamarquesa" e "Ponte dos Espiões" deu a Mark Rylance o Óscar de melhor actor secundário.

Em termos numéricos, "Mad Max: Estrada da Fúria" é o que leva mais prémios: seis estatuetas em dez possíveis. Dominou a primeira metade da cerimónia, seguindo por ali fora a ceifar categorias técnicas sem piedade. Guarda-roupa, cenografia, caracterização, montagem, edição e mistura de som. Só perdeu os efeitos visuais para "Ex Machina" e fotografia para "O Renascido".

As categorias de animação fizeram isso mesmo: animaram a sala, arrancando gargalhadas à plateia. Os pequenos e amarelos Mínimos apresentaram o Óscar para a melhor curta da categoria, que calhou ao chileno "Bear Story". Dois pesos pesados da Pixar - a dupla Woody e Buzz, de "Toy Story" - entregaram o Óscar de melhor animação ao patrão - o (mais que esperado) vencedor foi "Divertida-Mente"... da Disney/Pixar.

Bem-vindos à escolha dos brancos

Não havia volta a dar: a questão racial marcou o "antes" e tinha que marcar o "durante". Do cabeçalho ao rodapé, Chris Rock não perdeu uma oportunidade de tocar na ferida. Entrou logo a pés juntos, no monólogo inicial. "Bem-vindos aos white peoples choice awards" (qualquer coisa como os "prémios do público branco"), atirou à segunda frase, acrescentando que se o anfitrião também fosse escolhido por nomeação, provavelmente não estaria ali.

Chris Rock espancou o elefante na sala
Chris Rock espancou o elefante na sala

Ridicularizou os apelos ao boicote à cerimónia e foi brincando com o assunto por ali fora, defendeu que se querem igualdade deveriam criar categorias só para negros, como existem para as actrizes mulheres... Muitas piadas e alfinetadas disparadas em todas as direcções, para sublinhar que o que verdadeiramente importa é que seja real a igualdade de oportunidades.

Algo que também a presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas defendeu, sublinhando que cabe a todos os membros da academia lutar por uma maior diversidade.

Ambiente, crise financeira... e mais igualdade

Também o vencedor na categoria de realização, Alejandro Gonzalez Iñarritu, aproveitou o palco para tocar na questão da desigualdade. "Tenho muita sorte de estar aqui, outros não a tiveram", afirmou, citando um diálogo do filme "O Renascido" em que a personagem de DiCaprio diz ao filho que os outros não o ouvem porque "só vêem a cor da tua pele". Iñarritu defende que esta deve ser "a geração que fará com que a cor da pele seja tão relevante como o comprimento do cabelo".

Mas nem só desta tónica se compôs o lado mais político dos discursos. Adam McKay, realizador e co-argumentista de "A Queda de Wall Street" - que venceu na categoria de argumento adaptado - foi afiado na crítica, sustentando que quem não quer ver repetir-se a crise financeira não deve votar em candidatos financiados por grandes empresas e grandes petrolíferas.

A sustentabilidade do planeta foi colocada debaixo dos holofotes por Leonardo DiCaprio. Sublinhando que "O Renascido" se debruça sobre a relação do homem com o mundo, o actor disse que "as alterações climáticas são reais", num discurso contra a "ganância", a apelar a que "não tomemos este planeta como garantido".

E à sexta nomeação, DiCaprio levou o Óscar... e deu um sermão sobre o ambiente
E à sexta nomeação, DiCaprio levou o Óscar... e deu um sermão sobre o ambiente

O tema foi também referido por Jenny Beavan, vencedora do Óscar na categoria de guarda-roupa com "Mad Max", sustentando que o cenário pós-apocalíptico do filme não está assim tão longe de se tornar uma realidade no futuro se não tratarmos melhor o ambiente.

Foram quase cinco horas de uma cerimónia a bom ritmo, cujas únicas pausas foram concedidas para os momentos musicais. O mais relevante foi protagonizado por Lady Gaga vestida de branco, sentada a um piano branco, a arrepiar o Dolby Theatre com a interpretação do tema "Til It Happens To You", do filme "The Hunting Ground". Não levou o Óscar de melhor canção, mas arrancou um aplauso de pé à plateia.

Lady Gaga tinha sido apresentada pelo vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que aproveitou o tema do documentário "The Hunting Ground" (os abusos sexuais em universidades) para apelar à mudança de uma cultura que permite que o assédio e o abuso sexual siga impune.

Dave Grohl protagonizou o momento mais tocante, interpretando "Blackbird", dos Beatles , durante o clássico "in memoriam", em que se recorda as personalidades do cinema que morreram no último ano. E foram muitos em 2015, de Omar Sharif a Christopher Lee, não esquecendo David Bowie.

Por este ano, está feito. Mesmo, mesmo de saída, nas últimas palavras com microfone aberto, Chris Rock ainda gritou um "Black Lives Matter [literalmente, "a vida dos negros importa", um movimento que luta contra a brutalidade policial nos Estados Unidos]... boa noite!"


LISTA INTEGRAL DE VENCEDORES

Filme - "O Caso Spotlight"

Realização - Alejandro Gonzalez Iñarritú, "O Renascido"

Actor - Leonardo DiCaprio, "O Renascido"

Actriz - Brie Larson, Quarto

Actor secundário - Mark Rylance, "Ponte dos Espiões"

Actriz secundária - Alicia Vikander, "A Rapariga Dinamarquesa"

Argumento original - "O Caso Spotlight"

Argumento adaptado - "A Queda de Wall Street"

Guarda-roupa - "Mad Max - Estrada da Fúria"

Cenografia - "Mad Max - Estrada da Fúria"

Caracterização - "Mad Max - Estrada da Fúria"

Fotografia - "O Renascido"

Montagem - "Mad Max - Estrada da Fúria"

Edição de som - "Mad Max - Estrada da Fúria"

Mistura de som - "Mad Max - Estrada da Fúria"

Efeitos Visuais - "Ex Machina"

Curta-metragem de animação - "Bear Story" (Chile)

Longa-metragem de animação - "Divertida Mente" (Disney/Pixar)

Documentário - curta-metragem - "A Girl in the River - The Price of Forgiveness"

Documentário - loga-metragem - "Amy"

Curta-metragem de ficção - "Stutterer"

Filme em língua estrangeira - "O Filho Saul" (Hungria)

Banda-sonora - Ennio Morricone - "Os Oito Odiados"

Canção original - "Writings on the Wall", de Sam Smith - "James Bond - Spectre"

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