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​Cimeira do Clima. “Já foram dados passos de gigante em Paris”

11 dez, 2015 - 17:02 • Cristina Nascimento

Em contagem decrescente para o fim da Cimeira do Clima, a Renascença falou com a professora universitária Júlia Seixas. Para esta especialista, mais importante do que um acordo com metas vinculativas é o comprometimento de todas as nações na luta contra as alterações climáticas.

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Até sábado vão continuar as negociações na Cimeira do Clima, em Paris. É o tudo por tudo para chegar a um acordo que norteie o mundo no combate às alterações climáticas para os próximos anos.

Não é certo que o acordo vá incluir metas vinculativas, como foram estabelecidas no Protocolo de Quioto, mas Júlia Seixas, especialista da Universidade Nova de Lisboa em cenários energéticos, acredita que “um acordo já é irreversível”.

"Já foram dados passos de gigante em Paris”, sobretudo tendo em conta a diversidade tão grande de países presentes na capital francesa.

Como é que tem acompanhado esta cimeira em Paris?

De uma forma muito expectante e cautelosa. Costumo ser uma pessoa estruturalmente optimista, mas o que está em cima da mesa são temas bastante complexos e que obrigam a um vasto conjunto de países muito distintos, com objectivos de desenvolvimento muito diferentes, a convergirem todos em objectivos comuns. De qualquer forma, há um discurso global que é comum neste momento e que atravessa todos os países, desde os muito desenvolvidos aos muito pouco desenvolvidos, que é esta necessidade premente e muito urgente de limitarmos a emissão de gases com efeito de estufa.

As dificuldades em chegar a um acordo e as dúvidas sobre se esse acordo terá um carácter vinculativo não enfraquecem a posição que sair de Paris?

Eu posso entender o carácter vinculativo de maneira distinta. Se me vincular a uma necessidade de reduzir as emissões do meu país no sentido de atingir, em 2030 ou 2050, valores mais baixos que conduzam a um aumento da temperatura global de um grau e meio ou dois graus, isto já é um carácter vinculativo.

Não está na natureza de alguns países, nomeadamente os Estados Unidos e a China, vincularem-se de forma muito concreta a determinados objectivos. São países que têm posturas voluntaristas e de liderança relativamente a muitas iniciativas que vão no sentido de redução de gases com efeito de estufa, mas a história tem-nos mostrado que, independentemente do tipo de administração, politicamente é difícil para um país como os Estados Unidos suportar valores muito concretos, com carácter muito vinculativo para o futuro.

Mais importante do que estas metas vinculativas (e de ficarmos presos a algum desânimo de não chegarmos a estas metas), é muito importante garantirmos mecanismos que, de cinco em cinco anos ou de três em três anos, revejam o caminho global em termos do total das emissões de gases com efeito de estufa de todos os países, qual é o passo do decréscimo e ir tomando medidas de acordo com essa monitorização.

É melhor um acordo mais abrangente do que lutar por metas vinculativas?

É mais realista. Torno a sublinhar que estamos a juntar países muitíssimo distintos, com práticas históricas e políticas muito diferentes, com realidades sociais totalmente distintas. É até um bocadinho ingénuo pensar-se que vamos conseguir todos, com esta diversidade tão grande, acordar nestes pontos, nestes números vinculativos.

Além do mais, o futuro tem sempre uma grande incerteza. Nunca sabemos como é que as coisas vão evoluir de forma muito exacta e vemos, por exemplo, o que tem acontecido nos últimos quatro, cinco anos sobre o custo da tecnologia fotovoltaica, que caiu a pique. Até podemos ter surpresas bastante agradáveis.

O facto de não termos uma meta vinculativa não significa que as economias e os objectivos estabelecidos em quadros de política não conduzam a esses valores no futuro, embora não os tenhamos aqui em termos de números concretos.

Já foram dados passos importantes em Paris?

Do que me tenho apercebido, acho que já foram dados passos de gigante muito grandes. Só o facto de, por exemplo, um dos pontos que está em discussão ser a diferença entre aceitar-se como objectivo de estabilização da temperatura nos dois graus ou em 1,5 graus. Quem começou por defender este 1,5 graus foram, sobretudo, os países mais afectados, aqueles que já estão a sofrer o impacto das alterações climáticas. Mas, por exemplo, os Estados Unidos estão a defender que o objectivo deve ser de um 1,5 graus. Só este comprometimento é um passo bastante importante.

É um passo importante também a consolidação dos mecanismos de financiamento e do fundo dos 100 mil milhões de dólares, que está em relativa convergência. Estou convencida que vão sair pontos importantes. Temos é que ter a noção do que é que é possível atingir, respeitando a tal diversidade de países que estão sentados à mesma mesa.

O processo está irreversível: haver um acordo que reúna todas as nações para um caminho de descarbonização das economias.

Para quem não acompanha tão de perto estas questões ambientais, pode-se dizer que o Protocolo de Quioto falhou?

Estou convicta que o Protocolo de Quioto não falhou em nada. Iniciou um processo de profunda aprendizagem. Aprendeu-se muito politicamente e diplomaticamente, aprendeu-se quase tudo tecnicamente na forma como se fazem os balanços de emissões de gases com efeito de estufa, os mecanismos de mercado que valorizaram a redução das emissões de CO2... Não correu tudo a 100%, como é natural em tudo na vida, mas ensinou-nos muito.

Os empresários começaram, pela primeira vez na altura e durante todo o processo do Protocolo de Quioto, a fazer duas ou três coisas que até aí nunca tinham pensado: pensar a muito longo prazo, a dez, a 20 ou 30 anos, integrar este capital de redução de CO2 nos seus raciocínios. Isso foi uma aprendizagem e são activos muito importantes sem os quais Paris ia ser ainda mais difícil. Teríamos de começar o caminho do princípio.

A preocupação com o ambiente é algo definitivamente levado a sério e não uma mera preocupação politicamente correcta?

A preocupação com o meio ambiente é um pilar essencial do desenvolvimento das sociedades e das economias e das empresas. Basta olhar para o modelo económico da China e para os avisos vermelhos que as cidades da China neste momento têm e correspondem em si mesmos à limitação daquele modelo económico.

Comentários
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  • kiara
    12 dez, 2015 lisboa 01:51
    Gostei da ideia...convem nos protejar ao máximo o nosso ambiente...
  • Antonio Oscar
    11 dez, 2015 Portimão 22:17
    Os problemas dos meios ambientais vão continuar degredando por falta de conhecimentos reais; existem pessoas discutindo entre vários Entidades que não têm conhecimentos verídicos do que se está passando com o aquecimento Global. Como podem alguns Intelectuais como o Presidente Obama; quando ele é só advogado e outros mais como ele que não percebem Patavina de tecnologia Física Terrestre. Mesmo assim alguns deles até estão agravando conflitos da qual na Antártica está o maior perigo para colapso total.

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