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José Miguel Sardica
Opinião de José Miguel Sardica
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10 fev, 2016 • Opinião de José Miguel Sardica


Porventura observando Passos e consta que aconselhado por Portas, Rajoy não quis formar governo: com o PSOE não há “bloco central” possível e o Ciudadanos não lhe chegava, se aceitasse, para a maioria absoluta.

Nos últimos duzentos (se não mais) anos, as histórias de Portugal e Espanha correram entrecruzadas, em convergência ou divergência. Os tempos atuais não são diferentes, pese embora as especificidades de cada um. Em Portugal, passaram 53 dias desde as eleições de 4 de Outubro até à tomada de posse do governo de António Costa. Entretanto, aqui ao lado, na vizinha Espanha, já passaram 52 dias desde as eleições de 20 de Dezembro. Lá como cá, foi o centro-direita que ganhou o escrutínio, embora o PP de Rajoy tenha ficado mais distante da maioria absoluta do que a coligação PàF de Passos Coelho. Lá como cá, a segunda força mais votada foram os socialistas, que também não conseguiram capitalizar o descontentamento contra a austeridade mais recente. Lá como cá - mas mais em Espanha do que em Portugal - o bipartidarismo esfumou-se em cenários novos, de multipolarização política, com a ascensão de novas propostas, rostos e partidos. O BE e o PCP-PEV não são novos; mas nova foi, e é, a sua importância como parceiros da governação socialista. Em Espanha, surgiram, de forma meteórica, o Podemos, à esquerda do PSOE, e o Ciudadanos, à direita dos socialistas e à esquerda de Rajoy. Em Portugal, a política está a fazer-se a 4 ou a 3+1 - as três esquerdas e o espírito da coligação que ainda paira sobre PSD e CDS. Em Espanha também terá de fazer-se a 4 - PP, PSOE, Podemos e Ciudadanos - até porque os novatos conseguiram, respetivamente, 20% e 14% do eleitorado, mais do que as percentagens eleitorais do BE e do PCP-PEV em Portugal. Aquilo que não existe em Portugal, ou que ainda não pesa tanto, é a questão dos nacionalismos/separatismos do país vizinho, e a profundidade da corrupção que, revelada, tem afetado a credibilidade sobretudo do PP.

O que sairá do quarteto político espanhol? Que natureza terá esse primeiro governo empossado pelo também recente monarca, Filipe VI? Porventura observando Passos e consta que aconselhado por Portas, Rajoy não quis formar governo: com o PSOE não há “bloco central” possível e o Ciudadanos não lhe chegava, se aceitasse, para a maioria absoluta. O rei virou-se agora para Pedro Sánchez, que prometeu ter elenco ministerial daqui a um mês. António Costa foi mais expedito - mas era mais fácil. O PSOE precisa de um, idealmente de dois, aliados - mas tanto o Podemos como o Ciudadanos não se contentam com acordos de apoio parlamentar, exigindo a vice-presidência e pastas ministeriais importantes, e onde estiver um não poderá estar o outro. Costa só teve de se entender com a (sua) esquerda; Sánchez tem de dialogar à esquerda e à direita. A isto acresce que o líder do Podemos, Pablo Iglésias, além de radical, é um apoiante do referendo autonómico da Catalunha, um radicalismo de “lesa-pátria” que constitui a linha vermelha intransponível para o PSOE mais moderado e para o Ciudadanos.

O programa governativo de Pedro Sánchez é o equilibrismo possível entre a fidelidade à Europa, a austeridade revista, o combate pelo emprego e a manutenção da Espanha como Estado unido. Por estes dias, o líder do PSOE anda à procura de quem se lhe alie. Mas cada aliado potencial quer exclusividade e nutre desconfiança, quando não ódio, pelos outros aliados possíveis. Talvez o PSOE encontre uma qualquer fórmula de mandar, partilhando pastas ou apoio nas Cortes, aproximando-se do Portugal “costista”; ou talvez, no fim disto tudo, Rajoy ainda apareça como a última solução, distanciando a Espanha do rumo político aberto em Portugal. Aceitam-se apostas sobre o número de dias que ainda correrão até Filipe VI ter um «Presidente del Gobierno».

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