02 jun, 2016
Já trouxe o medo para uma crónica, em 2012. Éramos, então, confrontados com a agorafobia de alguns dos responsáveis maiores do país, ao ponto de os ter levado a celebrar o 5 de Outubro – dia da implantação da República – em espaço fechado, só com convidados! E motivado também pelo medo que começava a grassar nos portugueses, em conexão com o temor das repercussões negativas que se antecipavam na equidade e na justiça e coesão sociais, geradas por políticas públicas caracterizadas por uma intensa austeridade.
Hoje, regresso ao tema. Para referir que o medo é um estado emocional, uma reacção psicológica e fisiológica provocada pela consciência de perigo ou ameaça, sejam eles reais ou imaginários. Sinaliza, para quem o sente, que algo de ruim, de desagradável, pode acontecer.
Na reacção fisiológica ao medo distingue-se o “arco instintivo”, como forma primária de protecção da vida, de sobrevivência, de preparação do indivíduo para a fuga ou a defesa. Neste “arco”, não intervém a razão, pelo que não beneficia de aprendizagens e experiências prévias. É há o “arco racional”, em que a integração e a ponderação corticais de informações e experiências prévias associadas a perigo ou ameaça, permitem a adequação da reacção fisiológica e emocional ao respectivo patamar de risco.
No tempo passado, dir-se-á que havia a ignorância como fiel servidora do medo. Mas hoje, com o acesso generalizado à informação, que razões podem justificar a elevada prevalência da armadilha do medo? Tenho para mim que uma das causas estará na forma como é servida e é consumida a informação – como algo descartável, um fim em si e não um meio para a criação de conhecimento útil a usar na ponderação cortical, na elaboração de juízo próprio. E sem o patamar do juízo próprio não há suporte para a mudança de atitudes e de comportamentos.
Ontem, como hoje, as armadilhas feitas de velhos e novos medos continuam a ser alimentadas pelos detentores de poder e pelos aspirantes a poder, seja a relação de domínio do foro interpessoal, ou à escala de um povo ou de um estado. O “poder” sabe bem quanto os medos perturbam o pensar e a identificação e escolha da verdade, quanto agrilhoam a vontade e permitem enganar e manipular a opinião individual e colectiva. Por outro lado, haverá ainda o recurso ao uso assimétrico da informação e do conhecimento para gerar medos e sustentar dependências, quiçá atentatórias da liberdade e dignidade humanas, e a apropriação indevida de riqueza.
Saber administrar o medo, continua a ser um recurso precioso para o acesso ao poder e para o exercício do poder!