31 mar, 2016
Esta é uma pergunta que continua sem uma resposta satisfatória. Nos seres unicelulares, consideram-se funções elementares da vida, a síntese de proteínas, os processos metabólicos, a regulação da homeostasia e a auto-replicação. Em contraponto, pense-se na complexidade de uma vida humana!
Neste âmbito, a revista Science publicou, recentemente, um artigo da autoria do grupo de investigação de Craig Venter, em que é relatada uma experiência que poderá ajudar, no futuro, a compreender melhor como se inicia uma nova vida e como se desenvolve a complexidade dos seres vivos.
Nesta experiência, os cientistas sintetizaram um genoma juntando um mínimo de informação genética veiculada em apenas 473 genes. Seguidamente, eliminaram o genoma de uma bactéria pré-existente e, no citoplasma restante, introduziram o genoma sintetizado de novo, construindo assim uma nova forma de vida bacteriana que designaram como Syn3.0. E esta, de imediato, iniciou os processos conducentes à síntese de proteínas e à replicação.
Com este tipo de experiências, é de antecipar a possibilidade de se poder vir a perceber melhor a função dos diferentes genes, adicionando-os um a um ou em conjuntos para acrescentar novas camadas de funcionalidades e de complexidade. Será uma tarefa bem complexa: na Syn3.0, com apenas 473 genes, ainda não é conhecida a função de 149 genes! E é ainda previsível que possam vir a servir para compreender a evolução das formas de vida desde os seus primórdios, para sintetizar medicamentos, para a produção de biocombustíveis ou para bioremediar o ambiente.
A Syn3.0 é diferente de todas as bactérias existentes, por ter apenas os genes que lhe permitem viver. Em regra, uma bactéria contém cerca de 4.000 a 5.000 genes. Já o desenvolvimento de um ser humano e o seu viver assentam na informação de cerca de 20.000 genes.
Se a função de um terço dos genes da Syn3.0 não foi identificada, apesar do ambiente laboratorial em que o seu genoma foi sintetizado, imagine-se a complexidade que se deve atribuir à determinação da função dos genes humanos - pelo seu número e pela complexidade que subjaz à regulação da sua expressão e à interacção dos produtos que codificam, uns com os outros e com o meio ambiente.
Muitos dos genes humanos hão-de contribuir para o viver da racionalidade de Craig Venter investida na construção do Syn3.0, ou de Higgs usada para calcular, matematicamente, a existência do bosão. Mas os mesmos genes existem também nos que não desenvolveram o mesmo tipo de racionalidade e apenas dispõem da “fé” para acreditar em Venter e Higgs.
E que dizer da complexidade da identificação de genes debilmente conectados com expressões subjectivas do viver humano, como sejam a razão e os trilhos da consciência, uma paixão, o amor, ou o deslumbramento perante a beleza?