Henrique Raposo
Opinião de Henrique Raposo
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Nem ateu nem fariseu

Porque é que os cães são mais importantes do que os bebés (humanos)?

23 fev, 2018 • Opinião de Henrique Raposo


Porque é que a sociedade que humaniza todos os dias os animais é a mesmíssima que mata à partida os bebés com trissomia 21, só para dar um exemplo?

Muitos amigos têm apontado para uma contradição imoral que salta à vista: a sociedade que criminaliza o abandono de animais recusa criminalizar o abandono de idosos; o indivíduo que comete um crime de manhã quando abandona o tareco no parque de estacionamento do supermercado é o mesmíssimo indivíduo que não comete um crime quando abandona à tarde o pai numa maca do hospital.

Se já está incomodado, caro leitor, agarre-se, porque o poço é ainda mais fundo. Porque é que os cães têm hoje mais atenção mediática e aparato político-legal do que bebés por nascer? É uma situação objectiva e mensurável. Porque é que a sociedade que humaniza todos os dias os animais através de leis e documentários à Attenborough é a mesmíssima sociedade que mata à partida os bebés com trissomia 21, só para dar um exemplo?

Devo alertar o leitor que só uso a palavra “bebé” num contexto humano. “Bebé humano” devia ser pleonasmo, mas temo que hoje em dia é necessário fazer este reparo, pois há pessoas que acham que existem bebés humanos e bebés não humanos, tal como acham que existem seres sencientes humanos e seres sencientes não humanos, tal como acham que um gorila tem mais humanidade do que um bebé ainda não consciente ou do que um velho com Alzheimer. Não, não exagero. É esta a essência da filosofia animalista: alega-se que há mais características humanas num golfinho ou cão do que numa mulher em coma ou num bebé com deficiências cognitivas. Confesso que não sei se hei-de rir ou chorar.

Como dizia há dias Ross Clark (Spectator), a quem roubo o título desta crónica, é difícil reconciliarmo-nos com uma sociedade que silencia os direitos dos seres humanos por nascer enquanto hiperboliza os alegados direitos de cães, gatos e periquitos. Se quisesse agora proteger os bebés com trissomia 21 (proibindo o seu aborto), um político seria massacrado na praça pública, seria apelidado de “reaccionário”, “moralista”, “anti-feminista”, “inimigo da liberdade de escolha das mulheres”, etc., etc. Se quisesse voltar a discutir a lei do aborto no sentido de tornar a prática mais difícil, um intelectual receberia o mesmo tratamento. É por isso que existe um silêncio de morte sobre o aborto, em geral, e sobre o massacre a que são submetidas as crianças com trissomia 21, em particular. Ainda há dias, vi uma coisa que me deixou fisicamente indisposto: imensa gente celebrou a “modernidade” da Islândia, porque este país proibiu a circuncisão de rapazes; alega-se que a tradição familiar e religiosa não é superior aos direitos das crianças. A hipocrisia fede. A Islândia é o país onde não nascem bebés com trimossia 21, porque são todos abortados. Todos. Há uma campanha de eugenia em curso na Europa e os “modernos” que odeiem o “misticismo religioso do passado” consideram que esta limpeza genética é um sinal de progresso médico. O meu caro leitor já decidiu: vai rir ou chorar?

Na Islândia, em França, no Reino Unido, em Portugal, no Ocidente em geral, há um silêncio de morte em relação ao aborto e há ainda um evidente desconforto perante a presença de bebés e pessoas com trissomia 21. Em França, no ano passado, foi proibido um clip publicitário com crianças com trissomia 21; alegou-se que as imagens podiam ofender ou traumatizar as mulheres que abortaram bebés com trissomia. Rir ou chorar? A civilização que mata e esconde seres humanos com deficiências e que trata um defensor de crianças por nascer como um mero fanático religioso é a mesmíssima civilização que faz campanhas diárias em nome dos animais: não à caça, não à tourada, não ao bife, não à proibição de animais em restaurantes e jardins. Confesso que não sei se hei-de rir ou se hei-de chorar.

Comentários
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  • Isabel
    21 dez, 2018 Parede 13:10
    Acho que deve chorar. E tentar perceber o que é que está mal no seu raciocínio.
  • António Freitas
    25 ago, 2018 Alcabideche 07:54
    Caro Henrique Raposo, gostei do seu artigo. Vivemos de facto numa sociedade que está a perder a sua dignidade, cultura, principios básicos de sociedadesfortes e defensoras das pessoas. Todos os seres vivos têem os seus direitos, mas não podemos cair no exagero e no ridiculo. A vida humana é a motora de uma sociedade que se quer iguaitária entre os seus, e que não descure os outros seres vivos que nos rodeiam. Falsos moralistas são aqueles que devendem os animais ditos de "estimação" mas que são capaz de os abandonar. Aí de nós se os principios básicos de uma sociedade se começarem a inverter. Bem haja.
  • Henrique Raposo
    21 abr, 2018 Covil 13:03
    Tristeza de texto, tristeza de pessoa. São estas mesmas figuras que se acham "moralistas" e apanham o comboio de "bebés humanos" deficientes ou "velhos" com Alzheimer - ele é que os caracteriza, denegrindo-os, de deficientes e velhos - para terem alguma visibilidade, ainda que triste.
  • Maria neves
    06 abr, 2018 Matosinhos 11:08
    Choro porque é impossivel rir.Tenho 6 filhos sem problema algum.Estou há mais de 25 anos ligada à um movimento de apoio à pessoa deficiente mental e sua família. São "deficientes" mas dão nos 1000 vezes mais do que qualquer um de nós lhes dá Levam nos a descobrirmos nos e olhar as nossas fragilidades Se calhar é por isso que não os queremos!!
  • Rosário puga
    04 mar, 2018 Lisboa 11:42
    A isto chamo demagogia! Par início de conversa, comparar humanos e animais é rebaixar o humano ao nível de animal irracional. Os animais têm de ser defendidos, sim. São os humanos que alteram o meio ambiente, que criam animiazinhos para satisfazer os seus egos e para brinquedos das crianças e depois são capazes de os abandonar, como se fossem objectos! Seres humanos com alguma consciência e evolução não fazem isso, dai a necessidade dos direitos dos animais. Claro que é crime abandonar idosos em hospitais! Para terminar, apesar de poder dizer muito mais contra este texto, para mim é imoral um texto destes de MANIPULACAO EMOCIONAL. O autor deve aprender o que é moral e humildade. Estou farta desta manipulação constante por parte destes seres que têm acesso e "voz" na comunicação social e não a usam com parcimónia e se para imprecionar ou manipular. Apreendam com o Padre Tolentino Mendonça.
  • Henrique Texugo
    28 fev, 2018 Campo Maior 22:19
    Graças ao divino Deus que nos criou a todos e em especial o Exmo. Sr. Dr. Henrique Raposo. Parem de defender os animais. Eles têm garras e dentes para alguma coisa. As vacas podem perfeitamente matar as pessoas que as tentam ordenhar e fazer em bifes mas não o fazem porque reconhecem a superioridade do ser humano (em em especial o meu querido amigo do coração Henrique Raposo) e sabem que Deus as colocou neste planeta para serem transformadas em hambúrgueres. Se não fosse assim Deus Nosso Senhor não as tinha criado tão deliciosas e cheias de tanta carne. Tratem antes de ajudar os seres humanos. Esses sim são uns coitados, incapazes de pedir ajuda. É que Deus às vezes andam muito ocupado com os muçulmanos e esquece uns quantos de nós, mas felizmente são sempre os mais pobres. O Meritíssimo Sr. Raposo sabe bem do que estou a falar. Por isso é que temos de continuar a votar na direita conservadora cristã e dar sempre uma esmola aos pobrezinhos e rezar para que Deus os tome na sua atenção e lhes permita ganhar o euromilhões ou arranjar um emprego na junta de freguesia como todos nós. Os pobres e os animais não querem reformas estruturais nem sequer uma evolução social. Eles preferem dormir nos contentores do lixo e comer sobras do que trabalhar por ordenado digno ou ser adoptado. Deus, Jesus e a Imaculada Virgem Maria o abençoe para sempre Caro Amigo Henrique Raposo. Deus está do seu lado assim como todos os grunhos de Portugal.
  • Maria Raquel
    28 fev, 2018 Montijo 14:09
    Concordo inteiramente.Tenho uma Afilhada com 45 anos temente a Deus responsável pelo que faz e discernindo em seus valores morais. Uma alminha perfumada de Nosso Senhor amando a vida e as Herofanias de Deus
  • Manuel Guedes
    27 fev, 2018 21:49
    Porque é que a sociedade que animaliza todos os dias os seres humanos é a mesmíssima que também mata à partida milhões de seres vivos numa espiral de experiências diárias para satisfação própria e legitimação de um antropocentrismo redutor de todos os outros seres vivos? Muitos amigos têm apontado para uma contradição imoral que salta à vista: a sociedade que criminaliza o abandono de crianças e idosos recusa criminalizar o abandono de outros animais. O indivíduo que comete um crime de manhã, quando abandona o avô doente no catre onde vegeta, é o mesmíssimo indivíduo que não comete um crime quando à tarde lança o tareco pela janela do carro fora numa qualquer auto estrada. Se já está incomodado, caro leitor, agarre-se que o poço é ainda mais fundo. Porque é que os humanos têm cada vez mais atenção mediática e aparato político- legal do que seres por nascer e em vias de extinção? É uma situação objectiva e mensurável. Porque é que a sociedade que animaliza todos os dias os humanos através de leis e documentários à Trump é a mesma sociedade que em experiências científicas diárias para fomento de vaidades e outras futilidades encarcera milhões de seres vivos, tortura-os, rouba-lhes a pele, órgãos e até as suas vidas para gozo obsceno?, só para dar um exemplo. Devo alertar o leitor que só uso a expressão seres vivos num contexto animal. “Ser vivo”, deveria ser pleonasmo, mas temo que hoje em dia, é necessário fazer este reparo, pois há animais que acham que só existem bebés humanos, tal como acham que só existem seres sencientes humanos, tal como têm a certeza que um bebé humano seriamente deficiente e ainda não consciente e sem quaisquer capacidades para adquirir competências e até um idoso completamente inconsciente são mais dignos de viver do que a cria, por exemplo de um gorila. Não, não exagero. É esta a essência da estultícia deste raposo: alega-se que há mais características próximas do ser humano num ser vivo nascido de mulher embora sem quaisquer capacidades para adquirir competências, do que num golfinho ou cão de perfeita saúde. Confesso que não sei se hei- de rir ou chorar. É difícil reconciliarmo-nos com uma sociedade que silencia os direitos dos seres vivos não humanos, e usa-os ao mesmo tempo em experiências crudelíssimas, cobertas pelo rigor da ciência, enquanto diviniza o poder discricionário dos homens sobre aqueles. Se quisesse agora proteger os macacos usados pela indústria científica ( proibindo o desprezo da ciência para com a sua dor) um político seria massacrado na praça pública, seria apelidado de “ maluquinho”, “anormalzinho”, “ anti-sistema”, inimigo do progresso humano”,etc.,etc..Se quisesse voltar a discutir a lei da protecção dos animais não humanos, no sentido de a tornar mais eficiente, um intelectual receberia o mesmo tratamento. É por isso que existe um silêncio de morte sobre a possibilidade de criação de uma Caixa Pública para tratamento e segurança dos animais. Ainda há dias, apercebi-me de uma coisa que me deixou fisicamente indisposto: imensa gente celebrou a “ modernidade” que os avanços da investigação científica nos Estados Unidos, o país dos direitos, documentam, porque este país tortura e mata milhões de seres vivos anualmente em experiências para que os humanos possam usar sem perigo determinados produtos industriais, com a complacência de uma justiça e religião dominadas pelo dólar. Alega-se que a tradição familiar e, pasme-se, até religiosa a propósito da consideração para com os animais não humanos, não são superiores aos direitos da vaidade e dos prazeres humanos. Que estão acima de tudo, até de si próprios. E tal não é hipocrisia, não. Basta prestar atenção à dimensão dos escândalos levados a cabo ao longo dos tempos pelas variadas religiões cujo protagonismo de outrora tem vindo a mostrar-se tão grande quanto agora o seu silenciamento. Em favor da sempre renovada promessa das liturgias do lascivo prazer. Há uma campanha antropocêntrica em curso na Europa e os “ conservadores” que odeiam os “ ventos da objectividade” consideram ser a sua racionalidade um sinal de retrocesso civilizacional. O meu caro leitor já decidiu: vai rir ou chorar? Na Irlanda, em França, em Portugal, no Ocidente em geral, há um silêncio de morte em relação à necessidade urgente de legislação e consequente cumprimento, capaz de prover a sociedade de mecanismos de protecção da saúde e da defesa dos animais, pelo que assistimos ainda a um grande desconforto perante a vista de animais criminosamente abandonados e que todos os dias são maltratados com direitos televisivos. Alega-se a perversidade das redes sociais. Rir ou chorar? A civilização que envenena e alegremente estropia os seus companheiros não humanos, para em seguida se desbragarem em sonoras gargalhadas e que trata um defensor de animais como um fanático anti sistema é a mesmíssima civilização que faz campanhas diárias em nome dos bebés humanos: sim aos cuidados com o bebé, sim à sinergia das brincadeiras bébé/animal, sim, à fruta e legumes em detrimento da carne, sim, à companhia de animais em restaurantes e jardins. Só cabecinhas ditas ateias mas incapazes de deter o desvario religioso conseguem sem saber, denunciar o sagrado que ainda lhes polui as meninges, confirmando-se assim como hipócritas de excelência. A complacência com que apreciam a contínua e feroz prática de tortura e morte de seres vivos é prova bastante da sua intransigência farisaica. Vai o leitor rir ou chorar?
  • Carlos Miguel Cruz
    27 fev, 2018 Lisboa 13:42
    Espectacular caro Henrique. Concordo em absoluto consigo. Existe algo de errado com a politica em Portugal. As questões estratégicas para o país não são discutidas. Estamos no segundo ano consecutivo de seca em Portugal. Queixamo-nos de Espanha mas esquecemo-nos que somos nós que deviamos acautelar este recurso estratégico que se chama água. Quantas estacões de de dessalinização temos ? O ano passado foi pior ano de fogos florestais em Portugal e como estamos hoje ? O que fizemos ? Quem se preocupa com as questões que se refere nunca teve problemas sérios na vida. Não sabem dar valor ao que dão por adquirido mas que na realidade não o é. São os politicos que temos e fomos nós que os escolhemos. Temos o que merecemos. Cumprimentos . Carlos
  • Sónia Delgado
    26 fev, 2018 Viana do Castelo 23:38
    Deveria ser obrigação de todos nós defender a vida humana. Que bom que não fomos abortados. Todos têm o direito de não o ser. O direito à vida jamais deve ser roubado. Depois, ninguém diz que quer ser velho mas todos queremos chegar lá. E como será então? Seremos descartados? Gosto muito de animais. Nem isso está em causa. Mas é a Natureza, as raças defendem -se. Nós, os dotados de inteligência, parece que desaprendemos as leis da natureza.