Na época, a família vivia da agricultura, e aos 5/6 anos Natália Ferreira já andava na fazenda a apanhar ervas para os animais. Chegou a dormir no meio do gado. “Às vezes, tinha de ir para a frente do gado. Tinha medo”, recorda, contando que puxava “as vacas com uma cordinha para seguirem a direito pelo terreno, enquanto o pai seguia atrás com o arado”.
“Um dia, fui semear milho e, em vez de ir deitando, na terra, um ou dois de cada vez, ia pondo uma mão cheia. Quando o meu pai viu, bateu-me. Tive de fazer tudo de novo”, recorda.
Apesar de ter nascido no concelho de Torres Vedras, conhecido também pelas suas praias, e de aí ter crescido até se casar, Natália Ferreira só viu o mar pela primeira vez na adolescência. “Devia ter uns 15 ou 16 anos”, lembra, recordando também como foram os primeiros tempos em que passou a haver, na sua aldeia, uma televisão que era partilhada por todos os moradores. “Enchia-se uma sala inteira para ver a tourada e os ranchos. Era tão bonito.”
Anos mais tarde, já casada – as primas tinham fugido para se juntarem aos companheiros, mas Natália fez questão de fazer tudo “como deve ser” –, teve as duas filhas no hospital. “Nunca fui ao médico durante a gravidez”, diz, contando que a filha mais velha emigraria para o Luxemburgo onde permanece até hoje.
Os anos que o marido passou, ainda solteiro, na Guerra do Ultramar acabariam também por marcar a família. “Traumatizou-o muito. Levou com ele muitos amigos que já não voltaram. Outros ficaram sem a perna ou sem o braço”, recorda a filha, Luísa Isidoro, contando que, durante algum tempo, o pai procurou no álcool um refúgio para esquecer os tempos passados na Guiné.