A Presidência da República foi alvo de “vigilância” e “operações encobertas” que só pararam com a queda do Governo de José Sócrates, acusa Fernando Lima, o ex-assessor de Cavaco Silva em Belém.

Sete anos depois do polémico “caso das escutas”, que rebentou em Setembro de 2009, Fernando Lima decidiu escrever o livro "Na sombra da Presidência - Relato de 10 anos em Belém" (Porto Editora), a contar a sua versão de um dos períodos mais atribulados dos mandatos de Cavaco Silva.

Num depoimento divulgado à comunicação social pela editora, Fernando Lima começa por esclarecer que nunca falou de escutas, “mas sim de vigilância” a Belém e sublinha que a queixa era partilhada por “outras entidades”.

O ex-responsável pelo gabinete de comunicação de Cavaco Silva conta que lhe aconteceram “situações que ultrapassaram” sua “própria imaginação”. Mesmo depois de deixar a assessoria continuou “a ser alvo” de quem o “seguia”, garante.

E quem estaria por detrás destas operações? Fernando Lima considera que “só um poder bem organizado é que teria capacidade para fazer o que motivava tantas queixas”.

O tempo ajudou o ex-director do DN e ex-jornalista do JN dissipar “o mistério” e a “confirmar as desconfianças”.

“Situações estranhas, que descrevo no livro, foram-me acontecendo sem que encontrasse uma razão plausível. Só pararam quando o Governo de José Sócrates foi substituído”, declara o antigo homem de confiança de Cavaco Silva.

Com a queda de Sócrates, sublinha, “deixaram-se inclusivamente de ouvir as queixas daqueles que suspeitavam também de serem vigiados”.

Neste depoimento, Fernando Lima explica que no livro “Na Sombra da Presidência” está a “sequência dos factos de um processo político que pretendia, naquela altura, desqualificar a Presidência da República e o seu titular”.

“A Presidência era o único poder que não se deixara submeter à lógica de quem governava em 2009, pelo que era necessário desgastá-la para que, perante os portugueses, fosse perdendo prestígio e autoridade. Surgiram situações da vida pessoal do Presidente, como o BPN e a casa no Algarve, que o marcaram para sempre”, argumenta.

O “caso das escutas” deixou marcas profundas na relação entre o assessor e o Presidente. “A minha relação com Cavaco Silva ficou afectada”, conta Fernando Lima.

“Ainda hoje, não compreendo que tenha tido comigo comportamentos que considero inexplicáveis, depois de termos convivido ininterruptamente, desde que comecei a trabalhar com ele em 1986. Confesso que não o esperava”, lamenta.

Lima foi afastado da assessoria de comunicação, mas continuou em Belém, na Casa Civil da Presidência.

O antigo assessor diz que respeitou, “até ao fim” o convite para prosseguir na equipa de Cavaco Silva durante o segundo mandado, mas agora “é tempo de usar o direito à defesa” e decidiu escrever um livro a contar a sua versão dos factos.

O "caso das escutas" começou em Agosto de 2009, quando o jornal “Público” fez manchete com suspeitas da Presidência da República de estar a ser "vigiada" pelo Governo.

No mês seguinte, o “Diário de Notícias” revelou que quem "encomendou" a notícia foi Fernando Lima, que depois deixou a assessoria da comunicação social e passou para a Casa Civil da Presidência.

O livro "Na sombra da Presidência - Relato de 10 anos em Belém" chega às bancas a 8 de Setembro.