O socialista Augusto Santos Silva diz compreender que o Presidente da República tenha dado a iniciativa de formar governo a Passos Coelho.

À Renascença, o antigo ministro do PS defende que cabe ao líder do PSD aproximar-se de um quadro parlamentar onde a direita deixou de ter uma maioria capaz de suportar um governo estável.

Cavaco Silva convidou Passos Coelho para iniciar o processo para a formação do próximo governo, mesmo com maioria relativa. Era o desfecho previsível?

Compreendo que o Presidente da República tenha convidado o doutor Passos Coelho a ter a iniciativa, visto que ele é que é o líder do partido com maior representação parlamentar. Devo dizer, no entanto, que fiquei um pouco surpreendido com a fórmula: estava à espera que o Presidente da República convidasse o doutor Passos Coelho para formar governo. No entanto, optou por uma fórmula diferente e disse que o tinha convidado para iniciar as diligências tendo em vista a formação de um governo. De qualquer forma, o essencial é que o doutor Passos Coelho tem agora a responsabilidade de tentar formar um governo.

E como fica o PS neste processo? António Costa disse, em campanha, que não haveria qualquer acordo com esta direita e surge, agora, disponível para dialogar com todos. Incluindo a direita...

O que é compreensível...

Não será contraditório, ou ambíguo, que António Costa esteja disponível para dialogar com uma coligação com quem prometeu que nunca haveria acordos e com uma esquerda que acusou de, sistematicamente, preferir criticar o PS em vez de condenar os quatro anos de governo PSD-CDS?

Vamos por partes. Em primeiro lugar, o eleitorado não deu ao PS a legitimidade para assumir a iniciativa de formar governo, visto que o grupo parlamentar mais numeroso não é o do Partido Socialista. Por isso, a tentativa de resolver o problema político criado pelo resultado das eleições pertence ao PSD e, por isso, fez bem o Presidente da República em convidar o líder do PSD.

Também me parece que não é imaginável que um eventual governo PSD-CDS possa contar com a viabilização parlamentar da sua existência por parte do PS, se persistir em prosseguir as políticas que prosseguiu nestes últimos quatro anos e que mereceram no voto uma ampla maioria de rejeição.

É aí que o PS se aproxima das forças mais à esquerda?

Julgo que temos de ir por ordem lógica. Neste momento, o doutor Passos Coelho é que tem de se aproximar do novo quadro parlamentar. Ele é que tem de ter a capacidade de fazer propostas que tenham em conta um quadro parlamentar em que ele já não dispõe de maioria. Portanto, tem que haver mudanças na orientação política e essas mudanças têm de ser consagradas num eventual programa de governo.

Insisto: por via de um diálogo com as forças mais à esquerda, teria o PS hipóteses de formar governo, tal como foi defendido, por exemplo, pelo líder do PCP na noite eleitoral?

Apesar de compreender essa curiosidade, não me parece ser essa a questão lógica que se põe neste momento. Primeiro, precisamos de respeitar o resultado das eleições. Logo depois, a vontade do Presidente da República, que, nos termos da Constituição, é quem interpreta os resultados eleitorais e inicia diligências para a formação de um governo.

O Presidente da República escolheu convidar Pedro Passos Coelho. A meu ver, bem. E agora cabe ao doutor Passos Coelho propor um quadro de formação e programação de governo que seja gerível num parlamento que já não tem uma maioria absoluta de direita.