A qualidade da Ciência e do Ensino Superior em Portugal pode estar em risco, se não for invertido o caminho da precariedade no setor. O alerta é lançado pelo Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNEsup), numa altura em que exigem à tutela que avance com a revisão do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES).

“Todas as informações que nós compilamos e que são conhecidas demonstram que, nas instituições de ensino superior público, cerca de 42% dos professores são contratados precariamente”, denuncia Mariana Alves, do Sindicato Nacional do Ensino Superior.

Mariana Alves assegura que investigadores e docentes vivem numa “incerteza permanente relativamente a qual é o próximo contrato que vão ter e se vão ter algum contrato”.

A sindicalista considera que esta realidade tem sido agravada pela implementação, há 15 anos, do RJIES. Segundo o SNEsup, este documento abriu portas a maior precariedade entre os docentes e investigadores, bem como a uma menor participação nos órgãos de gestão das universidades e politécnicos.

“Nós temos tido efetivamente nos últimos anos um reconhecimento muito elevado em termos do trabalho científico e académico que se faz em Portugal, é um trabalho que é feito com qualidade. Mas todas estas tendências que estão aqui identificadas de deterioração das condições de trabalho podem, a prazo, vir a impossibilitar esta elevada qualidade”, alerta a sindicalista.

Mariana Alves explica que o RJIES devia ser revisto de cinco em cinco anos, mas tal nunca aconteceu, graças a “uma inação dos sucessivos governos que não têm efetivamente desencadeado os mecanismos necessários para fazer esta avaliação e esta revisão”, acusa.

“O SNEsup há já dois anos, em dezembro de 2020, colocou uma ação em tribunal contra o Ministério da Ciência e do Ensino Superior precisamente pelo facto de não ter sido avaliado nem revisto o RJIES, como a própria lei previa que fosse feito”, reforça.

O processo na justiça ainda corre, mas dada a morosidade, o sindicato avançou com um estudo sobre o impacto deste regime. O essencial deste estudo vai ser apresentado esta segunda-feira à ministra da Ciência e Ensino Superior, Elvira Fortunato, e no dia 21 à Assembleia da República.

Docentes no privado ainda mais precários do que no público

Ainda sobre o RJIES, o sindicato explica que o documento também previa que fossem estabelecidas novas regras para as condições de trabalho dos professores e investigadores no ensino superior privado, mas essa legislação nunca foi elaborada.

“Nós temos um vazio legal para o qual também já alertámos múltiplas vezes ao longo destes últimos anos quer o Governo, quer a Assembleia da Repúblicas, mas este decreto-lei nunca foi produzido”, explica.

Mariana Alves defende a existência de “um paralelismo entre as regras de trabalho nas instituições de ensino superior privadas e aquelas que são as regras de trabalho nas instituições de ensino superior públicas”, reforçando que “neste momento não há regras” para o privado, ficando “dependente das condições de cada instituição de ensino superior privado e das suas condições particulares”.

Mariana Alves assegura que têm relatos de docentes do privado que têm “condições de trabalho absolutamente indignas, com uma grande incerteza, de semestre para semestre”.