Na sequência da tomada de posse de Jair Bolsonaro, no Brasil, Marcelo Rebelo de Sousa falou aos jornalistas nestes termos: “Como disse e como disse o Presidente Bolsonaro, era uma reunião entre irmãos, e entre irmãos o que se diz diz-se rápido, como em família, e há uma empatia natural entre povos que facilita fazer passar a mensagem.”

Ontem mesmo, na estreia de um programa televisivo da manhã num canal privado, Marcelo telefonou à apresentadora e disse: “"Está? Daqui é Marcelo Rebelo de Sousa. Interrompi aqui uma reunião que tinha e espreitei para ver o seu primeiro programa e, como ao longo da vida, estive várias vezes consigo quando arrancou com novas fases da sua vida, queria desejar-lhe muitas felicidades e enviar-lhe um beijinho".

Num e noutro episódios o Presidente da República Portuguesa pareceu comportar-se como um cidadão sem responsabilidades de representatividade. No primeiro, exibiu proximidade a mais num enquadramento em que a diplomacia (até pela excecionalidade da sua deslocação) aconselharia muito mais prudência e no segundo confundiu deliberadamente o universo de relações pessoais com o exercício da sua função.

Foi com alívio que a maioria dos portugueses percebeu no novo ocupante do mais alto cargo político uma postura completamente diferente da do seu antecessor. E foi com um olhar benevolente e carinhoso que, na generalidade, lhe foram aplaudindo gestos de genuíno afeto ou de intervenção veemente (como parece ser a sua vontade de contrariar a normalização do problema dos sem-abrigo).

Mas Marcelo Rebelo de Sousa (ou alguém na sua muito profissional equipa de apoio) devia já ter percebido que a presença constante nos média aumenta o risco de ocorrência de episódios como estes – dilui as mensagens importantes num mar de espuma sem sentido.
Embora se possa argumentar – com razão – que o estilo da atual presidência assenta, em larga medida, numa personalização do cargo e, por arrastamento, numa maior visibilidade das marcas dessa mesma personalidade talvez esteja na altura de se começarem a levantar sinais de aviso. Não queremos um presidente ‘mudo e quedo’ mas também não queremos um presidente que, num dia, se mostra muito preocupado com as pulsões populistas dos partidos políticos e que, noutro dia, está a ligar a um programa de TV para desejar ‘muitas felicidades’ a uma amiga.