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Raquel Abecasis

Tiros no pé presidencial

02 jan, 2015 • Raquel Abecasis

O Presidente decalca o discurso do Governo, o que, no início de um ano eleitoral, não é aconselhável a alguém que deve ser o árbitro imparcial do sistema.

Na sua mensagem de ano novo, Cavaco, no seu tom habitual, acabou por assinar por baixo todas as acusações de falta de imparcialidade que lhe têm sido feitas.

No diagnóstico do caminho feito nos últimos anos o Presidente decalca o discurso do Governo, o que, no início de um ano eleitoral, não é aconselhável a alguém que deve ser o árbitro imparcial do sistema.

É bom que um chefe de Estado diga aos portugueses que há motivos de esperança para o ano que se inicia, mas se isso não é feito com conta, peso e medida, sobretudo no início de um ano eleitoral, dá razão a quem o acusa de trazer o Governo ao colo, razões que se reforçam quando avisa que não é com um discurso facilitista que lá vamos. Está a falar de quem, depois de ter elogiado o trabalho feito?

Depois, há o eterno apelo à moderação no debate político, mas aqui também o facto de estarmos a entrar num ano eleitoral deveria obrigar a uma outra formulação. Ou seja: se não há debate a sério em tempo pré-eleitoral, então quando é que haverá?

Neste enquadramento, o apelo a que se comece já a pensar no período pós-eleitoral, um alerta importante e necessário, acaba por perder o peso e a importância que deveria ter.

Cavaco é visto pelas forças políticas como alguém que toma partido perdendo assim o ascendente que seria necessário que tivesse, particularmente neste momento, já que quando chegar o pós- eleições pouco ou nada poderá fazer, por estar limitado nas suas funções a menos de seis meses do final de mandato.

Finalmente, a introdução a despropósito nesta mensagem do combate à corrupção não passa despercebida. Ao fazer esta menção, assim sem mais nada, Cavaco deve ter pensado que para bom entendedor meia palavra basta. O que fica no ar é que o Presidente está a assinalar o caso Sócrates, com quem todos sabemos que manteve uma relação tensa. Não terá resistido a uma pequena vingança, que fica mal a quem ocupa o cargo que ocupa, sobretudo porque este caso ainda é tudo menos claro.