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Propostas de imigração de Cameron. "Inaceitáveis mas discutíveis"

12 dez, 2014 • José Pedro Frazão

Governo britânico quer expulsar qualquer imigrante europeu que esteja seis meses sem emprego. E só pretende dar apoios sociais a quem ali resida há pelo menos quatro anos. O tema esteve em debate no programa "Fora da Caixa" da Renascença, com António Vitorino e Santana Lopes.

Propostas de imigração de Cameron. "Inaceitáveis mas discutíveis"
Governo britânico quer expulsar qualquer imigrante europeu que esteja seis meses sem emprego. E só pretende dar apoios sociais a quem ali resida há pelo menos quatro anos. O tema esteve em debate no programa "Fora da Caixa" da Renascença, com António Vitorino e Santana Lopes.

Os comentadores do programa “Fora da Caixa” da Renascença criticam as propostas do primeiro-ministro britânico, David Cameron, que apontam para restrições de direitos a imigrantes europeus no Reino Unido.

António Vitorino, que foi comissário europeu para os Assuntos Internos, faz uma distinção: “As propostas que ele faz são, algumas, discutíveis, outras inaceitáveis”.

Explica que “algumas são inaceitáveis porque vão contra o Direito europeu e exigiriam alteração dos tratados, criando uma espécie de excepção britânica para a liberdade de circulação de pessoas. É o caso da medida de quatro anos de residência para os imigrantes poderem ter acesso a benefícios sociais que constitui uma discriminação fundamental em relação aos outros cidadãos”, exemplifica.
 
Para o antigo ministro socialista, esta proposta e a que propõe a expulsão de cidadãos que ao fim de seis meses tenham ficado no desemprego “são manifestamente contra os tratados e contra a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia”.

No entanto, António Vitorino considera crucial manter algum diálogo sobre outras propostas de David Cameron.

“Constituem uma base para uma discussão. Não haverá maneira de manter o Reino Unido na União Europeia se não encontrarmos algumas soluções razoáveis para parte dos problemas que ele coloca. Que há situações de abuso do Estado Social em virtude da liberdade de circulação, não vou negá-las. Elas [as situações de abuso] são marginais, não têm a dimensão que os britânicos querem fazer crer. Mas acho que devemos estar disponíveis para lutar contra todo e qualquer abuso. Porque o abuso desvirtua a liberdade”, considera António Vitorino.

O antigo comissário europeu sugere uma aproximação nos seguintes termos: “Há toda a abertura para negociar questões de abusos e situações não discriminatórias. Em relação a tudo o que seja violação dos tratados, não creio que haja condições para criar uma excepção britânica em matéria de liberdade de circulação de pessoas”.
 
"Fruta da época pré-eleitoral"
Santana Lopes associa estas propostas a um clima pré-eleitoral, a caminho das legislativas de Maio de 2015.

“Estes meses não vão ser de diálogo fácil. Preocupa-me a data das eleições, anúncios de referendos, enfim. É que este dossier não pode deslizar. Este é um tempo para a diplomacia, mais do que para os políticos de Bruxelas. É um tempo para a diplomacia discreta e eficaz procurar salvaguardar aquelas pontes possíveis de entendimento”, refere.

Recomendando mais trabalho diplomático, o antigo primeiro-ministro admite uma pausa no diálogo mais político entre Londres e Bruxelas. “Os responsáveis políticos têm que esperar seis meses se quiserem resolver o problema. Custa muito a crer que Cameron feche assim um acordo com Bruxelas numa matéria como esta antes de eleições, com as condições internas que tem. Se o fizer, tiro-lhe o meu chapéu. Isto é fruta da época pré-eleitoral. Cameron sabe bem que há aqui pontos que não podem passar”, sublinha.
 
António Vitorino diz que aceitar as propostas de Cameron contém um risco de fundo para a União Europeia.

“Não é possível ‘salamizar’ o mercado interno. Se há liberdade de circulação de capitais, bens e mercadorias, também deve haver liberdade de circulação de pessoas. Esta não pode ser o parente pobre das quatro liberdades, que são indissociáveis das outras. Começa-se por estabelecer restrições à liberdade de pessoas e a seguir vêm depois as restrições seguintes. Estaríamos a desmantelar o mercado interno, que foi sempre um princípio fundamental dos próprios britânicos.”
 
O antigo comissário assinala ainda outro argumento, com uma pitada de ironia: “ Há países que estão em envelhecimento acelerado e há países que aguentam melhor a questão do envelhecimento. Um destes últimos casos é o do Reino Unido. Sabe porquê? Por causa da imigração”.
 
O "Fora da Caixa", que pode ouvir sexta-feira a partir das 23h00, na Edição da Noite, é uma colaboração da Renascença com a Euranet Plus, rede europeia de rádios.