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Pierre Lemaitre

Sobreviventes da I Guerra Mundial são como os desempregados europeus de hoje

10 jul, 2014 • Maria João Costa

"Até nos vermos lá em cima" é o nome do livro que venceu a última edição do prestigiado prémio literário Goncourt em França. O autor Pierre Lemaitre conta a história daqueles que sobreviveram à guerra, pessoas que compara com os desempregados europeus de hoje.

Sobreviventes da I Guerra Mundial são como os desempregados europeus de hoje
"Até nos vermos lá em cima" é o nome do livro que venceu a última edição do prestigiado prémio literário Goncourt em França. O autor Pierre Lemaitre conta a história daqueles que sobreviveram à guerra, pessoas que compara com os desempregados europeus de hoje.

Pierre Lemaitre encontra semelhanças entre os soldados franceses que sobreviveram à I Guerra Mundial e os desempregados de hoje na Europa. Segundo o vencedor do Prémio Goncourt 2013 os desempregados são “gente que fez tudo o que lhes foi pedido. Trabalharam, endividaram-se para comprar as suas casas e apartamentos, criaram os seus filhos e quando estavam contentes já não havia trabalho!”.

De passagem por Lisboa onde esteve a apresentar o livro "Até nos vermos lá em cima", Lemaitre considera que os “desempregados europeus são uma população que o sistema social é incapaz de acolher.”

Num hotel de Lisboa, o autor francês explica-nos que espera ter escrito um livro com uma história universal. "Até nos vermos lá em cima" retracta o final da I Guerra Mundial e a prova difícil de como os sobreviventes têm de reaprender a viver em paz.

Lemaitre diz que “quando se sai de uma guerra, não se desliga o botão como se fosse um botão electrónico. Há um pequeno período de dois, três, quatro anos depois que são anos onde as pessoas têm de reaprender a viver em paz. Têm de deixar sair de si o espirito da guerra”. É como fazer um luto, mas neste caso, “fazer o luto de algo que se detestou”.

Como personagens principais "Até nos vermos lá em cima" tem dois amigos Edouard e Albert. “O Albert é um pequeno empregado de um banco, não é um homem muito corajoso ou brilhante. É um homem vulgar, diria mesmo quase banal que se enterra numa burla no último dia da primeira guerra. Ele é salvo pelo Edouard que é o oposto dele. É um homem que vem da grande burguesia, que vem de uma família rica” explica-nos o escritor que com este confronto de personalidades quis “reflectir como a guerra provoca grandes ligações sociais. Na guerra encontram-se homens que nunca se encontrariam em circunstâncias normais.”

Este livro agora editado em Portugal pela Clube do Autor sai numa altura em que se assinalam os cem anos da I Guerra Mundial, mas o escritor explica que foi uma feliz coincidência o lançamento agora. Em entrevista à Renascença Pierre Lemaitre não exclui que o seu “subconsciente escolheu esta data, mas normalmente o livro deveria ter sido publicado em 2008, mas devido a razões de calendário do editor isso não foi possível”. Não terminou o livro nessa altura, acabando antes uma trilogia policial e por isso o seu romance seguinte foi terminado em 2012 e saiu em 2013.

Pierre Lemaitre que tem um percurso literário com policiais no curriculum explica que este tem também alguns ingredientes do policial, mas junta outros condimentos. “O que é único neste livro é que não é um policial mas é contado como um policial. Misturei o romance histórico, o romance picaresco e o policial e isso dá a este livro um lado um pouco estranho. É ao mesmo tempo um livro situado num tempo histórico, conta uma aventura picaresca com os ingredientes de um romance policial”, explica-nos.

Foi com este livro que Pierre Lemaitre venceu o Prémio Goncourt, um prestigiado galardão francês que tem o valor simbólico de dez euros, mas que gera uma onda de reacções valiosas. O escritor considera que “é algo muito francês, não há paralelo em lado nenhum. É um prémio literário que é um símbolo, um emblema enorme! Mesmo as pessoas que nunca lêem querem saber quem ganhou o prémio Gouncourt. O laureado com o prémio aparece na imprensa como se fosse um jogador de futebol do mundial. Penso que só em França há um prémio, com um valor simbólico, e que é tão forte como o Gouncourt. É quase uma excepção mundial e eu fui o contemplado!”.

Pierre Lemaitre, o autor de "Até nos vermos lá em cima", sente-se agora mais escritor depois do Prémio Goncourt 2013.