Emissão Renascença | Ouvir Online

Arcebispo Louis Sako

“Assim não há futuro para os cristãos no Médio Oriente”

02 nov, 2011 • Filipe d'Avillez

Os cristãos no Iraque são vítimas de ataques por parte de "fundamentalistas, meros criminosos e grupos políticos", afirma o Arcebispo iraquiano Louis Sako.

“Assim não há futuro para os cristãos no Médio Oriente”
Os cristãos no Iraque são vítimas de ataques por parte de "fundamentalistas, meros criminosos e grupos políticos", e se a situação se mantiver como está na região, não há futuro para os cristãos no Médio Oriente. A denúncia é do Arcebispo de Kirkuk. De passagem por Portugal, monsenhor Louis Sako dá uma entrevista à Renascença em que fala ainda da "Primavera Árabe", afirmando que os países que estão a passar por mudanças estão a cair nas mãos dos islamistas.

Se a situação se mantiver como está, não há futuro para os cristãos no Médio Oriente, afirma o Arcebispo de Kirkuk, monsenhor Louis Sako, apontando os exemplos dos países da Primavera Árabe, que estão a cair nas mãos dos islamistas.

“Se a situação continuar assim no Médio Oriente, acho que os cristãos vão partir. Estamos a ver na Tunísia, no Egipto, na Líbia que os islamistas estão a tomar o poder”, afirma.

Mas o pessimismo não se fica pelo futuro dos cristãos. Também os muçulmanos estão em risco se não lutarem contra estas tendências. “Estão a destruir o Islão com este fundamentalismo. O Islão devia integrar-se na sociedade moderna, devia ser uma religião aberta. Não há futuro para o Islão se eles mantiverem este integralismo ao estilo do século VII”, considera.

O prelado iraquiano encontra-se em Portugal a convite da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre para dar uma série de conferências sobre a situação dos cristãos no seu país, que têm sofrido diversos ataques desde a queda do regime de Saddam Hussein há quase oito anos.

O ataque mais grave foi o atentado numa igreja em Bagdade, que vitimou mais de 40 fiéis que se encontravam em plena missa. Monsenhor Sako recorda esse dia com pesar: “Estávamos a ver tudo na televisão e ficámos chocados”, recorda.

Fundamentalistas, criminosos e políticos
A situação em Bagdade melhorou um pouco desde o ataque à igreja em Bagdade, mas, na sua diocese de Kirkuk, que abrange a cidade de Mosul, os raptos e assassinatos continuam a ser habituais. “Em Setembro, duas igrejas foram atacadas. Temos muitos casos de raptos, pessoas que são libertadas mediante o pagamento de um resgate altíssimo. Tivemos um caso de um médico que foi raptado e torturado durante dois meses, mas nunca abandonou a fé. Deixaram-no na rua, meio morto, mas sobreviveu”, conta monsenhor Louis Sako.

No meio da diversidade étnica e religiosa do Iraque, o arcebispo não tem dúvidas sobre quem está por detrás dos ataques aos cristãos: “Há três grupos: há os fundamentalistas, que não aceitam ninguém que não seja muçulmano; há os criminosos, que querem pedir resgates e ganhar dinheiro; e há os políticos que querem o apoio dos cristãos e provocam estes ataques para lhes dar a entender que, sem a sua protecção, estão perdidos”, afirma.

A verdade é que os cristãos continuam a ser um alvo fácil. Com uma grande diáspora no ocidente, são vistos como fonte de dinheiro para resgates e, ainda por cima, são das poucas comunidades que não possuem milícias, nem outras formas de defesa. Esta hipótese, aliás, é liminarmente rejeitada pela hierarquia cristã: “Não é normal para um cristão recorrer à violência. Mesmo os muçulmanos estão sempre a dizer que os cristãos são pacíficos e perdoam. Este testemunho é muito valorizado”, defende o arcebispo, que rejeita também a ideia da criação de uma região autónoma para os cristãos, classificando-a como uma “armadilha”.

Primavera Árabe
É com nítida preocupação que o arcebispo Louis Sako vê os desenvolvimentos da chamada "Primavera Árabe". Se, por um lado, se mostra consternado com os ataques aos cristãos no Egipto e a subida ao poder dos islamistas, por outro lamenta também uma certa colagem da Igreja aos regimes ditatoriais, sobretudo na vizinha Síria.

“O papel da Igreja é o de apoiar as exigências da população por liberdade, justiça e não tomar partido por um regime em particular. Se não, se a situação mudar, os cristãos serão colocados de fora, porque estavam com o regime. Como Igreja, não apoiamos a violência - isso é outra coisa. Somos a favor de manifestações pacíficas e democracia. Mas que tipo de democracia? O que eles chamam 'democracia' não funciona com o Islão como religião de Estado. Talvez a Igreja possa ajudar as pessoas a perceber o que é a democracia. Nós estamos aqui para dar equilíbrio, não para apoiar um grupo contra outro”, considera.

Monsenhor Louis Sako está em Portugal durante os próximos dias e profere conferências em Lisboa - amanhã, pelas 17h00, na Igreja do Sacramento, no Chiado -, em Braga e em Fátima.