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Francisco foge ao previsto para enunciar um "quase palavrão"

25 jul, 2013 • Filipe d’Avillez

Perante uma multidão que o ouviu no Brasil, o Papa lançou "um apelo às autoridades públicas e a todas as pessoas de boa vontade", porque "ninguém pode permanecer insensível às desigualdades que ainda existem no mundo".

Francisco aproveitou a visita a uma favela no Rio de Janeiro, esta quinta-feira, para pedir ao povo brasileiro que dê ao mundo uma lição de solidariedade. Quando o fez, manteve o que o tem caracterizado - fugir ao que está previsto.

O Papa tinha um discurso preparado para ler num campo de futebol situado na favela da Varginha. Num primeiro momento, começou por seguir o que ia escrito. "O povo brasileiro, sobretudo as pessoas mais simples, pode dar para o mundo uma grande lição de solidariedade, que é uma palavra frequentemente esquecida ou silenciada, porque é incómoda." Logo de seguida, fugiu por instantes ao que ia escrito para improvisar brevemente e contestar os que têm medo de pronunciar uma palavra e de exercer o que ela contempla: "Solidariedade quase parece um palavrão".

Mas não é. Sempre que o Papa pronunciou o termo, ergueu bem a voz. E na sequência de várias semanas em que o Brasil tem sido abalado por manifestações, algumas violentas, contra a corrupção e os gastos excessivos com grandes eventos, Francisco enfatizou a necessidade de se olhar pelos mais desfavorecidos.

"Não se cansem de trabalhar por um mundo mais justo e mais solidário. Ninguém pode permanecer insensível às desigualdades que ainda existem no mundo. Cada um, na medida das próprias possibilidades e responsabilidades, saiba dar a sua contribuição para acabar com tantas injustiças sociais", afirmou. 

"Nenhum esforço de 'pacificação' será duradouro, não haverá harmonia e felicidade para uma sociedade que ignora, que deixa à margem, que abandona na periferia parte de si mesma. Uma sociedade assim simplesmente empobrece a si mesma; antes, perde algo de essencial para si mesma. Lembremo-nos sempre: somente quando se é capaz de compartilhar é que se enriquece de verdade; tudo aquilo que se compartilha se multiplica. A medida da grandeza de uma sociedade é dada pelo modo como esta trata os mais necessitados, quem não tem outra coisa senão a sua pobreza", acrescentou o Papa. 

Ao agradecer a hospitalidade de que foi alvo, Francisco sustentou que o cuidado com o outro compensa sempre. "Quando somos generosos acolhendo uma pessoa e partilhando algo com ela - um pouco de comida, um lugar na nossa casa, o nosso tempo -, não ficamos mais pobres, mas enriquecemos."

Numa altura em que no Brasil se discute a legalização do aborto em certas circunstâncias, o Papa também deixou algumas mensagens para quem governa o país, referindo alguns dos pilares essenciais para o verdadeiro desenvolvimento do homem - a vida, "que é dom de Deus, um valor que deve ser sempre tutelado e promovido", a família, a educação integral, a saúde e a segurança.

As últimas palavras do Papa foram reservadas de forma especial para os jovens, motivo principal da sua visita ao Brasil e participação na Jornada Mundial da Juventude. A estes, o Papa pediu que nunca percam a esperança e que não se deixem desanimar com a corrupção que encontram no mundo e entre os mais velhos.

"Vocês, queridos jovens, possuem uma sensibilidade especial frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção, com pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio benefício. Também para vocês e para todas as pessoas repito: nunca desanimem, não percam a confiança, não deixem que se apague a esperança. A realidade pode mudar, o homem pode mudar. Procurem ser vocês os primeiros a praticar o bem, a não se acostumarem ao mal, mas a vencê-lo."