17 mai, 2015
Duas arquitectas estão a desenvolver um projecto para combater a tendência de desertificação do bairro histórico do Castelo, em Lisboa, requalificando esta zona antiga da capital e procurando um equilíbrio entre a ocupação por moradores e turistas.
Rodeadas pelas muralhas do Castelo de São Jorge, as construções antigas das ruas estreitas do bairro têm vindo, nos últimos anos, a perder moradores e a transformar-se em albergues para turistas, fazendo desaparecer o espírito bairrista, que agora se tenta revitalizar, através do projecto "Moralá Castelo".
A iniciativa da associação Fundo de Arquitectura Social (FAS) surgiu para solucionar os problemas urbanos deste bairro, entre eles a crescente desertificação e a degradação dos edifícios, por via da arquitectura, disse à agência Lusa a arquitecta Raquel Morais, referindo que o trabalho está a ser desenvolvido com a colaboração de um `designer` e de uma socióloga.
"Há muita gente que vai saindo, as pessoas de idade vão desaparecendo, não há pessoas novas a entrar. Ao mesmo tempo há muitos prédios ainda por reabilitar e que estão degradados, [...] e esses prédios podem ser uma oportunidade para trazer novas pessoas", jovens e actividades de comércio tradicional, afirmou a arquitecta.
Através de visitas guiadas, o projecto "Moralá Castelo" proporciona aos turistas a descoberta do património e as histórias deste território, num percurso personalizado e alternativo pelos principais lugares do bairro, numa zona em que o Castelo de São Jorge é o monumento mais visitado, com o custo de 10 euros.
Ana Henriques, de 19 anos, acabou a escola e ficou desempregada. Conhece o bairro "na ponta da língua", foi lá que nasceu, cresceu e ainda vive. Actualmente, é guia local a convite das arquitectas do projecto.
Durante a visita guiada, a jovem explica que "a zona agora está pouco habitada, a população é toda envelhecida, mas nem sempre foi assim. Esta zona tinha bastante gente jovem, crianças e agora não, agora é um sítio muito envelhecido".
"Em 1996, houve uma reabilitação em que as pessoas saíram todas, foram realojadas por causa das obras, mas a maioria não voltou. Em dez anos, o Castelo perdeu cerca de 40% da população", relatou a jovem.
Comerciante há 46 anos, Natividade Sousa, de 66 anos, tem actualmente "a única mercearia do bairro", quando antigamente existiam seis, mas corre o risco de ter também de fechar portas, porque o proprietário do edifício, a quem paga uma renda, quer construir um hotel.
"A mercearia faz falta, porque, por enquanto, há muita gente de idade aqui", expressou a vendedora, que também vive no bairro do Castelo.
Firmino Barata, de 86 anos, morador do bairro, também se queixa que o querem despejar do prédio onde vive há 60 anos.
"Querem fazer um hotel, isto agora é só para hotéis. Quando vim para o Castelo moravam aqui duas mil e tal pessoas, presentemente moram cá 400 e tal ou 300 e tal", declarou o morador.
Em relação à ocupação dos turistas, a arquitecta Raquel Morais afirmou que "uma cidade, primeiro deve responder aos moradores e a quem lá vive".
"Se só quisermos responder à parte do turista, tudo o resto morre, deixa de fazer sentido. Não podemos fugir ao turismo, ele existe, temos é que o abraçar de uma forma correta e uma das formas é, por exemplo, tentar envolver o turista em várias actividades que podemos promover com as pessoas do bairro", explicou.
O projecto "Moralá Castelo" está também a fazer a reabilitação de um edifício degradado do bairro, utilizando-o como espaço comunitário aberto à população, onde são desenvolvidas diversas actividades, desde secções de cinema e oficinas de trabalhos manuais.