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Um cabeleireiro onde só paga quem pode

25 dez, 2014

Às quartas-feiras, entre as 10h00 e as 13h00, Sandra Possolo está no Beco do Rosendo como cabeleireira, "ouvinte, conversadora, e também um bocado psicóloga".

Um cabeleireiro onde só paga quem pode
No bairro da Mouraria, em Lisboa, há um cabeleireiro criado a pensar naqueles que passam mais dificuldades. Aqui, cada um paga o que pode e quem não pode não paga.

Num espaço da Associação Renovar a Mouraria, onde semanalmente crianças daquele bairro recebem apoio ao estudo, foi improvisado um cabeleireiro, que funciona às quartas-feiras das 10h00 às 13h00.

Tudo começou com uma banca na feira do Banco do Tempo, a que nessa edição "teve mais pessoas", a cargo de Sandra Possolo, que durante 25 anos foi cabeleireira num salão para senhoras na Baixa lisboeta.

Em declarações à agência Lusa, Sandra recorda a idosa que vivia no Largo da Severa, onde a feira decorreu, "que era muito raro sair de casa. Mas conseguimos que ela fosse à banca cortar o cabelo. Ela chegou, conversei com ela - porque nós nisto também queremos saber histórias - e a senhora quando saiu ia completamente diferente", contou.

A auto-estima "aumentou" e era notória a "necessidade de conversar". Foi depois dessa experiência, com pessoas "sem possibilidades de ir a um cabeleireiro 'normal'", que Sandra Possolo propôs à associação avançar com o projecto do cabeleireiro solidário.

Em Setembro, Natércia Bernardino, desempregada com dois filhos, foi a primeira cliente. O filho mais novo desta moradora da Mouraria é uma das crianças que diariamente, das 16h00 às 20h00, usufruem do apoio ao estudo na sala onde a mãe corta o cabelo.

Uma sala acolhedora
Sandra Possolo explica que ali, além do apoio ao estudo, "por vezes há aulas de alfabetização e jantares de grupo, quando o grupo é grande e não cabe a cafetaria".

"É uma sala multiusos", e, por ser "a mais acolhedora", é também ali que está instalado o cabeleireiro.

Para já, os cortes de cabelo são o único serviço prestado. Se houvesse mais condições, Sandra garante que também "pintava, fazia madeixas e permanentes".

Os donativos irão servir "para melhorar o projecto e poder proporcionar outro tipo de trabalhos". Mas antes de tudo para poderem comprar uma calha [de lavagem]. "Água temos, mas não temos a calha para o cliente pôr a cabeça para lavar. Pedimos sempre à pessoa para vir de cabeça lavada, borrifo o cabelo e corto", explicou.

Quem quiser usufruir deste serviço deve ser morador no bairro e ligar para a associação para marcar o corte de cabelo. "Isto é para pessoas do bairro, porque somos uma associação local. Não quer dizer que se alguém do bairro ao lado vier cá eu diga que não", disse.

Além de atender no espaço da Associação Renovar a Mouraria, Sandra Possolo também faz cortes ao domicílio, a pensar em quem não pode sair de casa. E deixa o aviso: "se houver em casa alguém que não possa às quartas e se eu tiver oportunidade noutro dia da semana também o faço".

Às quartas-feiras, Sandra Possolo está no Beco do Rosendo como cabeleireira, "ouvinte, conversadora, e também um bocado psicóloga".