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Perguntas e respostas sobre o futuro da Igreja

20 fev, 2013

A incapacidade é um critério para resignar? A resignação de Bento XVI implica mudanças? É de esperar que o próximo Papa seja mais novo? Estas e outras perguntas foram colocadas pelos ouvintes e tiveram resposta numa emissão especial da Renascença.

Perguntas e respostas sobre o futuro da Igreja
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A vaticanista Aura Miguel e o Cónego João Aguiar, director do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais da Igreja, estiverem em estúdio na Renascença para responder a dúvidas dos ouvintes e leitores relativamente à resignação do Papa e ao futuro da Igreja. 


[Questão de Paulo Monteiro, do Porto] O carácter vitalício do exercício do pontificado pode ser posto em causa em nome de algum tipo de "incapacidade" para o exercício do cargo? 
[Cónego João Aguiar Campos] Os próprios cardeais ficaram surpreendidos. Um jornalista do 'El País' comparou o espanto com o de João XXIII quando anunciou a convocação de um concílio. O Papa não está ali como um senhor temporal a exercer uma profissão, ou sequer um Governo, como um rei ou presidente. Está numa missão e colocado em consciência perante Deus, a quem tem de dar contas diariamente e no final. Bento XVI teve este extraordinário gesto de humildade e de fé, mas esta é uma incapacidade muito capaz. É capaz de uma extraordinária lucidez. Eu gostava de ter permanentemente esta incapacidade.

[Aura Miguel] Há antecedentes para este gesto. Quando foi a guerra, Pio XII terá dito que abdicava caso o Vaticano fosse invadido pelos nazis. Paulo VI e João Paulo II fizeram o mesmo para o caso de ficarem dementes.

[Questão de um leitor não identificado de Vieira do Minho] A resignação traduz um sinal de mudança?
[Aura Miguel] A partir de agora não pode ficar igual. Vai ficar para a história esta grande decisão. A sabedoria da Igreja aponta os 75 como idade a partir da qual os bispos devem apresentar a resignação. Para o conclave são 80 anos. Quem sabe se isso vai ser reavaliado? Vai implicar mudanças. Mas nós muitas vezes olhamos as coisas com uma perspectiva de poder, de força física. Claro que a força física está em jogo, mas está também a certeza de que Deus cuida da Igreja. Não é o medo que o leva a resignar.

[Questão de Luís Amadeu, de Lisboa] A Igreja não deveria ser mais interventiva, usar a sua força e o seu poder para, por exemplo ,mediar conflitos, estar mais presente em situações vulneráveis que o mundo vive neste momento?
[Aura Miguel] Essa intervenção nos conflitos, por exemplo, já se faz há muito tempo. Basta olhar para a diplomacia da Santa Sé, considerada a melhor do mundo, que tem uma grande rede espalhada pelo mundo. Recordo que ao longo da história podemos ver momentos importantes de mediação de conflitos. Houve mesmo a nível jurídico internacional uma mediação entre o Chile e a Argentina e quem mediou foi o Cardeal Angelo Sodano e foi um grande sucesso. O nosso cardeal Manuel Monteiro de Castro, quando estava em El Salvador, ajudou a mediar, não oficialmente, o conflito entre o Governo e a guerrilha.

[Cónego João Aguiar Campo] A Igreja não é chamada a fazer política, mas o silêncio seria cobardia onde está em causa a dignidade do homem. A Igreja chama os leigos para a política e quer estar presente no mundo. O homem é o caminho da Igreja e a Igreja é a companheira do homem nas suas alegrias e esperanças.

[Questão de Margarida dos Anjos, de Ponte de Lima] É de esperar um Papa mais jovem? Este é um factor essencial para uma eventual renovação da Igreja?
[Aura Miguel] Tendencialmente, parece que podemos esperar um Papa jovem. É provável que se espere um Papa mais jovem. Alguns cardeais têm 78 anos ou mais e tudo indica que não serão eleitos.

[Cónego João Aguiar Campos] O entusiasmo e a paixão são óptimos motores, mas a fé e a inteligência são imprescindíveis lemes. Precisamos de alguém com frescura de fé, física e intelectual, independentemente da idade.

[Questão de Clara Costa Duarte] Olhando para o legado destes dois últimos Papas, que aspectos podem ser mais importantes para iluminar os caminhos futuros dos homens e da Igreja?
[Cónego João Aguiar Campos] O legado destes Papas são os seus escritos e a sua vida. Olhando para os documentos emanados por cada um deles, sentimos um e outro, de forma distinta, mordidos e picados por esta urgência de que já falava São Paulo: 'Que será de mim se não evangelizar?'.

[Aura Miguel] Quando o Papa foi à Alemanha, o mote era 'sem Deus não há futuro'. Cristo é o redentor do homem. João Paulo II centrava todo o seu pontificado nesta certeza e Bento XVI fez o mesmo. 'O que é que ponho em primeiro lugar: eu ou Deus?' Se é Deus, a vida tem outro sabor.