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Rolêzinhos no Brasil. Arrastão ou apartheid?

21 ago, 2014 • João Almeida Moreira, em São Paulo

A direita classificou-os de arrastão, a esquerda falou em apartheid à brasileira. Como os grandes centros comerciais conseguiram obter autorização para seleccionar clientela, o fenómeno migrou para parques públicos e sossegou.

No Brasil, os rolêzinhos estiveram na ordem do dia no final do ano passado quando a justiça deferiu um pedido dos grandes centros comerciais do país a impedir os encontros nos seus estabelecimentos.
 
À época a opinião pública dividiu-se. De um lado, a ala mais à direita dos formadores de opinião considerava que, de facto, um rolêzinho não passava de um arrastão, a prática de invadir uma praia e roubar tudo o que aparece pela frente, num espaço fechado. Do outro, a ala mais à esquerda de colunistas, os que consideraram a decisão da justiça mais um episódio do chamado “apartheid à brasileira”.
 
Das páginas dos jornais, o fenómeno chegou à política, com o oposicionista PSDB, de centro-direita, a criticar os rolêzinhos na mesma proporção que o PT, de centro-esquerda e no poder, defendia o direito de reunião dos jovens da periferia das grandes cidades, afinal de contas, boa parte do seu eleitorado tradicional. E chegou também à universidade, onde sociólogos analisaram a tradicional distinção de classes do país.
 
Os rolêzinhos (traduzíveis por ‘voltinha’) são então, basicamente, encontros em shoppings das grandes cidades com milhares de jovens das periferias. Combinados pela internet reúnem os “famosinhos”, adolescentes com muitos fãs ganhos no Facebook, normalmente rapazes porque nos rolês é mais ao macho que cabe o papel de objecto sexual, e esses mesmos fãs.
 
Os primeiros ganham presentes dos segundos, e os segundos beijos dos primeiros. Todos, famosinhos e fãs, mostram em público as últimas aquisições, de ténis de marca a aparelhos de dentes coloridos, usam uma gíria própria e cantam funk carioca, no caso do Rio de Janeiro, ou funk ostentação, a versão paulistana, onde em vez de temas como crime e favela, são os bens de consumo a matéria das letras.
 
Embora não seja o propósito da reunião, consome-se álcool e droga nos rolêzinhos o que leva a tumultos como por exemplo à prática dos “bondes do rolê”, isto é, quando uns 10 ou 15 jovens começam a correr desordenadamente e levam milhares atrás – nessas ocasiões, de facto, há o risco de brigas e assaltos.
 
Diz quem conhece e vive na periferia de São Paulo que os rolês, no fundo, sempre existiram,  como atesta o tema “Chopis Centis” da banda de Guarulhos, nos limites da megalópole,  Mamonas Assassinas, cujos membros faleceram entretanto em desastre aéreo em 1996, que já usa o termo nos início dos anos 90.

As diferenças é que nessa época não existiam redes sociais e por isso os ajuntamentos eram de pouca gente e os jovens da periferia não tinham dinheiro para chegar ao centro da cidade, situação que mudou nos últimos anos com a chegada de 50 milhões de brasileiros à sociedade de consumo, ou seja, aos centros comerciais.