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Manuel Pinto
Opinião de Manuel Pinto
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Spotlight, um caso que já deu frutos

01 fev, 2016 • Opinião de Manuel Pinto


Sabe bem ouvir o atual cardeal de Boston, Sean O’Malley afirmar que “os media ajudaram a Igreja a ser um lugar mais seguro para as crianças (…) obrigando-nos a lidar com o abuso sexual por parte do clero”.

Em 6 de janeiro de 2002, o jornal The Boston Globe, através da sua equipa Spotlight, começava a publicar os resultados de longos meses de investigação sobre pedofilia e abusos sexuais do clero na arquidiocese local. Foram dias terríveis para os católicos dos Estados Unidos e para a Igreja, perante a multiplicação de casos escondidos que, com a iniciativa dos jornalistas do Globe, saltaram para a praça pública. O escritor e comentador católico George Weigel chamou a este ‘Spotlight’ “a longa quaresma de 2002”.

Desde então, muita água correu. A Igreja, passado o estupor inicial, adotou uma política de tolerância zero à escala global, apurou a formação do clero e de outros agentes de pastoral, indemnizou milhares de vítimas dos abusos (só nos Estados Unidos, mais de meia dúzia de dioceses foram à falência por isso). E ainda recentemente o Papa Francisco não só criou uma Comissão Pontifícia para a Proteção das Crianças como tomou medidas para a responsabilização de bispos que encubram casos desta natureza.

O filme “O caso Spotlight”, do realizador Tom McCarthy, que se encontra atualmente nas salas de cinema, constitui um trabalho notável sobre a investigação jornalística que desembocou naquela edição de janeiro de 2002 do Boston Globe e de muitas outras que se lhe seguiram.

O resultado pode dizer-se que é um trabalho sério, que engrandece o jornalismo e o reconcilia consigo mesmo, com o seu papel histórico e com a sociedade. O trabalho de equipa sem cedências ao vedetismo; a direção e coordenação de cada passo das investigações; a gestão das responsabilidades do próprio jornal no silenciamento do problema dos abusos sexuais; a preocupação pela defesa dos direitos das crianças vítimas dos abusos; e a não concessão ao sensacionalismo são atributos desta representação de uma profissão em crise aqui resgatada pelo cinema (como já o fora com a atribuição do prémio Pulitzer por serviço púbico, em 2003).

Mais do que expor os abusadores ou as suas vítimas, esta obra de McCarthy confronta-mos com a obstinação de um sistema clerical em silenciar e perpetuar o silêncio das vítimas e dos próprios jornalistas. Neste sentido, sabe bem ouvir o atual cardeal de Boston, Sean O’Malley afirmar que “os media ajudaram a Igreja a ser um lugar mais seguro para as crianças (…) obrigando-nos a lidar com o abuso sexual por parte do clero”.

Pode dizer-se que Spotlight, como filme, é apenas metade de uma história triste e complexa. Felizmente existiu e ainda bem que já deu frutos.

Comentários
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  • Roberto Moreno
    01 fev, 2016 Lisboa 17:44
    Que tal um Spotlight, no "Jornalismo" da Renascença? - O País e o mundo agradece. - Por exemplo: à 18 de Abril de 2011, às 12h. o Sr. FRANCISCO SARSFIELD CABRAL, recebeu Roberto Moreno, presidente da Fundação Geolíngua, o qual foi-lhe apresentado o projeto ENDOECONOMIA, no âmbito de uma Globalização mais justa e auto-sustentável. - Foi solicitado ao jornalista Francisco, para que o mesmo desse a sua opinião. - Entretanto, nunca obtive qualquer comentário sobre a proposta que lhe foi feita, ao vivo e documentado, sobre a participação da Renascença no projeto Endoeconomia (ver no Google esta palavra) - Meses após, ao solicitar-lhe uma resposta, o "jornalista" disse-me que tinha remetido à outro jornalista, ... e assim por diante ..., até os dias de hoje. - Entretanto, continuo à disposição da Renascença, e não só, para lhes narrar todo o conteúdo da reunião, tida com o Sr. Francisco Cabral. - Quem sabe é desta - Oremos!!
  • Pedro Ribeiro
    01 fev, 2016 LISBOA 12:31
    Quando li o título temi que viesse mais um texto sobre vitimização da Igreja. Mas tenho de o parabenizar. Porque está centrado no que sendo mínimo é o que resta: DESCULPEM (estou envergonhado)!.