"Ligar o aquecimento está fora de questão." Bairro de Viseu à espera de Marcelo e Costa
31-03-2023 - 12:08
 • Liliana Carona

Presidente da República e primeiro-ministro visitam esta sexta-feira, as obras no Bairro Municipal de Viseu, no âmbito da iniciativa promovida pelo Governo "PRR em Movimento". Atualmente, os moradores do bairro pagam rendas muito baixas: algumas oscilam entre um e nove euros mensais, mas a requalificação em curso está a deixar os moradores apreensivos. A maioria é população idosa, tem parcas reformas e teme subida dos preços.

A reabilitação do Bairro Municipal de Viseu está em curso, num investimento global de 6,8 milhões de euros, com recurso a fundos comunitários, designadamente do PRR.

Apesar de ainda estarem a decorrer as obras no Bairro Municipal de Viseu, há quem já tenha inaugurado a nova casa. Maria Sampaio, 51 anos, mostra o T4 a cheirar a novo, enquanto revela pagarnove euros de renda, há mais de 30 anos, “quando foi para ali morar”.

Com salário incerto e a trabalhar a horas como empregada doméstica, Maria Sampaio tem dois filhos a cargo. “É muito difícil gerir o orçamento. Por exemplo, o aquecimento central: tenho a certeza de que nunca o vou ligar”, lamenta, justificando-se: “Não vou usar, como é obvio, porque não há dinheiro para pagar o gás do aquecimento."

"As casas estão recuperadas, mas as dificuldades são as mesmas. A gente, no inverno, vai para a cama mais cedo. É assim que fazemos, tem de ser. Eu não tenho intenções de o ligar”.

Outra preocupação de Maria Sampaio é haver uma subida da renda. “A casa foi recuperada, tenho consciência que vai subir, a minha filha está a pagar 425 euros por um T2, aqui em Viseu...”, conta

"É sempre massa ou arroz com frango... Corto no peixe”

Ao lado, a vizinha Maria Teresa, de 79 anos, com uma reforma de 417 euros mensais, também não quer saber do aquecimento central. “Também não vou ligar. Vivo há 56 anos aqui. É um T2, pago um euro e qualquer coisa, mas não sei o que vou pagar agora.

"Tenho 417 euros de reforma, toda a vida fui empregada de armazém. Só num bairro municipal conseguia viver. Foi uma vida complicada, fiquei viúva cedo, só com os meus filhos”, conta Maria Teresa, não escondendo apreensões: “Tenho um bocado de receio, mas esperamos bem que não aumentem a renda. Isto é um bairro de pobres. Ainda hoje fui ao Pingo Doce e não trouxe nada. É sempre massa ou arroz com frango... Corto no peixe”, sublinha a moradora.

Outra moradora, Adelaide Gaspar, 62 anos, também partilha esse sentimento. “Neste momento, pagamos, um euro e qualquer coisa, é normal que subam as rendas. Mas não vão aplicar uma renda que eu não possa pagar."

"O meu rendimento não chega a 300 euros, não podemos ir roubar. As coisas estão a subir imenso. Tenho o meu filho que me ajuda, é um encargo muito grande. Tudo o que eu precisar, ele é que me ajuda e traz-me tudo. Ligar o aquecimento está fora de questão a gente não ganha para gás. Dá para cozinhar e tomar banho e já é bom. Não podemos ter grandes vícios”, diz Adelaide Gaspar.

Logo ao lado, o vizinho Ricardo Gomes, 57 anos, sabe que vai ter a visita de Marcelo e Costa, mas não tem muito para lhes dizer: “Trabalhei em pneus a vida toda, tenho 400 eurosde reforma. Não tenho nada para dizer aos governantes, não fazem nada por nós, tanto dinheiro que vem e desaparece."

Rendas atualizadas de acordo com rendimentos

O administrador da empresa municipal de habitação social - Habisolvis, João Pedro Silva, diz à Renascença que "as rendas estão congeladas”.

“Só atualizamos as rendas depois da reabilitação e de acordo com os rendimentos das pessoas”, garante o responsável.

Inaugurado em 1948, o Bairro Municipal de Viseu começou a ser reabilitado no final de 2020: 40 fogos para as famílias que ali residiam e mais 38 fogos para famílias de baixo rendimento, com rendas abaixo dos valores do mercado, “por exemplo, para um T2, valores abaixo dos 300 euros”, destaca João Pedro Silva.

Já as rendas para as famílias que já ali residiam “são sempre em função do rendimento, no âmbito do regime de arrendamento apoiado. O valor mínimo da renda da habitação social é 1% do indexante dos apoios sociais. Os outros casos implicam sempre uma taxa de esforço face aos rendimentos que têm”, aponta o administrador da empresa municipal de habitação social.

As obras estavam previstas serem terminadas este verão, mas, “é possível que se prolonguem por mais tempo”.