Pobreza, risco de vida ou negligência? Porque retira a justiça o bebé a uma mãe de Matosinhos
25-03-2017 - 13:18

Mãe que não dava de mamar nem mudava as fraldas ficou sem o filho. Jovem de 23 anos tenta recuperar a criança sem sucesso. Protecção de Menores entende que a recém-nascida corre risco de vida.

Há mais de um mês que uma jovem mãe de Matosinhos tenta recuperar o filho recém-nascido, colocado numa casa de acolhimento pela Comissão Nacional de Protecção das Crianças e Jovens em Risco (CNPCJR, antiga CPCJ). O bebé nasceu em Fevereiro, no Hospital Pedro Hispano, em Matosinhos. Foi retirado à mãe, uma estudante de 23 anos, alegadamente porque esta não acordava de noite para dar de mamar. Nem sabia mudar fraldas.

A comissão de protecção de menores de Matosinhos interveio, a pedido do hospital. A mãe assinou um consentimento a permitir o acolhimento do filho. Mas, um dia depois, quis voltar atrás na sua decisão e recuperar o bebé. Sem sucesso.

No debate do programa Em Nome da Lei deste sábado, o advogado da mãe promete apresentar queixa-crime porque considera que está em causa “uma situação de sequestro”. Aníbal Pinto explica que o bebé tinha de ser entregue à mãe, a partir do momento em que ela revoga a decisão de o institucionalizar. Em alternativa, a CNPCJR tinha de decretar “uma situação de perigo comprovado”, o que não foi feito.

José Matias de Sousa, director executivo da CPCJ, diz que o procedimento da estrutura de Matosinhos “foi ética e deontologicamente correcto, tendo de resto sido validado pelo Ministério Público”. No entanto, admite que a CPCJ de Matosinhos “nunca chegou”, de facto, “a declarar a situação de perigo, uma vez que a mãe a mãe assinou o consentimento”.

José Matias de Sousa diz que a CPCJ foi chamada pelo Hospital Pedro Hispano, cujo relatório médico é inequívoco “quanto fala em perigo de vida para o bebé”. Recusa dar mais detalhes, alegando que “não é médico e o processo está em segredo de justiça”.

A CPCJ nega que as difíceis condições económicas em que vive a mãe do bebé tenham pesado na decisão de lho retirar. “Em nenhuma circunstância a pobreza pode ser justificação”, garante José Matias de Sousa.

A argumentação da CPCJ é contestada pelo advogado da mãe. Aníbal Pinto sublinha que a sua cliente vive com mãe, sobrevivendo ambas com uma pensão de pouco mais de 300 euros. O advogado afirma que “em situações de carência, o Estado dá às famílias um subsídio de 30 euros, mas às instituições que fazem o acolhimento das crianças paga 800 euros. Por isso, há quem suspeite da existência de um negócio do acolhimento.”

Aníbal Pinto afirma que a Comissão de Protecção de Matosinhos “não defendeu o superior interesse da criança quando separou um recém-nascido da mãe num período fundamental para a vinculação”. A opção correcta, diz, “se havia perigo, era encontrar uma casa de acolhimento onde mãe e filho pudessem ficar juntos”.

O advogado argumenta ainda que o bebé já está perfilhado e que “o pai também reclama o bebé e tem condições para o acolher”.

A CPCJ “nega que o pai tenha reclamado a criança. E admite que também ele possa não ter condições para ficar com o filho”. O advogado Aníbal Pinto desmente e diz, “que todos os pais beneficiam de uma presunção de capacidade, a não ser que tenham sido sinalizados, o que não aconteceu”.

A advogada de direito da família Cristina de Sousa diz que casos como este têm de ser abordados “com calma e ponderação”, até porque há aspectos do caso que estão em segredo de justiça. A jurista “não acredita que perante um caso tão delicado, as entidades de protecção não tenham actuado no estrito cumprimento da lei”.