Em novembro do corrente ano realizam-se eleições intercalares no Congresso federal dos EUA. Todos os lugares da Câmara dos Representantes e um terço do Senado vão a votos. Todas as previsões apontam para que o partido democrático deverá perder as curtíssimas maiorias que detém nessas duas câmaras, que passarão a ter maiorias do partido republicano.
Não é raro que o partido do presidente americano perca a maioria no Congresso a meio do seu mandato. O problema não é esse: o grave problema está em que a democracia americana atravessa uma fase extremamente perigosa. Por outras palavras, está em risco uma democracia que não foi posta em causa durante mais de dois séculos (se excetuarmos a guerra civil de 1861-1865), ou seja, desde a independência dos EUA. Ninguém concebe aquele país sem o associar à democracia.
Os eleitores americanos estão divididos como nunca no passado. 60% dos militantes partidários consideram que os membros do outro partido representam uma ameaça para o país. Começa a falar-se no perigo de uma guerra civil.
Não é uma fantasia - em 6 de janeiro do ano passado tivemos uma amostra preocupante do que pode tornar-se uma guerra civil. Nessa altura centenas de apoiantes de Trump invadiram o Capitólio (onde funcionam as duas câmaras do Congresso federal), tentando impedir a confirmação da vitória eleitoral de Joe Biden. Trump não travou essa invasão, que fez mortos e feridos.
Trump não apenas teve palavras simpáticas para os invasores como manteve inalterada a sua absurda posição, segundo a qual a vitória na eleição presidencial de 2019 foi dele e não de Biden. A eleição teria sido “roubada”.
Não existe qualquer prova de fraude eleitoral. Trata-se simplesmente de recusar perder, o que não é aceitável numa democracia. O pior é que 70% dos que votaram em Trump continuam hoje a acreditar nessa mentira grotesca.
O semanário britânico “The Economist”, que tem uma importante redação no EUA e goza nesse país de considerável influência, considera que a captura do partido republicano por Trump é lamentável. Mas acrescenta não ser fatal que Trump se recandidate; muito dependerá dos resultados que os seus protegidos alcançarão nas eleições de novembro.
Parece demasiado optimismo da parte do “Economist”. Sabe-se que foram muito poucos os políticos republicanos que ousaram contradizer Trump. Vários dos que o fizeram foram expulsos do partido, além de terem recebido ameaças de morte e sofrido enxovalhos. Outros abandonaram a política.
Ora, não se vislumbra como pode uma democracia funcionar se quem perde eleições não reconhece a derrota.