Governo diz que simulação do Exército sobre Almaraz não tem “adesão à realidade"
16-05-2017 - 17:03

Simulação do Exército, avançada esta terça-feira pela Renascença, está desactualizada, diz o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente.

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O presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), Nuno Lacasta, diz que as conclusões do relatório do Exército, que prevê os efeitos de um acidente grave na central nuclear de Almaraz, não têm “adesão à realidade tecnológica” da infra-estrutura espanhola. É a primeira reacção do Governo à notícia avançada esta terça-feira pela Renascença.

Cerca de 800 mil pessoas em Portugal podem ser afectadas pela radioactividade caso ocorra um acidente grave na central nuclear de Almaraz, em Espanha, revela uma simulação feita pelo Exército em 2010 a que a Renascença teve acesso.

A simulação, feita pelo Elemento de Defesa Biológico, Químico e Radiológico do Comando das Forças Terrestres a partir de um programa da Nato, tem como base um cenário idêntico ao acidente de Chernobyl, em 1986 – o rebentamento de um reactor, seguido de incêndio.

Em audição na comissão parlamentar de Ambiente, Nuno Lacasta recusa qualquer semelhança de cenários entre as centrais nucleares de Almaraz e Chernobyl. “A central nuclear de Almaraz, as suas características, incluindo o seu ‘upgrade’ após [o acidente nuclear em] Fukushima [no Japão, em 2011], matéria que não tenho visto referida, não é, nem de longe nem de perto, comparável à central de Chernobyl. Nem de longe nem de perto”, disse.

“Não me parece que as conclusões do relatório tenham adesão à realidade tecnológica de Almaraz", afirmou o presidente desta agência do Ministério do Ambiente.

Na sequência da notícia da Renascença, o coordenador do Movimento Ibérico Antinuclear (MIA) pediu, a título pessoal, a demissão do ministro do Ambiente, João Matos Fernandes.

Armazém de resíduos é apropriado

O presidente da APA defendeu que é apropriada a construção de um armazém de resíduos nucleares na central espanhola de Almaraz, assegurando que Portugal vai continuar a acompanhar o processo.

Nuno Lacasta afirmou que face à acumulação de combustível nuclear nas piscinas dos reactores da central nuclear, situada junto ao Tejo e a cerca de 100 quilómetros da fronteira portuguesa, faz com que esteja a ser atingido "o limite da capacidade de armazenamento".

Sem haver um sítio para onde seja enviado todo o combustível nuclear gasto das centrais nucleares espanholas, os locais de armazenamento têm que ser mesmo no complexo das centrais ou muito próximos, disse. Colocar o combustível num armazém onde esteja guardado a seco acarreta menos riscos do que deixá-los nas piscinas dos reactores, garantiu Nuno Lacasta.

O responsável da agência afirmou sem "a mais pequena dúvida" que assume "na plenitude" as conclusões do grupo de trabalho técnico que considerou adequada e segura a construção do armazém depois de um processo de avaliação de impacto transfronteiriço improvisado entre Portugal e Espanha.

Esse processo surge de um acordo entre os dois países atingido depois de Portugal ter apresentado queixa contra Espanha na Comissão Europeia por estar contra a construção do armazém sem avaliação de impacto ambiental.

"Não é um parecer 'nim', há matérias que carecem de aprofundamento, reconhecidas pelo regulador espanhol", reconheceu.

Nuno Lacasta reforçou que com este processo de avaliação 'ad hoc', Portugal teve acesso a mais informação do que teria acontecido se houvesse uma avaliação de impacto tradicional.

O presidente da APA afirmou que alguma da matéria analisada disponibilizada por Espanha é confidencial, mas disponibilizou-se para a discutir com os deputados à porta fechada.

Dos deputados, Lacasta ouviu dúvidas sobre como se pode considerar segura a construção do armazém apesar de se reconhecer que faltaram análises a cenários de acidente e aos seus eventuais impactos transfronteiriços.

O grupo de trabalho também reconhece que faltam análises à permeabilidade dos solos aos resíduos radioactivos a armazenar e a possibilidade contaminarem as águas do Tejo, que são usadas na central para arrefecimento.

Esses e outros estudos seriam precisos para tirar conclusões sobre impactos de acidentes na central, referiram os parlamentares, citando as conclusões e recomendações do grupo de técnicos constituído por Portugal.