Os populistas e a religião
26-05-2020 - 06:10

Trump e Bolsonaro têm como apoiantes os chamados cristãos evangélicos, fundamentalistas. Mas o percurso pessoal e político destes personagens nada tem de cristão, pelo contrário.

Os populistas, muitos deles ateus ou agnósticos, apoiam a religião - a cristã, não as outras. Na sua vida pessoal, financeira e sexual, estão longe daquilo que se costuma designar por moral cristã, mas mesmo assim atraem cristãos mal informados.

Trump e Bolsonaro, dois chefes de Estado populistas que não honram o cargo que ocupam, são um exemplo de oportunismo político. Uma das suas principais bases de apoio eleitoral destes políticos são os protestantes fundamentalistas, que leem a Bíblia textualmente.

O apoio de Trump a Israel e a Netanyahu, ignorando os palestinianos, tem a ver com essa leitura literal do Evangelho: as terras onde viveu Jesus Cristo eram judaicas (embora integradas no império romano), logo os muçulmanos devem ser expulsos delas. Faz lembrar os esclavagistas, que justificavam a escravatura nos EUA com passagens descontextualizadas do Antigo Testamento.

Trump veio agora exigir a reabertura das igrejas – mas ele não põe lá os pés, precisa é do voto dos chamados “evangélicos” para ser reeleito. Antes tinha tomado posição contra o aborto, depois de o ter defendido durante décadas. Também aqui não se trata de convicção, mas de eleitoralismo.

A fúria contra a imigração do presidente americano e as medidas cruéis que tomou contra refugiados e imigrantes, incluindo crianças, nada têm de cristão, pelo contrário. Mas travar a imigração nos EUA - um país de imigrantes... - rende votos.

Também está mais do que provado que Trump mente com enorme frequência. Há quem diga que ele acredita nas suas próprias mentiras, que começaram logo no início do seu mandato, quando proclamou que a cerimónia da sua posse tinha tido mais gente do que qualquer outra. As imagens demonstraram inequivocamente que tal não era verdade, mas Trump nunca o reconheceu.

Bolsonaro, um defensor da tortura e das ditaduras militares, surge como uma versão brasileira, em pior, do que é Trump. Este homem não quer saber do bem comum do país a que preside. Prefere promover os adversários do confinamento dos brasileiros, participando até (sem máscara) nas suas manifestações, o que tem levado a um forte aumento das mortes por covid19, que duplicam no Brasil cada duas semanas.

Foi divulgado há dias um vídeo de uma reunião ministerial presidida por Bolsonaro, que mostra o nível assustador do que ali se disse: palavrões, insultos, ameaças de prender juízes, mirabolantes teorias da conspiração, etc. Não há nessa reunião ministerial um mínimo de dignidade.

No Brasil, Bolsonaro está com a aprovação pública a descer, dizem as sondagens. Nos EUA Trump ainda pode aspirar a ser reeleito em Novembro. Veremos se os cristãos evangélicos abrem os olhos.