Controlo de gestão em PME
27-11-2023 - 06:00
 • Paulo Pardal

O tecido empresarial português, em geral, e as PME em particular, continuam a evidenciar sinais preocupantes de não acompanhamento dos "ventos de mudança"... São quatro as razões que parece poder explicá-lo.

O primeiro "choque" petrolífero em 1973, na justa medida das suas consequências em termos económicos, geoestratégicos, políticos e até socioculturais, determinou uma evolução significativa da (re)orientação das preocupações de gestão das organizações.

Aos "goldens thirties", que mediaram o fim da Segunda Guerra Mundial e o "choque", caracterizados pelo sucesso de políticas expansionistas, travejadas muitas vezes na insensibilidade ao primado da escassez dos recursos, sucederam "gloomy times", ainda em curso, reveladores da revisita consciente do mesmo, detonadora da incontornabilidade da superior relevância de métodos e critérios de avaliação de performances de matriz relativa: produtividade, competitividade, rendibilidade e afins.

É o advento da "Era do Controlo".

A instabilidade dos modelos de desenvolvimento e a incerteza quanto à evolução da envolvente da actividade empresarial, levaram a que o clássico processo de planeamento funcional, visando a optimização da eficiência na utilização dos recursos cedesse o passo a um processo sistémico com o objectivo da superior eficácia na afectação dos mesmos.

Como consequência, o controlo orçamental tradicional, de matriz financeira e vocação retrospectiva, evoluiu para um modelo circular de avaliação da performance, em torno de quatro referenciais - estratégia, tomada de decisão, comportamentos e sistemas de informação -, ao qual se convencionou denominar "controlo estratégico", cuja ferramenta pioneira e emblemática é o "balanced scorecard" de Robert Kaplan e David Norton, da Universidade de Harvard.

O tecido empresarial português, em geral e, as PME em particular, continuam, contudo, a evidenciar sinais preocupantes de não acompanhamento destes "ventos de mudança"... São quatro as razões que parece poder explicá-lo.

Em primeiro lugar, a dimensão. Mesmo num universo já objecto de segmentação prévia, a PME média portuguesa é mesmo pequena, reflexo natural da dimensão real dum País que tarda a saber lidar com isso mesmo, por um lado e, por outro, duma cultura empresarial que evidencia um factor de índole psico-socio-cultural atrofiante: o individualismo.

No domínio do controlo estratégico de gestão, tal facto não é estimulante da implementação de modelos com impacto relevante dados i) - o investimento necessário em infraestrutura tecnológica, ii)- o sobre esforço exigido aos recursos humanos que, nestas pequenas estruturas, se encontram quase sempre no limiar da plena utilização e iii) - a percepção, por parte do Empresário, do escasso valor criado pelo(s) modelo(s), face ao seu próprio conhecimento 360º do negócio.

A constatação, logo a priori, da inadequação do(s) sistema(s) de informação de gestão às necessidades do modelo de controlo, parece constituir um segundo factor constrangedor. O seu enfeudamento à informação financeira e desta à contabilidade normalizada, de orientação externa, determina uma efectiva redução de valências na perspectiva do controlo.

Um terceiro factor pode ser constituído pela "cultura da organização", enquanto património intangível agregador de saberes, competências e valores.

A pulverização do tecido empresarial no domínio das PME revela um "deficit" estruturante de capacidade de gestão, sendo privilegiado o "faire" ao "savoir faire"; um estudo, ainda actual, realizado pelo INE concluiu que, apenas, 5,9% de administradores e directores de PME possuem formação superior, sendo mesmo que 79,9% exibem apenas formação secundária.

Finalmente, em quarto lugar, a incorrecta percepção do conceito, em abstracto, de "controlo", costuma constituir uma condicionante extremamente poderosa; a associação do controlo a fiscalização, vigilância, policiamento, privação de livre-arbítrio, confere-lhe uma conotação "politicamente incorrecta", determinante de comportamentos de rejeição, tanto mais problemáticos quanto mais reduzida é a população da empresa, onde todos conhecem todos.

Começa, contudo, a ser urgente "arrepiar caminho" e reconhecer o impacto estratégico do controlo na produtividade, competitividade, rendibilidade e criação de valor das PME: não se controla para punir, controla-se para melhorar!

Por isso, hoje mais que nunca, gerir, na perspectiva de sucesso, é controlar!...


Paulo Pardal é professor na Católica Lisbon School of Business and Economics e escreve de acordo com o antigo Acordo Ortográfico

Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica Lisbon School of Business and Economics