Há cada vez mais mulheres nos Jogos Olímpicos: estes são os dados e as curiosidades
31-07-2024 - 09:50
 • Salomé Esteves

O Comité Olímpico Internacional e a Missão Olímpica portuguesa celebram, pela primeira vez, a paridade entre homens e mulheres atletas nos Jogos Olímpicos de 2024. Entre quotas, recordes e desigualdades nos Paralímpicos e no Inverno, os últimos anos têm sido passos no caminho da equidade.

Se os Jogos Olímpicos são o lugar perfeito para quebrar um recorde, não são apenas os atletas, e as atletas, que o fazem. A edição de Paris de 2024 quebrou o recorde de Tóquio na modalidade de paridade de género: este ano, há tantas mulheres como homens a competir.

Para celebrar o Dia Internacional da Mulher, a 8 de março deste ano, o Comité Olímpico comprometeu-se a cumprir um objetivo histórico: ter 50% de mulheres atletas e 50% de homens entre os atletas a competir nos Jogos Olímpicos de Paris.

Portugal está exatamente em linha com essa paridade, ao levar, pela primeira vez e por um, uma maioria de mulheres na Missão Olímpica. Entre os 73 atletas da comitiva, 37 são mulheres e 36 são homens.

Entre as mulheres portuguesas em competição, estão Filipa Martins, que já fez história nesta edição ao qualificar-se para a final de Ginástica Artística, e Ana Cabecinha, a porta-estandarte que vai competir na marcha, três meses depois de ser mãe.

Além de representar metade das atletas a competir nos Jogos, as mulheres também atingiram paridade nos 45 mil voluntários, nos portadores da tocha olímpica e no comité de organização desta edição dos Jogos.

Desde os primeiros Olímpicos da era moderna, em 1896, em que não houve mulheres registadas, o número de atletas femininas tem aumentado a um ritmo seguro. Aliás, esta percentagem apenas decresceu em quatro edições: 1904, 1932, 1936 e 1960. Desde esse ano, a proporção de mulheres atletas tem aumentado a cada edição.

Ao longo dos últimos 124 anos, as mulheres têm conquistado não apenas medalhas olímpicas e a participação em novas modalidades, mas também ultrapassado barreiras (física e figurativamente).

Em 1928, nos Jogos de Amesterdão, as mulheres estrearam-se no atletismo, mas foram banidas de participar em corridas longas (acima dos 800 metros) por alegada fraqueza física. Depois desta restrição, as atletas não puderam competir em provas superiores a 200 metros até aos Olímpicos de 1960.

A última grande conquista deu-se em 2012, nos Jogos de Londres, quando todas as delegações foram obrigadas a registar pelo menos uma mulher. Esta medida foi instaurada depois de vários países árabes terem sucessivamente excluído mulheres das suas comitivas.

Em 2012, também se deu a reversão de um recorde histórico para as mulheres. Nessa edição, Michael Phelps arrecadou o título de maior medalhado na história dos Jogos Olímpicos, com 28. Antes dele, quem detinha o recorde era uma mulher: Larisa Latynina. A ginasta originária da então União Soviética arrecadou 18 medalhas individuais entre 1956 e 1964. Latynina é, além disso, uma dos quatro atletas a vencer nove medalhas de ouro e uma das três mulheres a vencer o mesmo evento três edições de verão diferentes.

Segundo informação do Comité Olímpico, na edição de Paris de 2024, 28 dos 32 desportos atingiram total igualdade de género. Apesar disso, o número de eventos olímpicos para mulheres continua abaixo daqueles dedicados a atletas masculinos, num rácio de 152 para 157. Estão, ainda, no calendário, 20 eventos mistos.

A organização dos Jogos comprometeu-se não só a aumentar o número da representação feminina entre os atletas em competição, mas também o número de treinadoras e árbitras, pessoal de comunicação social e lugares de liderança.

É nestes contextos em que há mais caminho a fazer, admite a própria organização, especialmente no número de treinadoras. Na última edição dos Jogos Olímpicos de Verão, em 2020, apenas 13% das pessoas com esta função eram mulheres, o que já tinha representado um ligeiro aumento face às edições de Londres (2012) e do Rio de Janeiro (2016). Em ambos os Jogos, só 11% dos treinadores eram mulheres.

Este ligeiro crescimento acontece depois de o Comité Olímpico Internacional criar, em 2022, em parceria com outras organizações, o Programa WISH: Women in Sport High Performance Pathaway (Percurso de Alta Performance para as Mulheres no Desporto) para treinadoras proeminentes.

Em cinco modalidades, existe a mesma percentagem de árbitras e juízas do que árbitros e juízes: ténis, triatlo, canoagem, vela e hóquei.

À semelhança do que já tinha acontecido em Tóquio, em 2020, nesta edição também foi pedido a cada delegação que nomeasse um homem e uma mulher para a representar na cerimónia de abertura, que decorreu na passada sexta-feira, 26 de julho.

Para sublinhar o compromisso com a igualdade de género e honrar as mulheres, o Comité Olímpico decidiu fechar os Jogos com a maratona feminina. O evento está agendado para 11 de agosto, um dia depois da masculina, e vai recriar o percurso da Marcha das Mulheres a Versailles.

Este protesto foi um dos eventos-chave da Revolução Francesa de 1789 e decorreu entre 5 e 6 de outubro desse ano, quando entre seis e sete mil mulheres parisienses marcharam entre Paris e Versailles para transportar Luís XVI para o Palácio das Tulherias. Nesse dia, o rei acabou por ratificar a Declaração Universal dos Direitos do Homem e dos Cidadãos.

Um caminho para a igualdade além dos sexos

Este ano marca, não só, a edição em que mais mulheres participam, mas, também, aquela em que um número recorde de atletas assumidamente LGBTQIA+ competem. Entre eles, está Tom Daley, o atleta de mergulho que esta segunda-feira conseguiu a sua quinta medalha olímpica.

De acordo com a base de dados da Outsports, onde a “coragem é contagiante”, são 193 os atletas homossexuais, queer, transgénero e não-binários, mais sete do que nos Olímpicos de Tóquio.

Neste último grupo, contudo, há um decréscimo. Em Paris, competem duas atletas transgénero, metade do que em Tóquio.

Este ano, a americana Nikki Hiltz e a canadiana Quinn participam nas modalidades de atletismo e futebol, enquanto outras atletas se viram restringidas de se registar.

Entre as atletas que não puderam competir está Laurel Hubbard, a primeira atleta olímpica transgénero, que, a par da compatriota neozelandesa Lia Thomas, perdeu batalhas legais no seu país.

Apesar de o Comité ter admitido a participação de atletas transgénero nos Olímpicos e Paralímpicos a partir de 2004, Laurel Hubbard só se qualificou para os Jogos de Tóquio, na modalidade de halterofilismo. Ou seja, durante 16 anos, atletas transgénero e intersexo podiam participar nos Jogos, mas nenhum conseguiu qualificar-se.

A participação de pessoas transgénero e intersexo, particularmente de mulheres transgénero, tem levantado questões na comunidade desportiva e LGBTQIA+ devido aos níveis de testosterona das atletas.

Para minimizar erros de interpretação e promover a inclusão e não-discriminação, o Comité Olímpico Internacional publicou novas diretrizes para estes atletas em 2021.

Igualdade de género nos Olímpicos não chega aos Paralímpicos e ao Inverno

Nos Jogos Olímpicos de Inverno, no entanto, a representação feminina tem sido ligeiramente mais baixa ao longo das edições. Em 2022, em Beijing, 45% dos atletas e 10% dos treinadores eram mulheres. O Comité Olímpico prevê que a percentagem de mulheres atletas nos Jogos de Inverno suba para os 47%, em 2026.

Também nos Paralímpicos as mulheres estão em menor número. Nos Jogos de Verão de Tóquio, as atletas representavam 40,5% do total em competição, mas nos Paralímpicos de Inverno, em Beijing, a taxa de mulheres atletas cai para o nível mais baixo nestas competições: 24%.

Para a edição deste ano, em Paris, que começa a 28 de agosto, o Comité Paralímpico Internacional, citado pela Reuters, prevê que a proporção de homens para mulheres atletas seja de 55% para 45%.

Esta diferença mantém-se na comitiva portuguesa. Portugal levará 27 atletas a Paris, dos quais 10 são mulheres.

Também nos Paralímpicos há o objetivo de atingir a paridade além dos atletas. Em 2003, o Comité Internacional Paralímpico definiu que uma quota de 30% em cargos de liderança seria atribuída a mulheres, depois de reconhecer que a desigualdade na representatividade de género era um problema dentro da estrutura. Mas, passados 19 anos, a meta ainda não foi atingida.

Segundo um estudo da Universidade de British Columbia, no Canadá, existe um problema de subfinanciamento e de equidade os desportos paralímpicos femininos. A mesma publicação ainda sublinha que, mesmo nos desportos mistos, como o hóquei no gelo, as mulheres acabam por não ser selecionadas para as equipas.

Ao contrário do que aconteceu nos Jogos Olímpicos, sempre houve provas femininas em todas as edições dos Paralímpicos, desde que foram criados, em 1948.