Morreu Jorge Coelho. De ministro a comentador e construtor de líderes socialistas
07-04-2021 - 19:49
 • André Rodrigues

Foi pela mão de António Guterres que se assumiu como o "homem da máquina" do PS. Foi ministro entre 1995 e 2001, altura em que a queda da ponte de Entre-os-Rios ditou a sua saída do Governo. Carismático, jovial, assertivo, voltou a ser decisivo em 2005, o ano da primeira maioria absoluta do PS em eleições legislativas, com José Sócrates.

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Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho nasceu em Viseu a 17 de julho de 1954. O histórico socialista morreu esta quarta-feira, aos 66 anos.

Foi uma figura incontornável da política portuguesa e do Partido Socialista onde se filiou em 1982, ano em que foi nomeado chefe de gabinete de Francisco Murteira Nabo, secretário de Estado dos Transportes do IX Governo Constitucional.

Entre 1988 e 1989 esteve em Macau onde assumiu o cargo de chefe de gabinete do Secretário de Estado Adjunto dos Assuntos Sociais, Educação e Juventude. De 1989 a 1991 foi secretário adjunto para a Educação e Administração Pública de Macau.

Após essa experiência, regressou a Portugal para ser o “homem da máquina” socialista, tendo tido um papel preponderante, primeiro na eleição de António Guterres para secretário-geral do PS e, depois, na campanha que culminou com a eleição de Guterres como primeiro-ministro em outubro de 1995.


No primeiro executivo pós-cavaquismo, Jorge Coelho foi ministro-adjunto de António Guterres, tendo, dois anos mais tarde, em novembro de 19997, acumulado esse cargo com o de ministro da Administração Interna.

Foi ele o mentor do conceito de Loja do Cidadão enquanto espaço de atendimento de várias entidades públicas, agregando e ligando diferentes serviços.

Após as eleições legislativas de 1999, que reconduziram António Guterres como chefe do Governo, Jorge Coelho assumiu as pastas da Presidência e das Obras Públicas.

A remodelação governamental de setembro de 2000 reforçou a influência de Jorge Coelho na hierarquia do Governo, ao deixar de ser ministro da Presidência para ser, a partir dali ministro de Estado e das Obras Públicas.

A reestruturação governativa coincidiu com o início de um outono/inverno extremamente chuvoso e marcou o princípio do fim da carreira de Jorge Coelho como ministro.

A 4 de março de 2001, Jorge Coelho assumiu plenamente a responsabilidade política pela queda da ponte de Entre-os-Rios e demitiu-se.

“Não ficaria bem com a minha consciência se não o fizesse”, disse nessa mesma noite, ao mesmo tempo que anunciou a abertura de um inquérito ao sucedido, acrescentando que a culpa não podia “morrer solteira”.

"Quem se mete connosco, leva!"

A 31 de março de 2001, Jorge Coelho tinha deixado o Governo há menos de um mês e o bastonário da Ordem dos Advogados da altura, António Pires de Lima, denunciou interferências do Governo junto dos deputados dos diferentes partidos para a aprovação do Orçamento do Estado.

A defesa do Executivo surgiu no habitual registo inflamado. Num discurso de campanha, perante militantes socialistas no Parque de Exposições de Braga, Jorge Coelho considerou "inadmissíveis e absurdas" as afirmações de Pires de Lima e rematou com uma frase que ficou para a história: "Quem se meter connosco, leva!"

Instado a clarificar o sentido das suas palavras, Coelho viria a dizer depois que o “leva” era, afinal, uma frase incompleta.

"Leva uma resposta política, claro", justificou.


Construtor de líderes

A saída de cena do Governo não significou a saída de cena do PS e 2005 confirmou-o como construtor de líderes do partido.

Jovial, assertivo, determinado, com discurso carismático e mobilizador, Jorge Coelho voltou a ser uma peça decisiva na campanha socialista de 2005, em que, pela primeira vez, com José Sócrates, o partido alcançou uma maioria absoluta em eleições legislativas.

Em novembro de 2006 renunciou ao mandato de deputado e abandonou todos os cargos partidários para se dedicar à atividade empresarial, à docência, à consultoria e ao comentário político, tendo sido presença assídua no programa ‘Quadratura do Círculo’ da SIC Notícias, ao lado de António Lobo Xavier e José Pacheco Pereira com moderação de Carlos Andrade.

A vida de Jorge Coelho fica, também, marcada pela superação de um cancro que lhe foi diagnosticado em 2007.

Um episódio de vida que ficou para memória futura em livro.

“Jorge Coelho, o Todo Poderoso”, da autoria do jornalista Fernando Esteves, foi publicado em maio de 2014 pela Esfera dos Livros e conta a história da doença que “o devastou física e psicologicamente. Estava com uma depressão profunda. A violência das sessões de quimioterapia e radioterapia a que se submetia era avassaladora. E só com a ajuda da sua mulher Cecília e da filha Maria João conseguiu atravessar o calvário do cancro. Quando soube que estava curado, chorou”.

A última intervenção pública de Jorge Coelho ocorreu há dias, para lamentar a morte do presidente da Câmara de Viseu, António Almeida Henriques.

Jorge Coelho morreu esta quarta-feira aos 66 anos, vítima de um ataque cardíaco fulminante.