Merkel – e a UE – em dificuldades
20-06-2018 - 06:30

Até que ponto pode a UE manter como Estados-membros países onde os valores europeus são desprezados?

Era habitual, na União Europeia, esperar por uma decisão de Merkel para resolver um problema europeu. Agora, ocorre o inverso: Merkel espera um acordo europeu para ultrapassar a crise com os democratas-cristãos da Baviera (CSU), um partido irmão da CDU.

A coligação CDU-CSU existe desde 1949, mas está hoje em risco de colapsar, o que levaria à queda do governo alemão. O ministro do Interior de Merkel é da CSU e pretende levar por diante um controle fronteiriço muito mais hostil aos refugiados e imigrantes do que o admitido por Merkel.

Em outubro haverá eleições no estado da Baviera e a CSU receia que o partido Alternativa para a Alemanha, eurocético e contrário à entrada de imigrantes, tire a maioria absoluta que a CSU tem mantido no parlamento estadual. Daí a iniciativa do ministro da CSU.

Uma cisão entre a CDU e a CSU seria prejudicial para ambos os partidos, que seriam penalizados em novas eleições. E também para o SPD. Ganhariam os extremistas da Alternativa. E a cisão seria desastrosa para a UE, pois Merkel desapareceria de cena – e ela, embora enfraquecida, ainda é essencial para travar uma desintegração da Europa comunitária.

A hostilidade aos imigrantes é a grande bandeira política da extrema-direita europeia – o que não é novidade, basta lembrar a Frente Nacional francesa. Mas tem alastrado a outros Estados-membros, incluindo países onde não há imigrantes, caso da Polónia. Como Rui Tavares sublinhou na sua coluna no “Público”, este ano houve uma enorme redução no número de entradas de imigrantes e refugiados no território europeu, bem como no número de requerentes de asilo.

Na Alemanha mais de 720 mil pessoas pediram asilo em 2016; no ano passado foram apenas 200 mil e no corrente ano a tendência de baixa continua.

Só que espicaçar o medo das pessoas face ao imigrante rende votos. Trump criticou a abertura da Alemanha aos estrangeiros, afirmando que estes haviam feito subir a criminalidade no país – uma total falsidade, pois a criminalidade tem vindo ali a baixar significativamente.

Merkel ainda goza de alta popularidade na Alemanha. Oxalá consiga encontrar uma saída honrosa para este confronto com a CSU. Uma “solução europeia” não será nada fácil de obter. E para isso Merkel terá que negociar com líderes que cada vez têm menos características democráticas – Salvini, da Itália, e os governos da Hungria, Polónia, República Checa, Eslováquia, Áustria, etc.

Ora aqui levanta-se um problema mais profundo: até que ponto pode a UE manter como Estados membros países onde os valores europeus são desprezados?